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Vítimas da revolução romena esperam justiça há 25 anos

22/12/2014 20h29

Raúl Sánchez Costa

Bucareste, 20 dez (EFE).- Depois de 25 anos da queda do regime comunista de Nicolae Ceausescu, muitos romenos ainda esperam uma punição aos responsáveis pela morte de mais de mil civis na revolta que terminou com o fuzilamento do ditador.

Ao contrário dos demais países da esfera comunista no Leste Europeu, como Hungria, Tchecoslováquia e Polônia, a queda do repressivo regime na Romênia ocorreu de forma violenta.

Perto da meia-noite de 21 de dezembro de 1989, grupos de anônimos dispararam contra a multidão que manifestava nas principais avenidas de Bucareste para reivindicar liberdade.

"Eram franco-atiradores isolados que disparavam contra as unidades militares para que estas respondessem e assim o caos fosse criado", explica à Agência Efe Adrian Cioroianu, professor de história da Universidade de Bucareste.

"Eram homens fiéis a Ceausescu, formados para gerar o terror entre a população", completou. Segundo ele, os franco-atiradores pertenciam à Securitate, a temida polícia secreta comunista.

Dias antes, em 16 de dezembro, havia começado uma revolta em Timisoara, no oeste da Romênia, que causou dezenas de vítimas e ecoou em Bucareste.

Em resposta aos pedidos de liberdade, Ceausescu convocou na tarde do dia 21 de dezembro uma manifestação de adesão ao regime na qual discursaria da varanda do Comitê Central do Partido Comunista.

"Após dois minutos de discurso, o 'Conducator' ficou atônito com os gritos contra o regime. O povo tomou coragem e começou a tremular bandeiras sem o símbolo comunista", relata à Efe Cornell Ionita, um dos manifestantes.

As vaias, transmitidas ao vivo pela televisão, foram o início de sua queda. "Abaixo o ditador", "Morte aos criminosos", e principalmente "Liberdade" foram alguns dos gritos contra Ceausescu. O que não se esperava era que, horas depois, as ruas fossem banhadas de sangue.

Os acessos à praça central da Universidade foram bloqueados pela polícia e pelo Exército, que mobilizaram dezenas de tanques, e começaram a disparar com violência.

"Havia jovens e mulheres caídos, desacordados, roupas rasgadas, outros mortos por disparos", descreve Doru Maries, presidente da Associação 21 de Dezembro, que reúne a parentes e vítimas que buscam justiça.

No dia seguinte, os cidadãos voltaram a ocupar as ruas de Bucareste, o que provocou a fuga de Ceausescu em um helicóptero.

Não demorou para ser preso e, junto à esposa, Elena, transferido a um quartel de Targovishte, a 80 quilômetros de Bucareste, enquanto a chamada Frente de Salvação Nacional (FSN), dirigida pelo comunista Ion Iliescu, tomou o controel do país.

Um julgamento sumário condenou o casal à morte. Ceausescu foi fuzilado na noite do dia 24 de dezembro por "genocídio, danos à economia nacional, uso da força contra civis e enriquecimento injustificável".

O historiador Cioroianu explica que eles "foram condenados segundo o modelo de justiça comunista, onde primeiro é estabelecida a condenação e depois se organiza um processo falso".

Durante os três dias que o casal Ceausescu esteve detido, os franco-atiradores da Securitate continuaram a disparar de forma indiscriminada contra a população sem que as novas autoridades tomassem uma atitude sobre a situação.

Na opinião de Maries, a revolução de dezembro provocou um golpe de Estado feito por Iliescu, presidente entre 1990 e 2006, assim como entre 2000 e 2004.

Apenas 30 pessoas foram condenadas pela violência contra os civis durante a revolução, enquanto as vítimas se queixam do abandono do Estado.

"O Estado romeno foi incapaz de esclarecer juridicamente os crimes da revolução por sua cumplicidade" nele, argumenta Maries.

Um decisão do Tribunal Europeu de Direitos Humanos pediu este ano para que o governo romeno processe todos os responsáveis pelas 1.166 mortes e mais de 7.000 pessoas feridas da revolução.

Dan Voinea, promotor militar encarregado de investigar os incidentes até poucos anos atrás, disse à Efe de forma taxativa que o "Estado romeno rejeita fazer justiça com as vítimas do próprio Estado".

Ele conta que tentou processar Iliescu em 2008, mas o Tribunal Constitucional decidiu que não podia ser julgado pela justiça militar, mas civil, algo que não tem como fazer.

"Nenhum comunista quebrou a perna, todos caíram de pé após a queda do regime", conta Voinea sobre o domínio da nomenclatura comunista na transição à democracia.

A queda de Ceausescu e a violência posterior ainda esconde muitos mistérios. O que está claro é que alguns de seus colaboradores acabaram liderando a transição romena.