Topo

'Sofri e sofri muito', diz homem resgatado após 40 anos de trabalho escravo

João Ribeiro foi vítima de trabalho análogo à escravidão por 39 anos - Reprodução/TV Globo
João Ribeiro foi vítima de trabalho análogo à escravidão por 39 anos Imagem: Reprodução/TV Globo

Colaboração para o UOL, em Salvador

05/03/2023 23h48Atualizada em 06/03/2023 07h55

Um homem, identificado como João Ribeiro, foi resgatado no fim de janeiro após ser vítima de trabalho análogo à escravidão por quase 40 anos. O relato do trabalhador foi divulgado pelo Fantástico, da TV Globo.

Sofri e sofri muito, eu vou falar para vocês"
João Ribeiro, resgatado de trabalho análogo à escravidão

Segundo a reportagem, João foi resgatado na fazenda de café Boa Vista, em Bueno Brandão, Minas Gerais. A situação degradante do trabalhador foi descoberta quando ele precisou de atendimento médico no final do ano passado por uma suspeita de pneumonia.

"No hospital, verificaram que ele não tinha documento nenhum", disse ao Fantástico Elvira Tomazin, auditora-fiscal do Trabalho.

A equipe do hospital desconfiou de que havia algo errado e alertou a Assistência Social do município, que fez a denúncia ao Ministério do Trabalho e Emprego. Os auditores-fiscais realizaram uma operação e encontraram João capinando a terra, descalço.

Segundo os auditores, João dormia em uma espuma suja. No local não tinha eletrodomésticos ou eletrônicos, como geladeira ou televisão. O único dinheiro encontrado com o trabalhador eram notas antigas do Brasil, como o cruzeiro.

É quase difícil de acreditar. Eu fico inconformada como é que alguém consegue submeter um ser humano nas condições em que a gente encontrou esse senhor? Ele era uma pessoa que praticamente não existia para o Brasil" Elvira Tomazin, auditora-fiscal do Trabalho

Trabalho na fazenda

O empregador disse às autoridades que João do Brejo chegou à fazenda em 1984, perdido e procurando uma oportunidade de trabalho. Ele viveu durante 39 anos em condições degradantes e sem salário registrado.

"Ele é um paciente diabético e hipertenso, não fazia uso das medicações de uso contínuo. Já providenciamos também toda a vacinação. A gente desconhece cartão vacinal desse paciente", disse o médico Sérgio Ribeiro Goulart.

Atualmente, João vive em um lar de idosos. "Recebi nada, nada, só trabalho. Só trabalho", disse o homem ao Fantástico.

O empregador se chama David Aparecido de Oliveira. Ele não respondeu ao pedido de entrevista do Fantástico, nem o advogado dele.

Em 27 de fevereiro, em Bueno Brandão, "João do Brejo", como é conhecido, recebeu as verbas rescisórias do antigo patrão. Na sexta-feira (3), ele recebeu seus documentos — como certidão de nascimento, identidade, CPF e cartão do SUS.

No mês passado, 207 pessoas foram resgatadas em Bento Gonçalves (RS) em trabalho análogo à escravidão em vinícolas. A maioria saiu da Bahia em busca de uma oportunidade de trabalho.

Na quinta, a empresa Fênix Serviços Administrativos e Apoio a Gestão de Saúde LTDA, responsável pela terceirização dos trabalhadores resgatados na Serra Gaúcha, rejeitou o acordo de indenização apresentado pelo Ministério Público do Trabalho.