Brasil tenta recuperar 139 barragens de alto risco; 107 ficam no Nordeste
O rompimento da barragem da mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), fez autoridades voltarem os olhos às construções para acúmulo de água no semiárido do Nordeste, onde está a maioria das obras públicas deste tipo que apresentam risco no país. Um plano lançado pelo ministério do Desenvolvimento Regional pretende recuperar 107 barragens públicas na região e mais 32 em outras partes do país.
No Nordeste, um longo período de seca desde 2012 terminou no ano passado, e a previsão do aumento das chuvas este ano é motivo de alegria para o sertanejo, mas também de preocupação, segundo alertas feitos após fiscalizações nos últimos três anos. Algumas das barragens têm mais de cem anos de construção e não há histórico de manutenções rotineiras.
Segundo dados da CNM (Confederação Nacional dos Municípios), das 695 barragens com alto risco de ruptura associado a um alto dano potencial, 152 são de abastecimento (humano e/ou animal) e combate à seca no Nordeste. A classificação indicada aponta que, além de terem estruturas com risco de rompimento, elas estão perto de áreas onde moram pessoas. Há ainda outras mais de 200 estruturas que ficam na região, mas que não têm a função especificada. Com outras áreas somadas, há 269 barragens nessa condição de risco.
No último dia 6, o Ministério do Desenvolvimento Regional anunciou o Plano de Ações Estratégicas para a Reabilitação de Barragens. Das 139 que entraram na lista, 107 são do Nordeste. As ações serão em barragens federais destinadas a armazenamento de água.
Casos preocupantes
Segundo apurou o UOL, há casos que são alvo de ações que pedem reparações urgentes de obras. Um deles é a barragem de Jucazinho, em Surubim, no agreste pernambucano. A construção teve problemas estruturais graves notados ainda em 2016 e está na lista de alto risco e alto dano associado. Segundo inspeções, em caso de enchimento, o paredão construído não suportaria a força da água e possivelmente causaria uma tragédia.
O reservatório tem capacidade para 327 milhões de m³, o terceiro maior de Pernambuco.
Outra barragem com problema vista em 2018 pelo MPF na Paraíba é a São Gonçalo, no município de Sousa.
"Para fazer a obra foi necessária a construção de uma ensecadeira [que é um anteparo para conter a água da barragem para que não invada onde está sendo construída], que na verdade parece uma parede de barragem. Como estamos entrando em chuvoso, pode haver a chegada de água a ponto de comprometer essa ensecadeira, que é o que garante o represamento da água", explica o engenheiro do MPF-PB Marcelo França.
O reservatório tem capacidade para 44 milhões de m³ de água e está com 33% do total máximo.
Questionado, o Ministério do Desenvolvimento Regional informou ao UOL que a barragem de Jucazinho teve ordem de serviço assinada para as obras no último dia 7 e as intervenções foram iniciadas. O investimento previsto é de R$ 50,2 milhões.
Já a barragem de São Gonçalo faz parte de um conjunto de 23 estruturas que foram priorizadas pelo Governo Federal porque receberão as águas da transposição do rio São Francisco. "As obras de recuperação estão em andamento e contam com investimentos de R$ 23,7 milhões", informou a pasta.
No interior do Piauí, o UOL revelou que uma barragem com 54,6 milhões de m³ de água teria "risco iminente" de romper, colocando em perigo a vida dos 62 mil habitantes da cidade de Piripiri (a 160 km de Teresina). Um relatório técnico resultou em uma Ação Civil Pública, que exigiu a reparação da construção. Responsável pelo local, o governo do estado negou o risco iminente e informou que já iniciou as reparações.
Paraíba e Piauí já registraram acidentes com mortes nesse século. Em 17 de junho de 2004, o rompimento da barragem de Camará, em Alagoa Nova (PB), deixou cinco mortos. Já em 27 de maio de 2009, o pior dos acidentes: a barragem de Algodões, entre os municípios de Cocal e Buriti dos Lopes (PI), rompeu e provocou 24 mortes.
Fragilidade pelo tempo
Entre as estruturas que passarão por obras federais emergenciais estão as barragens dos dois açudes mais antigos do país: o Cedro e o Quixeramobim, ambos no Ceará, construídos em 1906 e 1907, respectivamente, e de propriedade do DNOCS (Departamento Nacional de Obras de Combate às Secas).
Muitas das construções na região têm mais de 50 anos de existência, e o tempo pode deixar marcas nessa barragens.
"As barragens de concreto podem ter sofrido ressecamento e ficado mais frágeis. Muitos açudes do Nordeste são antigos e não têm tido manutenção. De maneira geral, haveria necessidade de ver todos. Há cidades com barragens acima e que devem ter prioridade", afirma Luiz Carlos Molion, pesquisador e professor aposentado da Universidade Federal de Alagoas.
Além dos paredões, o professor alerta que há outros problemas possíveis. "Elas não preocupam só pelas barragens, mas também as válvulas que vão enferrujando, pelas comportas que não funcionam e precisariam de revisão", completa Molion.
Ainda na resposta à reportagem, a pasta do Desenvolvimento Regional informou que o ministro Gustavo Canuto determinou às instituições federais fiscalizadoras que realizem vistorias nas estruturas. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos também estendeu o comunicado aos 43 órgãos estaduais que atuam na fiscalização de barragens no país.
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