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A figura de Chávez tem peso nas eleições do Peru

Juan Barreto/AFP
Imagem: Juan Barreto/AFP

Jorge Ramos

01/06/2011 00h01

O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, disse muito pouco sobre o candidato presidencial da esquerda no Peru, Ollanta Humala.

Disse somente que o conhece, que foi um "bom soldado" e que em "um gesto de rebeldia" (Humala encabeçou um levante armado contra o governo de Alberto Fujimori em 2000) foi para as montanhas e depois foi detido.

A verdadeira história do levante militar de Humala contra Fujimori é muito mais complexa e sangrenta, mas Chávez a simplificou e reduziu sua importância. É a interpretação de um golpista falando de outro golpe. (Aqui está o vídeo de Chávez: bit.ly/ggFFX7).

A eleição deste 5 de junho no Peru demonstra como é frágil a democracia em nosso continente. Enfrentam-se a filha de um ditador, Keiko Fujimori, com um ex-militar que preferiu usar as balas e não as leis para resolver suas diferenças com o governo da vez.

Dito isto, tudo parece indicar que Chávez será mais uma vez um elemento determinante nas eleições peruanas. De alguma maneira, Chávez vota no Peru. Não é algo novo.

Ganhe quem ganhar, a democracia perde força no Peru. Nenhum dos dois candidatos merece o qualificativo de "democrata" ou "defensor da democracia". Seus passados dizem outra coisa.

De um lado está Humala, que também foi apoiado por Chávez na campanha presidencial de 2006 e que promoveu a tomada pelo Estado do controle dos recursos nacionais peruanos - embora ultimamente tenha tentado recuar quanto a isso. Humala, de quem muitos acreditam que sofreu influência política de Chávez durante vários anos, agora expressou arrependimento por essas ligações com o líder venezuelano. Tentou convencer as pessoas de que, se vencer, suas políticas refletiriam mais o enfoque brasileiro de livre mercado e democrático, e não o estilo de controle férreo do governo de Chávez na Venezuela.

No lado oposto está Keiko Fujimori, candidata de direita, cujo pai foi declarado culpado de abusos contra os direitos humanos em 2009 pelo sistema judiciário peruano e enviado à prisão por 25 anos. Embora Alberto Fujimori tenha sido declarado culpado de corrupção e de organizar um esquadrão militar da morte que assassinou 25 pessoas, Keiko insiste que seu pai é inocente e declarou que deveria ser libertado.

Humala sabe que o abraço de Chávez é o da morte (eleitoral) e tentou se distanciar. Em uma entrevista antes do primeiro turno, perguntei a Humala qual era sua relação com o presidente venezuelano. "É a mesma relação que tenho com todos os presidentes latino-americanos", respondeu. "Não estou colocando Chávez na campanha; são mais nossos adversários políticos que querem colocar Chávez na campanha."

Isso é verdade. O chavismo está absolutamente desgastado. Nenhum país do continente quer se parecer com a Venezuela de Chávez. Basta mencionar a inflação, a insegurança, a falta de liberdade de expressão e a ridícula e cega idolatria ao chefe máximo na Venezuela para dar marcha a ré. E isso Humala sabe.

Mas talvez já seja muito tarde para conseguir se desligar do apertão chavista. Chávez, não resta a menor dúvida, provoca medo em muitos países. Quem quer um Chávez mexicano, colombiano, chileno, salvadorenho? Certamente ninguém deseja que outro Chávez governe o Peru.

Mais que admiração, Chávez se transformou no exemplo perfeito do que não deve ser um candidato presidencial na América Latina.

Apesar de ter um significativo (mas cada vez menor) apoio na Venezuela, Chávez não é um democrata e mentiu de maneira flagrante em várias ocasiões para chegar ao poder e manter-se nele.

Depois de ser eleito em 6 de dezembro de 1998, Chávez mentiu para mim três vezes em uma entrevista:

1. Disse-me que estaria disposto a entregar o poder dentro de cinco anos ou "até antes". Mentiu.

2. Disse-me que não nacionalizaria "absolutamente nada", nenhuma empresa. Mentiu.

3. Disse-me também que não tomaria o controle de nenhum meio de comunicação privado porque "basta o meio do Estado". Mentiu outra vez.

Por que Chávez me mentiu um dia antes das eleições de 1998? Muito simples: para ganhar. Mas depois deu marcha a ré e hoje é um líder autoritário com a intenção de se fixar eternamente no poder.

O vídeo dessa entrevista que fiz com Chávez (bit.ly/106E6f) circulou amplamente no Peru, em particular entre os opositores de Humala. A intenção é muito clara: querem fazer o eleitorado crer que as promessas de Humala de que respeitará a democracia, a liberdade de imprensa e o sistema de livre mercado - assim como as que fez Chávez em 1998 - não têm qualquer credibilidade.

Impossível saber se Humala as cumpriria. Mas o que sabemos perfeitamente é que se neste domingo 5 de junho Humala não conseguir se safar do abraço de Chávez perderá outra vez a eleição. Assim, simplesmente.