'Virei influencer de faxina e descobri acumulador que precisava de ajuda'
O faxineiro Guilherme Gomes, de 20 anos, costuma dizer que a limpeza e a organização nasceram com ele. "Eu só não pensei que isso provocaria uma mudança na minha vida", disse ele ao UOL.
Aos 17 anos, o jovem de Manaus começou a limpar a casa de pessoas próximas porque não passava por uma boa fase financeira.
Diante da satisfação dos clientes, ele decidiu divulgar o seu trabalho nas redes sociais mostrando o antes e depois das faxinas. A estratégia deu certo.
Eu não sabia nem cobrar, era R$ 50 uma faxina em um sobrado. Mas estava feliz porque estava trabalhando. Tudo aconteceu de uma forma muito rápida.
Com o pé de meia que fez com aquelas primeiras faxinas, Guilherme investiu em uniforme para "passar mais profissionalismo".
Não demorou para que seus vídeos percorressem o Brasil e ele virasse "influencer de faxina". E, depois, a pessoa que limpa casa de acumuladores compulsivos.
'Saí da bolha'
Convivendo com tantas pessoas e histórias diferentes, Guilherme notou que muitas vezes a desorganização das casas mostravam muito mais do que uma pia cheia de louças ou chão sujo.
Em alguns clientes, eu percebia que a bagunça e a sujeira da casa eram diferentes do que eu estava acostumado a ver. Eu ficava muito assustado, só que eu não julgava. Eu conversava e a pessoa se abria, tinha confiança em contar os problemas dela.
Guilherme ainda não sabia, mas ele provavelmente estava lidando com pessoas com transtorno de acumulação. O jovem logo entendeu que, para elas, se livrar de determinados objetos poderia ser muito dolorido. E, muitas vezes, o transtorno estava associado à depressão.
Para qualquer pessoa, aquilo é lixo. É entulho. Mas, para eles, não é. Não posso simplesmente pegar e jogar fora. Tem um valor sentimental que é muito maior do que a gente imagina.
Aos poucos, ele foi deixando as faxinas comuns de lado e se especializando neste nicho. Hoje, o jovem se dedica a limpar casas de acumuladores compulsivos de forma voluntária com a intenção de mostrar para eles uma "possibilidade de recomeço".
Fazendo esse trabalho, eu saí de uma bolha muito grande em que eu vivia. Uma pessoa que vive dessa forma, em uma depressão severa, não tem mais esperanças. Fazendo faxina, eu descobri que impactava de forma positiva a vida delas.
Hoje, Guilherme recebe entre 10 e 15 pedidos de ajuda por dia. Alguns são das próprias pessoas que passam pelo problema, mas geralmente o contato é feito por terceiros.
Ajuda dos seguidores
Por se tratar de um trabalho voluntário, Guilherme passou a contar com a ajuda de seus seguidores para realizar essas limpezas. Atualmente, as redes sociais de Guilherme somam mais de 4 milhões de seguidores.
Alguns contribuem com um apoio financeiro, em uma vaquinha. Outros querem colocar a mão na massa no dia da faxina. Antes, as limpezas eram feitas apenas por ele e pela prima Jhule Vitória.
Os custos que temos são absurdos, principalmente das caçambas. Tem casas que a gente utiliza de 15 a 20 caçambas. E os valores variam entre R$ 350 e R$ 650 cada uma.
"Tem casas que, por exemplo, precisam de pintura. A gente manda pintar. Outras precisam de móveis, a gente compra. É um custo bem alto", completa.
Em suas redes, ele está em comunicação direta com donas de casa de todo o Brasil dando dicas e mostrando o antes e depois das casas dos acumuladores. Através do seu trabalho como influencer, ele já consegue se manter em São Paulo, onde mora há um ano.
'A gente vende saúde'
Inicialmente, as casas atendidas pelo projeto ficavam em Manaus ou regiões próximas da capital amazonense. Quando se mudou para São Paulo, passou a abraçar residências na cidade e região metropolitana. Mas um dos casos que mais marcou Guilherme foi no Rio de Janeiro.
"Era uma mãe com duas bebês, uma de 1 ano e 10 meses e a outra acho que não tinha nem um mês de vida. A história dela era muito pesada", contou ele. A pedido da mulher, ele não revelou mais detalhes sobre a situação psicológica em que ela estava.
Ele e a equipe levaram quase três dias apenas tirando lixo e a sujeira mais pesada do apartamento. Em um dos vídeos, Guilherme fala sobre a situação da geladeira. "Impressionante, várias comidas estragadas. Um cheiro insuportável."
A equipe do influencer começou a limpeza dos pisos e paredes e finalizaram com uma minirreforma. As crianças ganharam enxoval e brinquedos.
Apesar de não enxergar seu projeto como algo local, focado em São Paulo, Guilherme acredita que a cidade tem mais problemas neste sentido do que outros municípios.
"São Paulo é a maior cidade da América Latina e tem a questão do consumo, porque as pessoas são muito consumistas", opina ele.
O faxineiro diz que, ao contrário do que muitos pensam, trabalhar com limpeza não é "última opção" - tem quem goste muito do ofício e sinta prazer em oferecer ambientes limpos e higienizados aos outros.
"A gente vende saúde também. A gente está ali limpando, desinfectando, trazendo bem-estar para essas pessoas", finaliza.