Juíza censura série do Intercept sobre mães que perderam guarda dos filhos
A 14ª Vara Cível do Rio de Janeiro obrigou o site The Intercept Brasil a retirar do ar uma série de reportagens sobre abusos na aplicação da lei de alienação parental. As publicações contam histórias de mães que perderam a guarda dos filhos para homens que, em alguns casos, eram acusados de estupro de vulnerável e violência doméstica.
O que aconteceu
A juíza Flávia Gonçalves Moraes Bruno tomou a decisão a pedido do pai de uma das crianças citadas. O material censurado é a série "Em nome dos pais", da repórter Nayara Felizardo, composta de quatro textos e um minidocumentário.
A magistrada ordenou a retirada do material em até 48 horas, sob multa de R$ 300 por dia, até o limite de R$ 30 mil, em caso de descumprimento.
O Intercept já cumpriu a decisão, mas afirma que vai recorrer em todas as instâncias. Os links seguem no ar, porém com uma mensagem de que a série "Em nome dos pais" foi retirada do ar por decisão judicial e que "discorda veementemente" da sentença.
Segundo a juíza, a reportagem usou documentos sigilosos e a sua exposição poderia causar danos à imagem e à intimidade da criança.
O Intercept ressalta, no entanto, que alterou os nomes de todos os envolvidos para evitar que fossem identificados. O site também contesta o uso de processos sigilosos como justificativa para a censura do material.
Em nota, o site afirma que apenas as partes envolvidas são proibidas de publicar essas informações, mas não a imprensa.
Caso o entendimento adotado por essa decisão seja 100% aplicado, será impossível fazer jornalismo sério no país e abrirá um precedente extremamente perigoso, que derrubaria os mais importantes furos jornalísticos dos últimos anos. E este é provavelmente apenas o começo de uma longa batalha legal que pretendemos travar, indo até o STF se necessário".
Nota do Intercept sobre a decisão judicial
Série expõe juízes, desembargadores e psicólogos
A primeira reportagem conta a história de mães que sofreram consequências ao denunciar pais por violência sexual. Em um dos casos, o Judiciário deu ao pai a guarda de uma filha que o acusou de abuso, segundo a matéria.
Na segunda reportagem, o foco são psicólogos que elaboram laudos para beneficiar os pais nas disputas judiciais. Contratados pelos suspeitos, os profissionais teriam ignorado indícios de abuso dos homens com o objetivo de responsabilizar as mães.
O terceiro texto conta a história de um homem que conseguiu a guarda das crianças mesmo após ameaçar a ex de morte. A mãe foi impedida pela Justiça de ver as crianças e, mais tarde, elas foram assassinadas pelo pai, segundo o texto.
Na quarta reportagem, o foco são homens acusados de abuso que teriam feito lobby para alterar a lei de alienação parental. Segundo o texto, eles agiram para interferir em um projeto que alterou a legislação.
Criada em 2010, a lei de alienação parental busca evitar que o pai exclua a mãe do convívio com a criança, ou vice-versa. As reportagens, porém, mostraram casos em que a legislação foi distorcida para defender homens acusados de abuso.
O minidocumentário, que também compõe a série, trata de uma psicóloga notória pela defesa da lei. Servidora do TJ-RJ, a profissional prometia pareceres para fortalecer a tese da defesa dos homens acusados.
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