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Para onde vai e o que quer a caravana de imigrantes que colocou Trump em alerta

Darío Brooks

BBC Mundo

02/04/2018 12h55

Minutos depois de desejar Feliz Páscoa na manhã de domingo no Twitter, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, usou a rede social para fazer um alerta sobre a caravana de migrantes que saiu de Honduras, cruzou a Guatemala e está no México: "Precisamos do muro!", escreveu, em caixa alta.

O presidente afirmou ainda que a movimentação de migrantes rumo à fronteira sul dos EUA conta com a condescendência de autoridades mexicanas. No Twitter, Trump ameaçou também suspender o Nafta, o bloco econômico formado por EUA, Canadá e México, que Trump chamou de cash cow (no sentido de "galinha dos ovos de ouro") do México.

"O México está fazendo muito pouco, ou nada, para parar o fluxo de pessoas que atravessam a fronteira sul e seguem em direção aos EUA. Eles riem das nossas estúpidas leis de imigração. Eles têm que interromper o fluxo de pessoas e drogas...", escreveu.

A caravana a que Trump se refere foi assunto de uma reportagem no domingo transmitida pelo canal de TV americano FOX News, canal que o presidente americano diz ser sua favorita fonte de notícias. Acredita-se que foi essa reportagem que levou Trump a escrever o tuíte.

Ela começou em Honduras, em meados de março, e que agora segue pelo sudoeste do México, supostamente a caminho dos EUA, contando com cerca de 2 mil pessoas. Chamada de "Caravana de refugiados 2018", ela reúne migrantes de diferentes países, em especial da América Central, que marcham pela estrada levando cartazes em protesto contra discriminação e violência a migrantes.

Há informações contraditórias sobre o objetivo final das pessoas. Segundo o site BuzzFeed, um dos primeiros a informar sobre a caravana, os organizadores da marcha estimam que dois terços das pessoas que estão com o grupo planejam chegar à fronteira dos EUA, enquanto outros esperam se encontrar com parentes no México. A organização do evento, contudo, nega que o objetivo da marcha seja avançar em massa rumo aos EUA.

Já Irineo Mujica, diretor da organização Povos Sem Fronteiras, que organiza a caravana, assegurou à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC, que a maioria dos migrantes da América Central está marchando com destino à Cidade do México. Cerca de 80% deles são de Honduras, e o restante que se juntou ao grupo pelo caminho é de El Salvador, Nicarágua e Guatemala.

"Alguns querem ficar no México, outros querem ir aos Estados Unidos. Mas nem todos querem ir aos Estados Unidos, querem apenas sair do inferno em que vivem", disse Mujica à BBC Mundo.

Ele estima em menos de 100 os participantes da marcha que tentam chegar à fronteira com os EUA.

O foco dos organizadores está no México, diz Mujica.

"A caravana é uma maneira de sensibilizar o povo mexicano do calvário que sofrem os imigrantes no caminho, às vezes, até os EUA, às vezes até o próprio México", explica Mujica.

Nos últimos anos, tem sido cada vez mais frequente os casos de migrantes que, ao passar pelo México, são vítimas de roubo, sequestros e até assassinatos, além de abuso de autoridades.

'México não faz nada'

A notícia sobre a caravana levou Trump a afirmar que "esses grandes fluxos de pessoas estão tentando se aproveitar do Daca". Daca é a sigla em inglês do programa Deferred Action for Childhood Arrivals, que concede autorização temporária para morar, trabalhar e dirigir nos EUA aos que entraram no país de forma ilegal quando eram crianças.

No entanto, o Daca não se aplica a jovens imigrantes que cruzaram a fronteira recentemente. A legislação vale apenas aos que foram levados aos EUA antes de 2012.

Ainda assim, Trump escreveu que os republicanos devem usar a "Opção Nuclear" para passar leis mais duras. A opção nuclear é uma manobra legislativa do Congresso, que conta com maioria de representantes do partido Republicano, para aprovar leis com maioria simples dos votos.

Reação a Trump

O secretário das Relações Exteriores mexicano, Luis Videgaray, respondeu aos tuítes do presidente americano também pela rede social. Ele rejeitou as acusações de Trump contra seu país.

"Todo os dias o México e os EUA trabalham juntos com temas migratórios na região. Os fatos claramente refletem isso. Essa cooperação não deve ser questionada a partir de notícias imprecisas. Defender a dignidade e os direitos humanos não se contrapõe com o estado de direito", escreveu Videgaray

O organizador da marcha, Irineo Mujica, insiste em dizer que as intenções da Caravana de Refugiados 2018 não é levar imigrantes aos EUA.

A organização Povos Sem Fronteiras organizou duas marchas similares no ano passado. Mas a desse ano conta com um aumento de 500% dos participantes, segundo o diretor da ONG.

"Este ano, as eleições em Honduras deixaram muita violência. Isso fez com que muitas pessoas migrassem, além de que a economia e a repressão têm feito com que as pessoas saiam correndo do país", disse Mujica.

Ele afirma que o endurecimento das ações contra imigrantes no governo Trump tem feito com que muita gente da América Central escolha o México como opção para viver.

"O México não é um país apenas de passagem, é de destino. Porque ao chegar à fronteira, não há maneira de cruzar. Muitos ficam em Tijuana, Monterrey, Guadalajara e na Cidade do México", disse Mujica.

O problema, completa ele, é que as autoridades mexicanas têm concedido refúgio a um número muito pequeno de pessoas. Dados da Comissão Mexicana de Ajuda a Refugiados, dizem que, em 2017 os hondurenhos, primeiros da lista, apresentaram mais de 4,2 mil pedidos, mas apenas 378 conseguiram refúgio.

Outros 392 hondurenhos conseguiram documentos de "proteção complementar", enquanto os casos de 1960 pessoas ainda estão sendo analisados. E 1.541 pessoas tiveram o benefício negado ou os processos não foram concluídos.

El Salvador, Guatemala e Nicarágua são os outros países com mais pedidos de refúgio. Mas as respostas positivas são inferiores a 10%.

É por isso que a Caravana de Refugiados 2018 segue à Cidade do México para se reunir com autoridades da Comissão Mexicana de Ajuda a Refugiados, com senadores e para realizar protestos na porta da Embaixada dos EUA, da representação da ONU (Organização das Nações Unidas) e também da OEA (Organização dos Estados Americanos).

"Os migrantes querem viver sem medo de sair do país (México), de ter os filhos, levá-los à escola, poder trabalhar. Querem poder colocar comida sobre a mesa...", diz Mujica.

O ativista reconhece que a retórica do presidente Donald Trump tem peso nas decisões políticas mexicanas, mas argumenta que a migração é um fenômeno que não se pode deter. "Para qualquer coisa, ele só diz o 'muro, o muro, o muro'. Ninguém na história parou a migração e não vai parar. Não há Donald Trump que dure 100 anos, nem muro que não caia."