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Interferência do homem e eventos naturais mudaram mapa litorâneo, dizem especialistas

Aliny Gama e Carlos Madeiro

Especial para o UOL Notícias <br> Em Maceió

12/09/2011 07h00

O litoral brasileiro vem passando por mudanças extremas, causando problemas às cidades litorâneas. Para especialistas consultados pelo UOL Notícias, a dinâmica da costa brasileira foi alterada por conta de interferências feitas pelo homem no litoral e na zona da mata.

Para a analista ambiental do Ministério do Meio Ambiente, Márcia Oliveira, as intervenções do homem na natureza e as tempestades oceânicas resultam no desequilíbrio do ambiente litorâneo. “Quando ocorre algum fenômeno que causa o mar revolto, seja pela ressaca ou até mesmo o aumento do nível das águas do oceano, a natureza não tem como se recompor devido à ação do homem com a ocupação de faixas praianas que seriam dinâmicas”, afirma.

O mestre em oceanografia pela UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), Gabriel Le Campion, observa que grande parte das áreas com registro de avanço do mar são vizinhas a grandes edificações. “Com uma área estreita, o mar vai cada vez mais longe em busca de sedimentos para criar um banco de areia natural dentro do oceano, que impede a chegada de grandes ondas das tempestades marinhas à superfície. Se o mar não encontra sedimentos suficientes, ele começa o processo de avanço até conseguir criar a determinada barreira dentro do oceano. Enquanto não consegue, vai arrastando tudo”, explica.

Barragens impedem transporte de sedimentos

Os dois especialistas são enfáticos em afirmar que a construção de barragens nos rios, para armazenar os problemas das cidades ribeirinhas, trouxeram consequências graves ao litoral. As obras seriam responsáveis pela retenção de sedimentos responsáveis pela manutenção da areia da praia e impediriam o transporte deles para a praia.

Segundo Le Campion, a dinâmica do ambiente praiano alterada e a ocorrência de eventos meteorológicos fazem o litoral mudar o cenário a cada momento. “Para se ter ideia do problema que estamos passando, a Ponta do Seixas [área mais ao leste do Brasil, em João Pessoa] corre sério risco de desaparecer do mapa. Em Alagoas, podemos ver de perto um fenômeno parecido, que poderá ocorrer na Ponta Verde [principal praia de Maceió]. Em Sergipe existe um povoado que foi engolido pelas águas do mar devido à erosão marinha causada pela construção de usinas hidrelétricas”, aponta.

Cidades que decretaram emergência pelo avanço do mar desde 2006

Segundo a analista ambiental do Ministério do Meio Ambiente, cada região tem sua característica de força marinha e eólica, o que muda o cenário do impacto ambiental das erosões entre os Estados. Márcia Oliveira concorda que a faixa de areia vem diminuindo nas praias devido às mudanças implementadas pelo homem. "Com o grande número de sedimentos desviados para um único ponto devido a intervenção civil, a praia vai ficar com uma extensa faixa de terra”, explica Oliveira, que compõe a equipe de trabalho de mapeamento do litoral brasileiro.

Obras têm efeito contrário

Para os especialistas, a ideia de construir barricadas para conter o avanço do mar vem causando um efeito contrário. A distribuição de pedras nas áreas litorâneas sem estudo específico com a finalidade de conter o avanço das águas oceânicas diminui o espaço do ambiente praiano. “Com isso, o mar vai cada vez mais escavando a reserva de sedimentos e se torna uma agressão à natureza”, diz Gabriel Le Campion.

Para ele, as obras de contenção devem ocorrer de forma específica para cada local, e a solução de colocar sacos de areia ou pedras na arrebentação do mar podem causar uma agressão maior ao meio ambiente. O exemplo do “feitiço virar contra o feiticeiro” ocorreu na orla de Jaboatão dos Guararapes, região metropolitana do Recife (PE). Em agosto, o município decretou emergência por conta de uma forte ressaca do mar.

Os moradores de Piedade (PE) viram a paisagem mudar completamente nos últimos 15 anos. A faixa de areia desapareceu e deu lugar a uma muralha de pedras, que acentuou o problema da erosão marinha. "Os arrecifes foram destruídos, e o mar engoliu a praia", conta.

Segundo a analista ambiental, o local já era propício a erosão e com a escassez dos sedimentos, que teriam ficado retidos nas barragens, e construção de portos na região alteraram a área dinâmica da praia. “As construções civis também contribuíram para o problema”.

Outro fenômeno de destruição ocorreu em Alagoas. Há cinco anos, a ressaca do mar destruiu um dos cartões-postais de Alagoas: a Prainha, localizada no distrito de Barra Nova, em Marechal Deodoro. Devido ao estreitamento da área de mangue e ao assoreamento das lagoas Mundaú e Manguaba, o mar arrastou a faixa de areia que dividia a desembocadura do complexo estuarino lagunar Mundaú-Manguaba e mudou o mapa do município que fica localizado na Grande Maceió.