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Vídeo: Hospital entrega pernas de amputado à família em caixa de papelão

Do UOL, em São Paulo

10/10/2022 21h06Atualizada em 11/10/2022 07h35

Os membros de um paciente amputado foram entregues à família em uma caixa de papelão na cidade de Paraíso do Tocantins (TO). O pedreiro Deonir Teixeira da Paixão, 46, sofreu um acidente de moto e teve as duas pernas amputadas. Ele foi socorrido no Hospital Regional de Paraíso do Tocantins, que realizou a cirurgia.

Segundo informações do "Jornal Anhanguera", da TV Anhanguera, afiliada da Globo na região, os familiares foram questionados pelo hospital se gostariam que os membros de Deonir fossem levados para casa ou jogados em lixo hospitalar. A família ficou surpresa com a proposta, mas optou por carregar os membros para casa.

As duas pernas do pedreiro foram entregues com uma mensagem descrevendo o conteúdo: "Membro inferior direito sem o pé e membro inferior esquerdo com o pé. Obs: falta um pedaço da perna direita também".

Em um vídeo que circula as redes sociais, os familiares registraram o momento depois que receberam o pacote. "Colocaram as pernas do tio Deonir, entregaram diretamente para o filho dele, não levaram para funerária, para nada. O hospital regional de Paraíso nos entregou em mãos dentro dessa caixa e disse que se nós não levássemos, eles iriam descartar no lixo", diz uma sobrinha, que não teve a identidade revelada.

"Aproveitaram da fragilidade do filho, do irmão, porque acabamos de passar por uma situação muito grave, né? Muito constrangedor isso".

Nas imagens, um homem ainda aparece ao fundo informando que a funerária não sabia o que fazer com os membros do pedreiro. "A funerária alega ainda que diante desse fato não ser procedimento correto, eles não querem fazer a remoção dos membros. Eles alegam que deveria estar lá dentro do necrotério. A gente não sabe o que faz", diz o rapaz.

Um recado colocado na caixa descreve os membros amputados - Reprodução/Redes Sociais - Reprodução/Redes Sociais
Um recado colocado na caixa descreve os membros amputados
Imagem: Reprodução/Redes Sociais

À TV, os familiares informaram que estão muito abalados com a situação. Eles ainda disseram que alguns funcionários chegaram a sugerir que os membros fossem enterrados no quintal da casa da família.

Deonir foi encaminhado em estado grave para o Hospital Geral de Palmas e, agora, a funerária aguarda uma documentação para enterrar as pernas dele no mesmo jazigo em que está o pai de Deonir.

Ao UOL, a SES-TO (Secretaria de Estado da Saúde do Tocantins) lamentou a situação, chamando-a de "falha na comunicação entre a equipe plantonista" e "os familiares do paciente".

"A SES-TO destaca que todas as unidades hospitalares estaduais seguem um protocolo padrão dentro das resoluções da Agência Nacional de Vigilância Sanitária nº 306 (2004) e do Conselho Nacional do Meio Ambiente nº 358 de (2005), as quais versam sobre a disposição final de resíduos dos serviços de saúde", diz comunicado.

A secretaria ainda disse que em casos de amputações, a equipe hospitalar deve dar à família a escolha de "levar os membros ou deixar a cargo do serviço de saúde, o descarte dos mesmos".

"Quando o hospital é responsável pelo descarte de membros, ele ocorre através de empresa especializada contratada para a realização do referido serviço, a qual não trata o material como lixo comum", diz nota.

No caso do paciente Deonir, a secretaria disse que a equipe "não soube explicar o trâmite à família" e que os familiares "assinaram um termo de responsabilidade, o qual consta, inclusive, relatado no prontuário do paciente".

O que fazer com um membro amputado?

De acordo com a SBACV (Sociedade Brasileira de Angiologia e de Cirurgia Vascular), no período de 2012 a 2021, mais de 240 mil brasileiros sofreram amputação de membros inferiores, envolvendo pernas ou pés, uma média de 66 pacientes por dia, o que significa pelo menos três procedimentos realizados por hora. O levantamento foi realizado com base nos dados do Ministério da Saúde.

Mas, assim como no caso do pedreiro Deonir, a família precisou lidar com a falta de informação e burocracia para encontrar um destino para os membros amputados.

Segundo a advogada Pamella Carrieri, no Brasil, não é permitido ter um membro amputado em casa. "Estamos falando de um crime, previsto em lei, inclusive com pena de reclusão de 1 a 4 anos. A guarda de um membro amputado vai ao encontro à lei de crimes ambientais nº 9605/98, em seu artigo 54, que prevê o ato como delito".

Ainda segundo Pamella, o descarte dos membros feito de forma irregular também poderá ser punido. "O descarte indevido do membro pode causar poluição de qualquer natureza. Pela legislação sanitária (Lei nº 6.437/1997), em seu artigo 10 e incisos, em especial ao 29, prevê pena de advertência, dentre outras, caso haja transgressão à norma regulamentadora".

O advogado Caio Ruiz explica que o membro não recebe um atestado de óbito, mas é necessário que o hospital elabore um documento informando como, por exemplo, quais procedimentos foram realizados e o registro no local em que ocorreu a amputação.

"É certo que a lei, em si, não traz a forma de descarte dos membros, considerados, para esse fim, como resíduos sólidos. Contudo, uma resolução da Anvisa, RDC nº 306/2004, em seu item 7, diz que após o registro no local em que fora gerada a amputação e após autorização do governo, é necessário dar um destino para os membros, seja sepultando em cemitério, ou tratamento térmico por incineração, ou cremação, em equipamentos licenciados, em ambos os casos após aprovação do paciente ou, em sua impossibilidade, de sua família", explica Ruiz.