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Reinaldo Azevedo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Lula obtém expressiva vitória no Senado e já ajuda a fechar as contas de 22

Senadores comemoram a aprovação da PEC de Transição; bolsonaristas tentaram tumultuar, mas suas teses não se sustentaram - Walodemir BarretoAgência Senado
Senadores comemoram a aprovação da PEC de Transição; bolsonaristas tentaram tumultuar, mas suas teses não se sustentaram Imagem: Walodemir BarretoAgência Senado

Colunista do UOL

08/12/2022 03h06

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O presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, obteve ontem uma primeira e expressiva vitória no Congresso com a aprovação, pelo Senado, da PEC de transição. Na primeira votação, o placar foi de 64 a 16; no segundo, 64 a 13. Houve 15 votos a mais do que os 49 necessários. Aprovou-se o texto que já havia obtido a anuência da CCJ. Agora a PEC segue para a Câmara, onde precisa da anuência de pelo menos 308 parlamentares.

Em essência, a proposta aprovada prevê:
- elevação do teto de gastos em R$ 145 bilhões por dois anos para bancar o Bolsa Família:
- libera R$ 23,9 bilhões para investimentos decorrentes de verbas extraordinárias:
- dada a disponibilidade de recursos, o Congresso participa da sua destinação;
- Executivo deve entrar uma nova proposta de âncora fiscal até 31 de agosto do ano que vem;
- recursos parados nas contas do PIS/Pasep há no mínimo 20 anos podem ser apropriados pelo Tesouro para aplicação em investimentos. Estima-se que o montante possa chegar a R$ 24 bilhões;
- a possibilidade de usar receitas extraordinárias até o limite de R$ 23,9 bilhões valia para o ano de 2023. O limite foi retirado porque o governo Bolsonaro chegou à paralisia em várias áreas, e será preciso socorrê-lo ainda neste ano. Olhem a ironia! Lula acabou quebrando um galho para Bolsonaro. Certamente não é por amor, mas por senso de responsabilidade.

"Então quer dizer que Lula vai à farra com essa dinheirama toda? É evidente que não. É preciso fazer umas continhas. O Bolsa Família a R$ 400 tinha uma dotação orçamentária prevista no ano que vem de 105 bilhões. Os R$ 200 a mais, compromisso tanto de Lula como de Bolsonaro, demandam um aporte de pelo menos R$ 52 bilhões. E outros R$ 18 bilhões vão para os R$ 150 a cada criança abaixo de seis anos de famílias atendidas pelo programa — esta, sim, promessa de Lula.

Perceberam? Só os R$ 200 a mais do Bolsa Família e os recursos para as crianças vão consumir R$ 70 bilhões daqueles R$ 145 bilhões. Entre R$ 6,8 bilhões e R$ 7 bilhões serão destinados ao reajuste do mínimo. E pelo menos R$ 2,8 bilhões vão para a recomposição salarial do funcionalismo do Executivo. Arredondando, sobram R$ 65 bilhões para refazer o Orçamento do ano que vem, que é uma pavorosa peça de ficção.

Já lembrei aqui: o Minha Casa Minha Vida, antes apelidado de Casa Verde e Amarela, ficou com a fabulosa quantia de pouco mais de R$ 30 milhões no Orçamento. É um acinte. Estima-se que, só para concluir obras inacabadas, ainda que nenhuma nova unidade fosse contratada, seriam necessários quase R$ 3 bilhões. Convém notar que a previsão orçamentária para a Saúde já cairia dos R$ 162,9 bilhões neste ano para R$ 146,4 bilhões no ano que vem. É a menor desde 2014, com uma queda de 10,1%. No caso da Educação, cai de R$ 151,9 bilhões para R$ 147,7 bilhões. Só nessa área, estima-se um buraco de R$ 14 bilhões.

O Orçamento de 2023 tem de ser refeito. Como já escrevi aqui, o item "Despesas Discricionárias" tem uma queda geral em relação ao deste ano de 15%. Alguns itens: - 47% para Assistência Social; - 34,7% para Segurança Pública; - 24,3% para Ciência e Tecnologia; - 12% para Saúde; - 6% para Educação. A perda em relação ao Orçamento de 2022, já descontada a inflação, nessa rubrica, é de R$ 32 bilhões. E é nela que se concentram os investimentos do governo, que, na prática, estão previstos em R$ 22 bilhões — pouco mais de 0,2% do PIB. É o mais baixo da história.

DAR UM JEITO AINDA EM 2022
O governo está paralisado. A lista é grande:
1) universidades federais e institutos federais perderam R$ 366 milhões e estão sem dinheiro para pagar serviços básicos;
2) residentes de medicina não estão recebendo a bolsa;
3) não há dinheiro para pagar mais de duzentas mil bolsas de metrado, doutorado e pós-doutorado da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoa de Nível Superior);
4) a Polícia Federal suspendeu a emissão de passaportes por falta de recursos;
5) há dificuldade para a aquisição de medicamentos;
6) até a manutenção de carros da Polícia Rodoviária Federal foi interrompida por falta de verba.

Vejam que coisa! A PEC aprovada no Senado, como dito acima, abre a possibilidade de se liberarem recursos para fazer frente ao descalabro ainda neste ano. Lula, por ora, é presidente eleito; não tem poder formal nenhum. Não obstante, está quebrando um galho para Bolsonaro. Aprovado o texto também na Câmara, pode haver recursos para enfrentar a irresponsabilidade do atual presidente ainda neste ano.

Os eventuais R$ 23,9 bilhões oriundos das receitas extraordinárias e os R$ 24 bilhões das contas esquecidas no PIS/Pasep não podem ser somados àqueles R$ 145 bilhões. Ambos são itens que remetem a receitas, não a gastos: o governo não precisa se endividar no mercado para ter essa grana. Fala-se em "esforço fiscal" de R$ 200 bilhões ou mais. É uma conta marota porque são dinheiros absolutamente distintos.

Que o texto tenha tramitação rápida também na Câmara. O Brasil precisa urgentemente voltar a ser governável e governado. Para tanto, precisa ter um Orçamento.