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Advogados pedem 'lupa' sobre apurações de delegado preso em caso Marielle

Casos de vítimas de violência policial que ocorreram durante a gestão de Rivaldo Barbosa Imagem: Arte UOL (Fábio Gonçalves/Agência O Dia/Estadão Conteúdo/ Arquivo Pessoal/Reprodução)

Do UOL, em São Paulo

27/03/2024 04h00

Advogados que atuam em casos de homicídios ocorridos no Rio durante o período em que Rivaldo Barbosa esteve à frente da Polícia Civil defendem uma revisão de investigações. Ele foi preso por suspeita de ter planejado o assassinato de Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes.

O que aconteceu

O advogado da família de Marcos Vinícius da Silva, 14, morto em 2018 numa operação policial, afirma que pedirá reabertura do caso. O adolescente foi baleado pelas costas quando ia para a escola no Complexo da Maré, na zona norte. "Vamos entrar com recurso para revisão do processo", diz o advogado João Tancredo.

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Justiça arquivou o caso na gestão de Rivaldo Barbosa. Segundo Tancredo, a perícia foi tendenciosa e desconsiderou o depoimento das testemunhas arroladas pela família e priorizou o de policiais. "O tiro veio do Caveirão. A perícia afirmou que o tiro veio de onde estavam os traficantes."

Caso da morte da auxiliar de serviços Cláudia Silva Ferreira, baleada em Madureira em 2014, também deverá ser alvo de pedido de reabertura. Tancredo diz que a reconstituição do caso ocorreu no período em que Rivaldo era chefe da polícia.

A Justiça absolveu PMs envolvidos. A morte de Cláudia ganhou repercussão após um vídeo flagrar o corpo dela sendo arrastado por uma viatura da Polícia Militar. "O juiz determinou a absolvição dizendo que o policial cometeu erro de pessoa, mas é preciso responder por esse erro", diz o advogado.

Criação de força-tarefa

Advogados preveem pressão sobre promotores. João Pedro Accioly, que atuou no caso do menino Eduardo de Jesus, morto por policiais em 2015, no Complexo do Alemão, na zona norte do Rio, defende a criação de uma força-tarefa para revisar casos investigados pelo delegado Barbosa. "Vamos pressionar o promotor responsável pelo caso para avançar."

Tancredo sugere a criação de uma força-tarefa independente, formada pela Defensoria Pública e o Ministério Público. O MP-RJ tem sido muito complacente com essas investigações quando decide pelo arquivamento", diz o advogado, que também representa a viúva de Marielle, Mônica Benício, e da assessora da vereadora, Fernanda Chaves.

Ouvidorias externas ao Ministério Público poderiam funcionar para fiscalizar órgão, diz Tancredo. O UOL entrou em contato com o MP-RJ e com advogado Alexandre Dumans, que defende Barbosa, mas não obteve resposta. Sobre a suspeita no caso Marielle, a defesa dele disse ao UOL ontem ser "fantasiosa".

Polícia diz que tem compromisso com o combate ao crime. A Secretaria de Estado de Polícia Civil (Sepol) informou que, no fim do ano passado, criou um grupo de trabalho no Departamento Geral de Homicídios e Proteção à Pessoa (DGHPP) para analisar os inquéritos de homicídios ainda sem solução, relacionados ao crime organizado, seja milícia, tráfico ou contravenção.

"Trabalho conjunto entre as instituições segue para elucidar casos e responsabilizar envolvidos". A nota da Sepol também diz que, em reunião com o Gaeco (Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público, "foram elencados, em comum acordo, homicídios que deveriam ser tratados com atenção especial, uma vez que as investigações apontavam para crimes cometidos por essas organizações criminosas."

MP tem a função de fiscalizar a atividade policial. "A atividade de revisão do MP tem que se dar sobre todos os casos que ele atuou, inclusive, envolvendo pessoas em situação de vulnerabilidade", diz Borges.

O Estado do Rio foi parceiro do crime organizado. A organização criminosa chefiada por Rivaldo Barbosa, ao que tudo indica, impediu ou fraudou a persecução criminal de diversos homicídios na última década. É fundamental revisitar 'o passado mal resolvido', para determinar a extensão da engrenagem e corrigir as injustiças promovidas por ela.
João Pedro Accioly, advogado de Terezinha de Jesus, mãe de Eduardo de Jesus Ferreira, morto em 2015

Quando a reabertura pode ocorrer

O pedido de reabertura de um caso depende da apresentação de novas provas. "O fato de Rivaldo Barbosa ter sido preso suspeito de envolvimento no caso Marielle não é suficiente para abrir todos os casos em que ele atuou. Esse fato por si só não contamina todos os outros", diz Rafael Borges, presidente da Comissão de Segurança Pública da OAB-RJ.

Identificadas as lacunas, os advogados podem pedir a reabertura. "A esse pedido se soma o fato de que havia um delegado suspeito de envolvimento em um crime. Mas, esse é um argumento de reforço, não decisivo", diz.

Quem faz o arquivamento dos casos é o Ministério Público. "O pedido é feito nos autos do inquérito, o MP pode denunciar ou pedir reabertura do inquérito e a polícia faz diligências", afirma Borges.

Boa parte das alegações que fazíamos à época ganha força com a prisão do ex-chefe da Polícia Civil. Existiu no Rio de Janeiro uma engrenagem que impedia a responsabilização de criminosos. Agora, isso não está mais no plano das alegações, temos evidencias.
João Pedro Accioly, advogado

Casos sob Barbosa já reabertos

Dois outros casos emblemáticos ocorridos no período em que Rivaldo Barbosa era chefe da polícia foram reabertos. Um deles é do menino Eduardo de Jesus Ferreira. Em setembro passado, o advogado João Pedro Accioly conseguiu o desarquivamento no Ministério Público. O garoto de 10 anos foi morto ao ser atingido por um disparo na cabeça — o inquérito havia concluído pelo arquivamento do caso sob a justificativa de legítima defesa dos policiais.

Novas provas foram apresentadas. Segundo Accioly, foram apresentadas testemunhas que não tinham sido ouvidas e 43 vídeos inéditos que documentavam a reação imediata da família, da comunidade e da PM no momento da morte do menino.

Presetação de advogado apontou indícios de fraudes e obstruções. O advogado escreveu que Rivaldo Barbosa teria "subtraído evidências do local do crime" e oferecido propina para o pai do menino deixar o Rio. Ele teria levado os pais do menino até um hotel, na Barra da Tijuca e teria dito a eles "agora vocês têm que me obedecer". Em novembro, a 1ª Promotoria de Investigação Penal instaurou um Procedimento Investigatório Criminal sobre o caso.

Advogado diz que havia indícios de que havia uma atuação de organização criminosa. "Pedi a reabertura oferecendo uma denúncia e solicitando a criação de uma força-tarefa. O MP reabriu as investigações, mas decidiu não enfrentar a questão sistêmica."

Outro caso que ocorreu na época em que Barbosa esteve na Delegacia de Homicídios é o da menina Maria Eduarda, 13. A adolescente foi morta com tiros de fuzil dentro de uma escola pública, em Acari, na zona norte, durante operação da PM, em 30 de março de 2017. Segundo Tancredo, advogado da família, o caso já tem pedido de recurso no Ministério Público.

Procurada pelo UOL, a Polícia Civil se manifestou sobre os casos citados nesta reportagem:

  • Morte do menino Eduardo de Jesus: a polícia informou que não recebeu do MP pedido para novas diligências
  • Morte da menina Maria Eduarda Alves: a DHC (Delegacia de Homicídios da Capital) "instaurou inquérito, que foi concluído e relatado ao MP, em 2017, com o indiciamento de um policial militar"
  • Morte de Claudia Silva Ferreira: "a investigação foi realizada pela 29ª DP (Madureira). O inquérito foi concluído e relatado ao MP em 2014. Um traficante foi preso em flagrante e a autoridade policial representou pela prisão de dois policiais militares"
  • Marcos Vinícius da Silva: "a investigação está em andamento na DHC e é acompanhada pelo MP"

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