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Suplente acusado de matar deputada federal em chacina vai a júri popular hoje em Alagoas

Talvane Albuquerque (esq) é um dos acusados da morte da deputada federal Ceci Cunha (dir), em 1998 - Arquivo pessoal
Talvane Albuquerque (esq) é um dos acusados da morte da deputada federal Ceci Cunha (dir), em 1998 Imagem: Arquivo pessoal

Carlos Madeiro

Do UOL, em Maceió

16/01/2012 06h00

Depois de 13 anos de espera e protestos pela lentidão da Justiça, começa nesta segunda-feira (16) o julgamento dos quatro acusados de um dos crimes mais emblemáticos da histórica violência política em Alagoas.

Na noite de 16 de dezembro de 1998, horas depois de ser diplomada deputada federal, a médica Ceci Cunha e mais três pessoas foram mortas por pistoleiros que invadiram a casa de sua irmã, em bairro nobre de Maceió. Todas as vítimas foram assassinadas à queima-roupa em poucos segundos.

Na época, Ceci estava concluindo a primeira legislatura e tinha conquistado, nas urnas, o direito à reeleição. A médica foi a primeira mulher eleita para a Câmara dos Deputados da história do Estado. O crime teve grande repercussão nacional e ficou conhecido como “chacina da Gruta”, em referência ao nome do bairro onde ocorreu o crime, o Gruta de Lourdes.

O acusado de ser o mandante do crime é o então deputado federal Talvane Albuquerque, que à época estava no PTN e havia perdido a reeleição, em outubro de 1998, ficando apenas com a primeira suplência na coligação. O caso será julgado pela 1ª Vara Federal.

Para o (Ministério Público Federal), Albuquerque teria mandado matar a deputada para permanecer no cargo e manter a imunidade parlamentar, já que seria acusado de outros crimes. “Com base nas provas existentes nos autos, para o MPF não há dúvida quanto à culpa dos réus nessa chacina. Talvane queria a vaga de Ceci Cunha na Câmara”, disse o procurador da República responsável pela denúncia, Gino Sérvio.

Pelo menos três dias

Em março de 1999, Talvane chegou a assumir a vaga de Ceci na Câmara Federal, mas, por conta da repercussão da denúncia, foi cassado menos de dois meses depois por falta de decoro parlamentar.

O julgamento que começa nesta segunda-feira deve durar pelo menos três dias. O processo, com quase 7.000 páginas, é classificado pelo procurador como de “extrema complexidade.”

Além de Talvane, os três acusados de autoria material do crime também terão o futuro definido pelos sete jurados. Assim como o ex-deputado, César Alves Vasco, José Alexandre dos Santos e Mendonça Medeiros da Silva também podem pegar até 120 anos de prisão pela chacina.

A versão do crime apontada nas investigações do MPF é defendida pela família da vítima. Até hoje, as fotos da chacina, que estamparam as capas de jornais de Alagoas, não foram vistas pelos dois filhos de Ceci, que lideram hoje um movimento contra a impunidade no Estado.

O advogado Rodrigo Cunha, filho da deputada, disse acreditar que o júri vai condenar os quatro acusados. “Esse crime foi totalmente esclarecido na investigação. Existem provas claras contra os acusados no processo. Apesar da demora, esse julgamento e a condenação dos acusados vão virar uma página importante da história de violência política de Alagoas, marcando o fim da impunidade”, disse.

A demora

A lentidão entre a morte e o julgamento levou o processo a ser incluído no Programa Justiça Plena, do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que apontou o caso como um dos dez piores exemplos da Justiça brasileira no que se refere a morosidade.

Segundo o MPF, a demora no julgamento ocorreu pelo impasse sobre quem deveria julgar o processo e por conta dos inúmeros recursos impetrados pela defesa. Durante seis anos, o caso tramitou na Justiça de Alagoas. Porém, após estar próximo ao julgamento, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) determinou que, por se tratar de uma deputada, a competência seria federal, e não estadual.

A denúncia contra os réus feita pelo Ministério Público Estadual à época foi ratificada pelo MPF em agosto de 2005, acusando Talvane do crime. Desde de a denúncia, a defesa tentou, por meio de vários recursos, impedir a realização de um júri popular, o que foi negado, em último recursos, pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, em setembro de 2011.

A defesa

O advogado de defesa do acusado de autoria intelectual do crime, Welton Roberto, afirmou que o ex-deputado Talvane Albuquerque é inocente e disse apostar na absolvição do seu cliente pelos jurados.

“Existe uma total ausência de provas. O que tem nesse processo é uma extorsão contra o Talvane. Estão dando credibilidade a um depoimento do 'Chapéu de Couro' [apelido de um acusado de ser um dos maiores pistoleiros de Alagoas]. Houve uma trama para incluir o Talvane. Disseram que ele seria o beneficiário da morte. Gostaria de saber qual o benefício que ele teve? Dois meses depois de tomar posse, foi cassado, agora pode pegar 120 anos de prisão”, afirmou.

Outro ponto que será argumentado pela defesa é que Talvane precisaria do mandato para não ser preso. “Disseram que era imprescindível ele ter o mandato. Mas ele não teve mandato, e o que aconteceu com ele? Nada! Ele trabalha hoje normalmente. Disseram também que ele tinha problema financeiro, mas aí, com ou sem mandato, iria continuar tendo financeiro.”

Welton Roberto afirma que, apesar do apelo popular por justiça no caso, vai tentar convencer os jurados de que o acusado não teria motivos para matar Ceci. “Quem lê o processo vê que não há provas. Ele não precisaria e ele não mandou matar. No mesmo dia em que a deputada foi assassinada, uma hora depois já estavam dizendo que era ele o mandante. Está tudo muito estranho nessa história”, criticou.

Atualmente, Talvane Albuquerque atua como médico na cidade de Arapiraca –coincidentemente berço político de Ceci -- e em Paulo Afonso (BA).