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Pouca ajuda e nenhum consolo no ponto zero do terremoto do Nepal

01/05/2015 13h54

Chautara (Nepal), 1 mai (EFE).- Enquanto o mundo se inteirava do horror do terremoto no Nepal pelos olhos de Katmandu, nos pés do Himalaia a dor se estendia como uma epidemia, mas soterrada por toneladas de barro e pedras que deixaram mais de dois mil mortos, um terço das vítimas de todo o país.

O terremoto que há uma semana destruiu o Nepal foi especialmente violento com o distrito de Sindhupalchok, um pequeno vale aos pés do Himalaia que somente começou a receber ajuda nesta sexta-feira, em forma de sacos de arroz, alimento que saciou um pouco o desconsolo e a sensação de abandono.

Longe da estrada principal da comarca, perto do que sobrou da cidade de Harre, descendo por um morro íngreme, ficava a casa de Kumar Tamang, um pedreiro de 26 anos que estava na capital, Katmandu, quando aconteceu o terremoto.

Seu pai pediu domingo que voltasse porque sua filha de nove anos e seu filho de cinco tinham sido soterrados sob a casa. Conseguiu retornar somente dois dias depois, a tempo de ver o avô recuperar os corpos das crianças e se despedir delas cumprindo o rito hindu, com uma pira funerária que apagou ontem.

"A mãe deles está no Kuwait, ela não sabe. Contarei em breve", disse Kumar à Agência Efe.

Como ele, centenas de nepaleses estão recuperando os corpos de seus familiares dos escombros, às vezes com ajuda de alguma equipe de resgate estrangeira, mas na maior parte dos casos por conta própria.

O vale de Sindhupalchok tem um rico microclima agrícola em que campos de trigo brotavam radiantes em frente às casas hoje moídas como bolachas pisoteadas, ou transformadas em casas de bonecas em tamanho real que mostram os quartos, a cozinha e a sala através de uma fachada que já não existe.

Em Chautara, a capital do distrito, o voo dos helicópteros zune no campo aberto em frente ao hospital geral, que se tornou um precário campo de refugiados onde as equipes de cooperação internacional começaram a chegar hoje.

"Somos 26 médicos e técnicos e vamos abrir um hospital com serviço completo de cirurgia", disse à Efe Olaf Rosset, coordenador de uma equipe da Cruz Vermelha norueguesa enquanto olha para as montanhas em volta, sem a menor dúvida de que esperam centenas de mortos e feridos.

O major Deepak, do exército do Nepal, responsável pelo distrito, disse à Efe que ali morreram 2.194 pessoas e pelo menos 700 estão gravemente feridas.

O exército estima que pode encontrar "mais de dois mil mortos" nas casas dispersas e nos minúsculos povoados que não são acessíveis pelas estradas, somente após horas de caminhada a pé, a cavalo ou de yak.

A poucos metros dali, Madhav Karki, de 24 anos, observava a casa de um amigo a quem veio ajudar, onde os andares lembram uma sanfona.

"Demorei duas horas para chegar de moto, por que esta gente demorou uma semana?", questionou.

A casa de seu amigo é uma mais das impossíveis arquiteturas da destruição de Chautara.

O banheiro do terceiro andar parece com uma guarita, as fundações de madeira estão inclinadas como a torre de Pisa, e sanduíches de placas de concreto empilhados depois de os andares cederem um sobre o outro completam o catálogo macabro.

Na ladeira de uma montanha de escombros, junto aos ferros de uma cadeira tragada pelo adobe, Bhakta Bahadur Sapkota, um granjeiro de 48 anos, está sentado.

Ontem ele passou por ali e disse ter sentido o cheiro fétido de um corpo em decomposição, e está à espera de a ajuda chegar. Ele já avisou o exército, e agora os aguarda para descobrir quem está ali embaixo.