Como ajudar na igualdade de gêneros? Não apenas falando, diz nova rabina de SP
Carreiras como a da paulistana Fernanda Tomchinsky-Galanternik ainda são raridade. Psicóloga de formação, ela, aos 30 anos de idade, se tornou a primeira rabina da CIP - Congregação Israelita Paulista, na capital, que tem hoje 1.500 famílias associadas.
Fernanda não é a única brasileira com preparação para este cargo religioso nem a primeira mulher a assumi-lo no Brasil, mas é exceção na comunidade judaica, assim como em outros grupos monoteístas no país, a presença formal de uma voz feminina entre seus orientadores.
“Estamos muito alinhados, os outros [dois] rabinos e eu, mas existe uma sensibilidade com as pessoas que estão aqui e frequentando as cerimônias. As mudanças não podem ser feitas de um dia para o outro, as pessoas têm que se sentir bem aqui e se sentir em casa. Se sentirem que esse lugar é completamente alheio a elas, vão para outro lugar, ou vão para lugar nenhum e vão perder essa tradição”, ela diz.
No Estado de São Paulo, que tem a maior comunidade judaica no Brasil, Fernanda é a única mulher em atuação num grupo de 120 rabinos, segundo informações da Fisesp – Federação Israelita do Estado de São Paulo. O país tem cerca de 150 rabinos, dos quais ela é a única em atividade, e uma população de 120 mil judeus, segundo a Conib – Confederação Israelita do Brasil.
Em entrevista ao UOL, a rabina falou sobre o atual papel da mulher em uma sociedade patriarcal, como a brasileira, e dos desafios de simbolizar, com sua presença no rabinato, uma mudança de padrões.
Casada e mãe de uma menina de dois anos, a rabina Fernanda estudou o equivalente a sete anos e meio em Israel e na Argentina para se tornar uma conselheira religiosa. Fez a prova final em novembro de 2016 e tem como objetivo principal no seu trabalho “que as pessoas estejam no mesmo lugar, sejam homens ou mulheres”.
Ele "no papel" dela
Fernanda começou a trabalhar na CIP em agosto de 2016 e foi apresentada como integrante do rabinato em março deste ano. Ela está habilitada para fazer tudo o que um rabino homem faz: conduzir serviços religiosos e celebrar casamentos, orientar futuros casais e integrantes da comunidade de maneira bem pessoal, visitar doentes e hospitalizados são exemplos disso. Mas nem tudo ela assume, pelo menos por enquanto.
Os dois movimentos, do homem e da mulher, têm de acontecer combinados para a sociedade enxergar que os dois têm a possibilidade de entregar muito ao mundo.
Para a rabina, enquanto estiver em transmissão a herança cultural que reforça o modelo “homens no trabalho e mulheres no lar”, será desafiador para todos se desfazerem das raízes desse estereótipo.
“Se a gente pensar na história da humanidade, é muito recente que a mulher tenha esse papel de protagonista social. De alguma maneira, os homens estão confortáveis na situação em que estão. Não podemos generalizar, mas a maioria dos homens não vai querer ficar em casa para cuidar dos filhos. A questão principal vem da criação e da sociedade.”
Liderança política x maioria
Primeira em 80 anos
A CIP é a maior comunidade liberal judaica na América Latina, mas, em seus 80 anos de existência, somente no último ano e meio é que a mulher passou a ter protagonismo religioso na congregação, como explica a rabina. Fernanda entende que muitas pessoas esperem dela um discurso constante sobre a mulher, mas acha que os passos devem ser dados um por vez.
“Parte do meu objetivo de fazer com que todos estejam no mesmo lugar é empoderar as mulheres a se apropriarem dessa tradição e desse espaço. Talvez eu não precise fazer isso tão ativamente, no sentido de falar sobre isso, porque o fato de eu estar aqui, a minha presença, a minha participação já faz as pessoas 'saírem da caixinha'", afirma.
Coordenadora do departamento de ensino, a rabina acredita que ações cotidianas podem dar um novo significado ao valor de cada um. “Ficar falando do papel da mulher e não fazer na prática, é mais complicado. Temos que colocá-los [meninos e meninas] nas mesmas situações e diante dos mesmos desafios”, ela diz sobre os cursos de formação que comanda.
Não preciso falar nada, às vezes, para fazer os homens pensarem: 'Será que eu preciso continuar fazendo do jeito que os meus bisavós e avós fizeram?'. E para as mulheres imaginarem: 'Acho que eu posso dar mais um passo na apropriação da minha própria tradição'.
Não dá para negar, apesar disso tudo, que uma mulher no comando ainda cause estranhamento. A rabina nem sempre se sente tão empoderada quanto seu cargo representa.
“Como é novo para muita gente, já passei por algumas situações em que me disseram: 'É melhor você não subir hoje [para a área dos rabinos no serviço religioso], porque estão aí a família X e a família Y'. E tudo bem”, ela consente. "Tem algumas mudanças que vão sendo mais graduais.”
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.