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Justiça suspende lei que rebatizava ponte em SP com nome de Romeu Tuma

O então senador Romeu Tuma em foto de 2002, quando era filiado ao hoje extinto PFL, em debate com candidatos ao Senado - Eduardo Knapp/Folhapress
O então senador Romeu Tuma em foto de 2002, quando era filiado ao hoje extinto PFL, em debate com candidatos ao Senado Imagem: Eduardo Knapp/Folhapress

Janaina Garcia

Do UOL, em São Paulo

06/09/2017 20h52

A Justiça de São Paulo concedeu liminar à Procuradora-Geral de Justiça e suspendeu os efeitos da lei que renomeava a Ponte das Bandeiras, na zona norte da capital paulista, para “Ponte das Bandeiras Senador Romeu Tuma”.

Morto em 2010, Tuma foi senador por São Paulo por mais de 30 anos, e, na ditadura militar, entre 1977 e 1982, ocupou o cargo de diretor-geral do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), um dos braços de repressão contra os opositores do regime.

A decisão que suspendeu a renomeação, publicada nesta quarta-feira (6), com data de ontem, é do desembargador Moacir Peres, relator do processo em um órgão especial do Tribunal de Justiça.

O magistrado atendeu o pedido feito em ação direta de inconstitucionalidade da PGJ, para a qual a lei 16.629, de 17 de abril passado, sobre a mudança de nome, contraria dispositivos da Constituições Federal e Estadual. Pela lei, explica a PGJ, atribuir nomes a logradouros “é de competência privativa do poder Executivo”.

A lei promulgada pela Câmara Municipal e assinada pelo presidente da Casa, Milton Leite (DEM), teve como autor o vereador Eduardo Tuma (PSDB), sobrinho do senador homenageado com o nome da edificação pública. Para a PGJ, a iniciativa da casa legislativa representou “ofensa ao princípio da independência e harmonia entre os poderes”, uma vez que “a atribuição de denominação a bens municipais é ato concreto da administração, que é parte integrante do serviço público de sinalização urbana.

À época da discussão na Câmara, entidades ligadas à defesa dos direitos humanos, e mesmo o Ministério Público, questionaram o poder público sobre a mudança no nome e requereram o veto dela ao prefeito João Doria (PSDB) alegando violações de direitos humanos, durante a ditadura, por parte do homenageado.

A própria secretária municipal de Direitos Humanos e Cidadania à época, Patrícia Bezerra (PSDB), recomendou o veto porque a proposta feriria decreto que proíbe homenagem a nomes ligados à ditadura. A vereadora deixou o cargo em maio em meio a críticas sobre a ação de Doria em uma megaoperação, em conjunto com a Polícia Militar, na região da cracolândia.

Procurada, a assessoria de imprensa da Prefeitura informou que ainda não havia sido notificada sobre a decisão. A assessoria da Presidência da Câmara disse que "vai prestar os esclarecimentos ao TJ e recorrer contra a liminar."

A reportagem tentou contato também com o vereador autor do projeto que originou a lei, Eduardo Tuma, mas, segundo a assessoria do parlamentar, ele não foi localizado.

Nome é celebrar "cultura de violência", diz filho de jornalista assassinado

O diretor executivo do Instituto Vladmir Hergoz, Ivo Herzog, comemorou a decisão judicial. Filho do jornalista Vladmir Herzog, assassinado pela ditadura, em outubro de 1975, o ativista foi uma das vozes contrárias à mudança de nome da ponte.

“Fico muito feliz que a Justiça se pronuncie e impeça essa ação política que estava se fazendo, ainda mais envolvendo um nome tão vinculado com a ditadura”, destacou. “Fiquei muito surpreso, à época dessa discussão, de o próprio prefeito não ter vetado, mas pelo menos a Justiça teve coragem para isso”, completou.

Para Herzog, “é significativo” que nomes ligados ao regime ainda sejam destacados para homenagens –em contraponto, por exemplo, à mudança de nome do Minhocão na gestão do petista Fernando Haddad de “Elevado Presidente Costa e Silva” para “Elevado Presidente João Goulart”.

“Propor uma mudança como a que fizeram significa a continuidade da celebração de uma cultura de violência e de uma página muito triste da história do Brasil. A sociedade precisa ter consciência que muitas dessas pessoas não são heróis, mas equívocos”, concluiu.