Topo

Esse conteúdo é antigo

Fiéis relatam milagres e pedem santificação do menino Bernardo Boldrini

Bernardo Boldrini - Reprodução
Bernardo Boldrini Imagem: Reprodução

Hygino Vasconcellos

Colaboração para o UOL, em Porto Alegre

28/11/2019 11h28

Resumo da notícia

  • Mulher de 68 anos relata ter sido curada de cegueira pelo menino Bernardo Boldrini
  • Ela mandou uma carta à empresária Juçara Petry, chamada de "mãe" por Bernardo
  • Outra mulher imprimiu mil cópias de um santinho com oração a Bernardo em agradecimento a uma graça alcançada
  • Bernardo foi assassinado pelo pai, a madrasta e mais duas pessoas em 2014

Um grupo de fiéis da Igreja Católica pede a santificação do menino Bernardo Boldrini, morto aos 11 anos em 2014 pelo pai, a madrasta e outras duas pessoas em Três Passos, no Noroeste do Rio Grande do Sul. Pelo menos duas pessoas relatam cura de doença ou graças alcançadas. As histórias começaram a chegar em outubro deste ano à casa da empresária Juçara Petry, chamada de "mãe" por Bernardo, que doou roupas e o ajudava nas tarefas do colégio.

A Diocese de Frederico Westphalen, a 83 quilômetros de distância, disse que ainda não foi comunicada dos casos, o que inviabiliza o início do processo de santificação.

Os supostos milagres

Carta  - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Carta que relata o suposto milagre de Bernardo
Imagem: Arquivo pessoal
Na primeira carta, escrita em 11 de outubro, uma idosa de 68 anos contou que foi curada de uma cegueira. "Desesperada, eu não sabia mais o que fazer. Uma noite eu fui dormir e sonhei que o Bernardo sentou ao lado da minha cama e mexeu nos meus olhos. Acho que ele veio me curar, porque eu comecei a enxergar novamente. Eu fiquei muito feliz e tenho certeza que foi o anjo Bernardo que me curou", descreve a mulher, moradora de Ijuí, no Noroeste do RS.

No relato, a mulher observa que não conseguia mais ler, o que voltou a fazer após a aparição do Bernardo no sonho. "Eu enxergava sombras e agora enxergo bem. Desculpe, mas eu precisava contar. Ele é um anjo, posso apostar."

Na outra correspondência, de 17 de outubro, foram enviados dois santinhos com uma oração ao menino Bernardo. "Ó Deus, pelo menino Bernardo, que sofreu calado o desamor do pais e maus-tratos da madrasta. Que mesmo sofrendo tinha sempre um sorriso no rosto e um abraço carinhoso para todos, por esse sofrimento e por essa virtude heroica do menino Bernardo, atendei ao meu pedido".

Foram impressas mil cópias do santinho devido a uma graça alcançada. A carta foi encaminhada por uma mulher de Curitiba, que conseguiu uma cirurgia para o irmão.

Nos dois casos, uma nova avaliação médica será feita em janeiro do ano que vem, segundo Juçara. A reportagem do Uol telefonou para a idosa de 68 anos que atendeu a ligação e, depois da identificação de repórter, ela desligou e não atendeu mais. Em relação a outra mulher, o único contato disponível é pelas redes sociais e, até a publicação dessa matéria, ela não havia respondido as mensagens.

O caminho para a santificação

Conforme o cônego Carlos Alberto Pereira da Silva, chanceler do bispado da diocese de Frederico Westphalen, os casos ainda não chegaram à igreja e, por isso, o processo de santificação não pode ser iniciado. Antes de se tornar santo, é preciso primeiro que seja considerado servo de Deus, bastando ter "uma vida santa", segundo o cônego. Para isso, o bispo de Frederico Westphalen, Dom Antonio Carlos Rossi Keller, precisa notificar a Congregação para as Causas dos Santos, no Vaticano.

Em seguida, será preciso comprovar um milagre para Bernardo ser considerado beato. Em Três Passos, já há dois beatos por um processo diferente - por martírio - o que dispensa a exigência de um milagre. O padre Manuel Gomez Gonzalez e coroinha Adílio Daronch foram mortos em 1924 durante uma emboscada. Na época, o padre fez o enterro de um membro de um partido e o grupo rival ficou descontente e entendeu o gesto como uma afronta do padre.

"Para o padre era seu dever enterrar essas pessoas como parte da cultura cristã", salienta o cônego. No caso de Bernardo, o chanceler do bispado acredita que não se enquadraria por martírio, pela morte dele não ter sido provocada por sua religiosidade.

Depois de ser considerado beato, iniciaria o processo de santificação. Entretanto, seria necessária a comprovação de mais um milagre. Também é necessário atender a três requisitos: fama de santidade, vivência das virtudes cristãs em grau heroico e ausência de obstáculos insuperáveis contra a canonização. O último item, explica o cônego, seria relacionado a alguma questão política ou disputa, o que não se percebe no caso de Bernardo. Segundo o religioso, o menino atenderia às três exigências.

"O Bernardo era uma criança totalmente alegre. Quando eu soube do acontecido e de que como ele vivia, do dia a dia na casa, a gente dizia: "Não pode ser." Ele era um jovem alegre, tinha vivência com crianças da catequese, tinha liderança positiva, muito educado, muito interessado na religião. Era um jovem que tinha vida miserável, mas conseguia sorrir, tinha otimismo da fé, tinha essa força de Deus. Tinha tudo para não frequentar a igreja, não era estimulado pela própria casa", conta o cônego.

Deus pode utilizar uma criança para operar milagres, santidade é um bem. Ter uma criança que possa testemunhar vivência da vida crista, é um bem para o povo.

O assassinato do menino

Bernardo desapareceu em 4 de abril de 2014 na cidade de Três Passos (RS). Ele tinha 11 anos na época. Seu corpo foi encontrado dez dias depois, em Frederico Westphalen, enterrado às margens de um rio. Edelvânia, amiga da madrasta, admitiu o crime à polícia e mostrou o local onde o corpo foi enterrado. O menino morreu depois de receber uma forte dose do sedativo midazolam.

Em março deste ano, quase cinco anos após a morte do menino, quatro pessoas foram condenadas pelo crime: o pai, Leandro Boldrini; a madrasta, Graciele Ugulini; a amiga do casal, Edelvânia Wirganovicz, e Evandro Wirganovicz, irmão de Edelvânia. O pai foi condenado por homicídio, e a madrasta por homicídio qualificado. Já Edelvânia foi condenada por homicídio e ocultação de cadáver, enquanto o irmão dela, Evandro, foi condenado por homicídio simples e ocultação de cadáver.