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Quais as chances de Lula ser solto pelo STF na próxima semana?

7.abr.2018 - Ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no dia em que se entregou à PF - Leonardo Benassatto/Reuters
7.abr.2018 - Ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no dia em que se entregou à PF Imagem: Leonardo Benassatto/Reuters

Mariana Schreiber - Da BBC News Brasil em Brasília

20/06/2018 16h37

Oitenta dias após entrar na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba para começar a cumprir a pena de 12 anos e um mês de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex do Guarujá, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve um novo pedido de liberdade negado e retirado da pauta do Supremo Tribunal Federal (STF).

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), julgou prejudicado e retirou da pauta da próxima terça-feira, dia 26 de junho, o pedido de liberdade feito pela defesa de Lula. Na última sexta-feira, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) havia negado a admissão do recurso extraordinário ao Supremo.

Em abril, o plenário da Corte já havia negado, em votação de 6 a 5, um pedido de habeas corpus do ex-presidente. Alguns juristas consideravam, porém, que havia chances de sucesso neste caso, já que o novo recurso tinha natureza diferente do pedido de habeas corpus.

Com a retirada do pedido da pauta do STF por Fachin, no entanto, Lula continuará preso. Em tese, não há limites para a defesa apresentar novos pedidos de habeas corpus para tentar soltá-lo. No entanto, esses recursos precisariam trazer argumentos novos. "Vai ficando cada vez mais difícil reverter a prisão antes da eleição", acredita Gustavo Badaró, da USP.

Outro caminho para Lula ser solto seria o plenário do Supremo mudar seu entendimento sobre a permissão do cumprimento antecipado da pena. Isso dependeria, no entanto, do próximo presidente do STF, Dias Toffoli, pautar as duas ações que discutem a prisão após condenação em segunda instância. Ele assume o comando da Corte em setembro, no lugar de Cármen Lúcia, que tem recusado levar a questão ao plenário.

Entenda o caso:

No que se baseava o pedido da defesa do ex-presidente?

Lula foi condenado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) por ter recebido uma apartamento da empreiteira OAS em troca de favorecimentos à empresa em contratos da Petrobras, o que o petista nega.

Sua defesa tem direito a tentar anular a condenação tanto no STF (recurso extraordinário) quanto no Superior Tribunal de Justiça (recurso especial).

Os advogados pediram ao STF um efeito suspensivo a esses recursos, ou seja, que permita a Lula aguardar em liberdade o julgamento do caso em si nas cortes superiores, que tende a demorar meses.

O histórico recente de votações no STF mostra que a Segunda Turma - formada por Ricardo Lewandowski, Edson Fachin, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Celso de Mello - tem hoje viés mais garantista que a primeira, ou seja, tende a dar mais peso em suas decisões aos direitos do réu no processo.

Dos cinco, apenas Fachin é hoje favorável ao cumprimento da pena após condenação em segunda instância, por exemplo. Ele também foi o único integrante da Segunda Turma que, na semana passada, votou pela legalidade da condução coercitiva - o mecanismo que obriga uma pessoa a comparecer para depor acabou proibido por apertada maioria no plenário.

No entanto, esse viés não garantiria uma vitória para Lula no pedido de suspensão da prisão. A Segunda Turma tem precedentes tanto de decisões favoráveis quanto contrárias ao ex-presidente.

No dia dez de abril, por exemplo, pouco depois da rejeição do habeas corpus no plenário, os cinco ministros da Segunda Turma rejeitaram por unanimidade, em julgamento virtual, outro recurso da defesa de Lula solicitando que sua prisão após condenação em segunda instância não fosse automática. Na ocasião, Mendes e Celso de Mello destacaram que seguiriam a decisão que prevaleceu no plenário, em respeito ao colegiado.

Já no dia 24 do mesmo mês, o petista obteve uma vitória quando, por 3 a 2, a turma decidiu transferir para a Justiça Federal de São Paulo trechos da delação de ex-executivos da construtora Odebrecht que o envolviam. Na ocasião, Toffoli, Lewandowski e Mendes entenderam que as informações dadas pelos delatores sobre o sítio de Atibaia e sobre o Instituto Lula - objetos de outro processo contra o ex-presidente na vara de Sérgio Moro - não têm relação com a Petrobras e, portanto, com a Operação Lava Jato.

Na última terça, a Segunda Turma também absolveu a presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann, e o ex-ministro Paulo Bernardo, marido dela, da acusação de corrupção e lavagem de dinheiro. Os ministros entenderam que não havia provas materiais para corroborar a acusação de delatores que acusaram o casal de ter recebido R$ 1 milhão desviado da Petrobras para a campanha dela ao Senado, em 2010.

Segundo a advogada Flavia Rahal, professora de direito penal econômico da Fundação Getúlio Vargas, na avaliação do habeas corpus estava em discussão se condenados em segunda instância já poderiam ser presos antes do esgotamento dos recursos, tese que prevaleceu, ou se isso feria a presunção de inocência.

No novo recurso, havia outras questões jurídicas em discussão. Os advogados questionam, por exemplo, se Moro poderia ter julgado um caso relacionado a um apartamento no Estado de São Paulo. Os advogados de Lula argumentam que isso fere o "princípio do juiz natural", que serve para evitar direcionamento de processos para determinadas varas.

Já há, no entanto, decisões do STF permitindo que Moro julgue crimes cometidos em outras partes do país quando houver conexão clara entre esses atos e os desvios na Petrobras investigados pela Operação Lava Jato. A defesa de Lula afirma que o próprio Moro reconhece na sentença que não é possível provar materialmente que o apartamento no Guarujá teria sido adquirido e reformado com dinheiro desviado da estatal.

No recurso, os advogados sustentam também que Moro não agiu com imparcialidade no processo, entre outros pontos.

"Aquela decisão (de rejeição ao habeas corpus) não automaticamente levará o Supremo a deixar de acolher o pedido aqui. Pode haver uma ou outra sobreposição (de argumentos jurídicos), mas a essência não é a mesma. Assim como o julgamento da Gleisi Hoffmann era a análise de um caso concreto, enquanto esse recurso do Lula discute princípios constitucionais. Uma coisa não terá influência na outra", acredita Rahal.

Defesa diz que processo tem 'ilegalidades flagrantes'

Os advogados de Lula argumentam que o processo contra ele tem "ilegalidades flagrantes" que tornam "muito provável sua absolvição". Dessa forma, sustentam, seria uma injustiça privá-lo no momento de sua liberdade e direitos políticos.

"Quando a decisão condenatória claramente afronta a Constituição e a lei, você não pode submeter uma pessoa ao cumprimento da pena, se existe uma perspectiva real e concreta de que o recurso extraordinário será acolhido (mais à frente) pelo Supremo Tribunal Federal", argumenta Cristiano Zanin, um dos advogados de Lula, em entrevista à BBC News Brasil.

Um ministro do STF ouvido pela BBC News Brasil disse que o fato Lula ter perdido em plenário o habeas corpus não interfere no julgamento do novo recurso porque são questões diferentes. Outro integrante da Corte, porém, ponderou que parte dos argumentos levantados no novo pedido já teriam sido avaliados naquele julgamento.

O que aconteceria se o recurso fosse aceito?

Caso a maioria da Segunda Turma decidisse suspender a condenação de Lula, ele ficaria solto provisoriamente até o julgamento do recurso extraordinário no STF contra a condenação no TRF-4.

O petista poderia voltar depois à prisão em três hipóteses: se o STF rejeitasse o recurso extraordinário, se fosse condenado em segunda instância em outro processo (Lula é réu em mais seis ações penais) ou ainda se tivesse sua prisão preventiva decretada por algum juiz - no caso de estar agindo para atrapalhar o andamento de algum dos processos, por exemplo.

Como isso afetaria a candidatura à Presidência?

A intenção do PT, hoje, é registrar Lula como candidato a presidente no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no dia 15 de agosto, mas a expectativa é de que ele seja impedido de concorrer devido à Lei da Ficha Limpa. O pedido que a Segunda Turma do STF vai analisar para suspender a condenação de Lula se restringe ao campo penal - tirá-lo da prisão - e não entra na discussão eleitoral.

Se o STF acatasse o pedido, no entanto, isso poderia ter reflexos na avaliação do registro de Lula no TSE, acredita Roberta Maia Gresta, professora de direito eleitoral da PUC-MG.

A própria Lei da Ficha Limpa prevê, no seu Artigo 26, a possibilidade de um condenado em segunda instância obter liminar suspendendo a inelegibilidade caso haja sinais de irregularidade no processo que o condenou. Ou seja, se o STF entender que houve ilegalidade no processo do triplex do Guarujá ao analisar a suspensão da prisão, isso poderia influenciar a análise na Justiça Eleitoral.

"Vai depender da fundamentação de uma eventual decisão do Supremo. Se tiver algum argumento que demonstre a fragilidade da própria condenação, isso tudo pode ser levado a exame como um reforço em favor do deferimento (aprovação) da candidatura (no TSE)", acredita Gresta.

Esta reportagem foi atualizada no dia 23 de junho de 2018, às 08h30, para refletir as mudanças no caso.