Topo

Educação não é a resposta para aumento da desigualdade

Paul Krugman

15/06/2013 00h01

O que acontece quando bons empregos desaparecem? É uma pergunta que é feita há séculos.

Em 1786, os trabalhadores de Leeds, um centro têxtil no norte da Inglaterra, fizeram um protesto contra o crescente uso de máquinas, que estavam assumindo tarefas antes realizadas por trabalhadores especializados. "Como esses homens, agora sem emprego, proverão para suas famílias?", perguntavam os manifestantes. "E o que seus filhos aprenderão?"

Não eram perguntas tolas. A mecanização, posteriormente --isto é, após duas gerações--, levou a um grande aumento dos padrões de vida britânicos. Mas está longe de claro se os trabalhadores comuns colheram algum benefício durante os estágios iniciais da Revolução Industrial; muitos trabalhadores foram claramente prejudicados. E com frequência os trabalhadores mais prejudicados eram aqueles que, com esforço, adquiriam uma habilidade valorizada --apenas para verem, de repente, essa habilidade desvalorizada.

Será que agora estamos vivendo outra era semelhante? E, se estamos, o que vamos fazer a respeito?

Até recentemente, o senso comum sobre os efeitos da tecnologia sobre os trabalhadores era, de certo modo, reconfortante. Claramente, muitos trabalhadores não estavam compartilhando plenamente --ou, em muitos casos, nem um pouco-- os benefícios do aumento da produtividade. Em vez disso, grande parte dos ganhos estava fluindo para uma minoria da força de trabalho. Mas a história dizia que isso estava ocorrendo porque a tecnologia moderna estava aumentando a demanda por trabalhadores com alta escolaridade, reduzindo ao mesmo tempo a demanda por trabalhadores com menor escolaridade. E a solução era mais educação.

Bem, sempre existiram problemas com essa história. Notadamente, apesar de poder justificar a crescente desigualdade salarial entre aqueles com diploma superior e aqueles sem, ela não explicava por que um pequeno grupo --o famoso "1%"-- estava experimentando ganhos muito maiores do que os trabalhadores com alta escolaridade de modo geral. Mesmo assim, havia algum respaldo para essa história há uma década.

Hoje, entretanto, está surgindo um quadro muito mais sombrio dos efeitos da tecnologia sobre o trabalho. Nesse quadro, os trabalhadores com alta escolaridade têm a mesma probabilidade que os trabalhadores com menor escolaridade de se verem deslocados e desvalorizados, e pressionar por mais educação pode tanto criar problemas quanto resolver.

Eu notei antes que a natureza do aumento da desigualdade nos Estados Unidos mudou por volta de 2000. Até então, tratava-se de trabalhador contra trabalhador; a distribuição de renda entre o trabalho e o capital --entre os salários e os lucros, se preferir-- permanecia estável há décadas.

Desde então, entretanto, a fatia do trabalho na torta diminuiu acentuadamente. Na verdade, não se trata de um fenômeno exclusivamente americano. Um novo relatório da Organização Internacional do Trabalho aponta que a mesma coisa está acontecendo em muitos outros países, que é o que se esperaria ver caso as tendências globais de tecnologia estivessem se voltando contra os trabalhadores.

E algumas dessas mudanças podem ser repentinas. O Instituto Global McKinsey divulgou recentemente um relatório sobre uma dezena de novas tecnologias que ele considera que provavelmente perturbarão os mercados e arranjos sociais existentes. Até mesmo um olhar rápido pela lista do relatório sugere que algumas das vítimas da perturbação serão trabalhadores atualmente considerados como altamente capacitados, que investiram muito tempo e dinheiro para obtenção dessas capacidades.

Por exemplo, o relatório sugere que veremos muita "automação do trabalho intelectual", com programas fazendo coisas que costumavam exigir pessoas com diploma universitário. A robótica avançada poderia diminuir ainda mais o emprego no setor manufatureiro, assim como também poderia substituir alguns profissionais de medicina.

Logo, os trabalhadores devem simplesmente estar preparados para adquirir novos conhecimentos? Os trabalhadores têxteis de Leeds no século 18 trataram desse assunto em 1786: "Quem sustentará nossas famílias enquanto realizamos a árdua tarefa" de aprender um novo ofício? Além disso, eles perguntaram, o que acontecerá se o novo ofício, por sua vez, for desvalorizado por um novo avanço tecnológico?

E os pares modernos desses trabalhadores têxteis poderiam também perguntar, o que acontecerá conosco se, como tantos estudantes, nos endividarmos profundamente para adquirir as habilidades que dizem que precisamos, apenas para descobrir que a economia não deseja mais essas habilidades?

Portanto, a educação não é mais a resposta para o aumento da desigualdade, se é que alguma vez foi (o que eu duvido).

Então qual é a resposta? Se o quadro que tracei está correto, a única forma para termos algo que se assemelhe a uma sociedade de classe média --uma sociedade na qual cidadãos comuns tenham uma garantia razoável de manutenção de uma vida decente enquanto trabalharem arduamente e seguirem as regras-- seria contar com uma forte rede de segurança social, uma que garanta não apenas o atendimento de saúde, mas também uma renda mínima. E com uma parcela cada vez maior da renda destinada ao capital e não ao trabalho, essa rede de segurança teria que ser paga em grande parte por meio de impostos sobre os lucros e/ou renda de investimento.

Eu já posso ouvir os conservadores gritando sobre os males da "redistribuição". Mas o que, exatamente, eles poderiam propor em seu lugar?