Topo

Estupro de turistas em Acapulco mostra que México continua sofrendo com a impunidade

Policiais observam local onde um motorista de ônibus foi assassinado e o veículo queimado por bandidos em Acapulco, cidade turística do México - Reuters
Policiais observam local onde um motorista de ônibus foi assassinado e o veículo queimado por bandidos em Acapulco, cidade turística do México Imagem: Reuters

14/02/2013 00h01

Foi um ataque brutal. Não havia soado as 3 da manhã quando um grupo de cinco homens armados e encapuzados entrou em uma casa de aluguel para turistas em Acapulco. Roubaram e amarraram com cabos de celulares e cordões de trajes de banho sete turistas espanhóis e depois começaram a violentar as seis mulheres, também espanholas, que os acompanhavam.

O ataque durou pouco mais de duas horas e teve como consequência que o mundo lembrasse mais uma vez que ninguém está seguro no México, nem mesmo nesse destino idílico.

Na véspera, o prefeito de Acapulco, Luis Walton, havia se levantado de bom humor. Tinham lhe informado que no domingo a ocupação hoteleira na zona turística havia superado 93%, e ele colocou no Twitter: "Acapulco PODE", gabou-se.

Passariam só algumas horas para demonstrar que na realidade Acapulco não pode. Acapulco é a segunda cidade mais violenta do mundo, segundo o Conselho Cidadão para Segurança Pública e Justiça Penal. No ano passado houve 1.170 homicídios no porto. Só San Pedro Sula é mais perigosa; Caracas é a terceira mais violenta.

O prefeito de Acapulco, é claro, não queria que as violações afetassem o turismo. Tinha claras prioridades. E assim, torpemente, declarou: "Bem, isso acontece em qualquer parte do mundo".

Sua tentativa de reduzir a importância do terrível crime, menosprezando o trauma que as vítimas sofreram, não deu resultado. Suas declarações foram criticadas como idiotas, insensatas e falsas no Twitter e no Facebook. Pouco tempo depois Walton se desculpou na mídia. Mas o dano estava feito.

Não, não é verdade que isso "acontece em qualquer parte do mundo". Há anos que não é relatada a violação de seis estrangeiras em outra parte do mundo.

"Fale bem daqui", diz um famoso slogan para promover o turismo no porto mais conhecido (e violento) do México. Mas não se pode falar bem de Acapulco quando claramente a criminalidade está fora de controle, fechando centros noturnos e restaurantes e pondo em risco a vida de moradores e turistas. Essa é a realidade.

Falaremos bem de Acapulco quando ali deixarem de matar pessoas e violentar turistas. A impunidade é o que reina no porto, e nem o prefeito nem o governador de Guerrero conseguiram mudar nada.

O interessante é que esse incidente em particular, e as centenas de mortes que continuam ocorrendo no resto do México, ainda não mancharam o governo do presidente Enrique Peña Nieto. Ainda não.

Estive revisando os números e não há nenhuma mudança - nenhuma - entre os últimos dois meses de Felipe Calderón na presidência e os primeiros dois de Peña Nieto. O México continua sendo tão violento e sofrendo tanta impunidade quanto antes. Mas o que é diferente é que os mexicanos estão dando uma lua-de-mel ao novo presidente, ao lhe conceder um tempo razoável para que ponha em prática suas novas estratégias.

Por exemplo, ninguém culpou indiretamente Peña Nieto pelas violações das seis espanholas em Acapulco. É claro que suas novas políticas de segurança ainda não foram aplicadas. Mas o presidente cometeria grave erro se acreditasse que os mexicanos vão esperar muito mais.

Nos EUA, os americanos tradicionalmente esperam mudanças concretas e o anúncio de novas medidas nos primeiros cem dias de governo. Por isso o presidente Barack Obama já está pressionando por uma mudança nas leis migratórias e de controle de armas.

Peña Nieto não tem muito tempo mais. Se seu governo, como o de Calderón, começar a acumular mil mortos por mês, os protestos e as críticas vão se multiplicar.

A lua-de-mel com Peña Nieto vai durar só um pouquinho mais. O nível de tolerância atual é baixo. Não se pode esquecer que a maioria dos mexicanos votou contra ele.

Peña Nieto parece estar consciente disso. Em uma entrevista a Patricia Janiot, da CNN México, o presidente disse que a violência "é um tema delicado e de prioridade para os mexicanos" e que isso "nos leva a mudar de estratégia para concentrar-se em atender as causas do crime e da violência". Mas Peña Nieto se equivoca se acreditar que os mexicanos vão esperar que diminuam os níveis de pobreza para que a criminalidade baixe. Isso poderia demorar décadas. Os mexicanos, calculo eu, exigirão resultados muito concretos para reduzir a violência antes do fim do ano.

As luas-de-mel dos presidentes costumam acabar quando ocorrem tragédias como a de Acapulco - ou a de Newtown. Obama teve de agir para reduzir o uso de armas depois do massacre de 20 crianças em uma escola de Connecticut. Mas no caso de Peña Nieto aparentemente ainda não há esse senso de urgência e ele continua desfrutando sua lua-de-mel.

Não, a brutalidade, impunidade e incapacidade burocrática demonstradas nos últimos dias em Acapulco não ocorrem em outras partes do mundo. A verdadeira tragédia é acreditar que é normal viver em um país onde se viola e se mata - e depois não acontece nada.