Sapateiro de Sabrina e Ivete posta foto com máscara de Bolsonaro e "causa"
O estrogonofe de filé estava quase pronto, quando a cozinheira Raquel Duarte se deu conta de que faltava champignon. "Não como estrogonofe sem champignon", diz o designer de sapatos Fernando Pires, 66 anos, patrão de Raquel. Ele saiu para comprar o cogumelo. A caminho do mercado, que fica a cerca de duas quadras de sua casa, fez uma selfie usando a máscara com estampa do rosto do presidente Jair Bolsonaro que havia ganhado do ator David Cardoso Jr.
"Não costumo fazer selfie, nunca tiro foto minha para postar nas redes sociais, mas queria agradecer o David", diz. Depois de postar a foto e comer o estrogonofe, Fernando se deitou para descansar. Pouco tempo depois, ao acessar o celular, levou "um susto".
"Já havia quase 200 comentários", lembra o sapateiro, que tem entre suas clientes Ludmilla, Ivete Sangalo e Sabrina Sato. "Eu pensei: 'Gente, o que é isso?'"
Fato inédito
No momento desta entrevista, ontem à noite, já havia quase 20 mil likes. "Nunca recebi esse retorno. As pessoas enlouqueceram."
O motivo da "comoção nacional", como Fernando definiu a reação, é a publicidade que um homossexual conhecido no meio da moda estaria dando a um presidente declaradamente homofóbico. "O povo fala que o Bolsonaro disse que preferia ter um filho morto do que gay. Que é misógino, discrimina negros. Onde as pessoas leram isso? Me mostra!"
Para Fernando, as declarações homofóbicas feitas por Bolsonaro "são antigas". "As pessoas evoluem. O presidente tem amigos em comum com o (promoter carioca) Amin Khader, que não pode ser mais gay. O Amin já postou várias fotos abraçando o Bolsonaro."
Muitos aplausos
Ele calcula que 75% dos comentários foram de pessoas aplaudindo sua atitude. O resto era "meia dúzia de bichas": "Elas me xingaram de tudo o que você puder imaginar. Gay maricona, velha gagá, surtada, disseram que meu sapatos sempre foram horrorosos, que nunca tiveram relevância. Só faltaram me enterrar."
A princípio, Fernando respondeu com "coraçõezinhos". "Eu estava me divertindo." Mas à certa altura, resolveu responder. "Um deles disse que eu copiava o (designer francês de sapatos Christian) Louboutin, eu respondi: "Manda a foto do original! Quero ver!!'"
Entre os comentários, havia quem sugerisse à cantora rapper Gloria Groove que cancelasse (bloqueasse) Fernando na rede social.
Fernando: "Eu respondi: 'Fala para a Sabrina me cancelar também, a Ivete, a Claudia Raia, a Deborah Secco, a Ludmilla, a Madonna, a Talia...Tenta a Hebe, de repente você consegue!"
Armas poderosas
Formado em arquitetura, Fernando Pires faz sapatos há 40 anos. Ele define seu estilo como diferenciado. "Pra mim, sapatos são armas poderosas nos pés das mulheres. Não abro mão disso. Faço modelos para elas arrasarem com os homens, e deixarem as amigas mortas de inveja."
Fernando tornou-se famoso por produzir sapatos grandes, chamativos, alegóricos. Sabrina Sato costuma desfilar no Carnaval com modelos feitos exclusivamente para ela, de 20 cm de salto. "Só ela consegue usar", afirma ele. Ao longo de quatro décadas, "os saltos foram aumentando".
Bico fino de verniz
Ele explica que, dada a exclusividade dos modelos, sua produção é limitada. "Não faço mil pares, porque o meu objetivo não é a quantidade, mas a qualidade. Não tenho loja há seis anos", diz. O valor do par de sapatos vai de R$ 850 a R$ 5 mil (com cristais).
Embora sua principal clientela seja a feminina, Fernando Pires gosta de homenagear homens que admira. "Ontem mesmo fui buscar no ateliê um par de mocassins de verniz que eu tinha desenhado especialmente para o Bolsonaro, nem sei se ele usou, e agora mandei fazer igualzinho para dar de presente para o (apresentador) Sikêra Jr., do Alerta Nacional (Rede TV!)", diz.
O modelo tem bico fino e é atravessado, na parte de cima, por uma fileira de balas de revolver estilizadas.
Sem medo de covid
A respeito da pandemia de covid-19, Fernando diz que não deixou de trabalhar nenhum dia desde o começo da quarentena. "Não vou ao ateliê desde o Carnaval e estou trabalhando com menos gente, até porque os fornecedores deram uma diminuída na produção."
Isso não significa que ele tenha medo do Sars-CoV-2: "Medo é a pior coisa para enfrentar esse vírus. Quem tem de ter medo é ele, de mim!"
Foi pouco
Ele garante que, depois da "comoção" causada no instagram, passou a ter mais seguidores. Diz ter ido de 42.200 para 42.800. Aos que deixaram de segui-lo, diz: "Vão com Deus!"
Animado, finaliza: "Se eu soubesse que ia causar esse furor, teria feito muito mais. E pode escrever aí: amanhã (hoje) vou caminhar na (avenida) Paulista com a minha mascarinha!"
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