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Movimentos negros querem 'ações concretas' de Portugal sobre reparação

Do UOL, em São Paulo

24/04/2024 15h57Atualizada em 24/04/2024 19h15

Movimentos negros brasileiros reafirmam responsabilidade de Portugal sobre a escravização, mas veem com ceticismo o posicionamento do presidente português sobre a necessadidade de reparações por crimes cometidos na era colonial.

O que aconteceu

Marcelo Rebelo de Souza, presidente de Portugal, disse na terça-feira (23) que Portugal "assume total responsabilidade" pelos erros do passado. Se posicionando sobre a escravização, o governante afirmou: "Temos que pagar os custos".

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Movimentos negros querem que o Brasil cobre países colonizadores. Ouvidos pelo UOL, a Coalizão Negra por Direitos, o MNU (Movimento Negro Unificado), o Instituto Marielle Franco e a Unegro são unânimes no argumento de que Portugal tem o dever de reparar países colonizados pelo racismo sistêmico, mas custam a acreditar no pagamento da dívida.

As lideranças negras exigem "ações concretas" dos países envolvidos. "Só acredito vendo. Pedidos de desculpas são insuficientes. Tem que haver indenização aos países, com ações voltadas para população afrodescendente e africana", diz Simone Nascimento, coordenadora do MNU.

[Manifestações de bancos suíços na escravidão e do presidente de Portugal] configuram condições objetivas para que o Brasil cobre reparações por ser um país que carrega as consequências do que foi a escravização por quase quatro séculos.
Douglas Belchior, co-fundador da Coalizão Negra por Direitos e presidente Uneafro

No Brasil, [a escravização] dizimou não apenas africanos, mas indígenas também. Essa fala deve se tornar ação concreta, a começar pelo diálogo com os países e elaboração de ações.
Simone Nascimento, coordenadora MNU

É uma oportunidade para que Portugal pague sua dívida histórica com o povo negro deste país. Nós, negras e negros brasileiros, precisamos ser protagonistas nesse processo. Qualquer ação concreta sobre reparações pelos danos causados pelo colonialismo deve partir de um processo que garanta participação ativa, ampla e qualificada dos movimentos negros brasileiros
Lígia Batista, diretora do Instituto Marielle Franco

Sempre estivemos em busca de reparação. Agora, de uma forma voluntária, um governo dizer que vai fazer reparação, a gente precisa ver para crer. O negro vai ter que esperar agora para ver se isso é uma realidade. Mas eles nos devem.
Rosa Anacleto, coordenadora da Unegro

Busca por quem estava por trás da escravização

Posicionamento de Portugal é apenas o primeiro passo em busca de retratação. "Tem que ver quem financiou", diz o professor Helio Santos. Consultor de diversidade de empresas brasileiras, ele é autor de "A busca de um caminho para o Brasil: a trilha do círculo vicioso", que discute o desenvolvimento do país na amplitude sociorracial.

Espera-se ainda que Brasil "dê o exemplo" responsabilizando as suas próprias instituições. Douglas Belchior, co-fundador da Coalizão Negra por Direitos, lembra o caso do Banco do Brasil, que pediu perdão publicamente pelo envolvimento com o comércio de negros escravizados no século 19. Nenhuma reparação foi paga pelo banco.

Tem que discutir com os proprietários das embarcações que ganharam muito dinheiro por anos de tráfico. As toneladas de ouro extraídas daqui foram, afinal, para qual país? É o início de um processo importante.

A escravidão mais longa do mundo se deu aqui.
Helio Santos, professor e doutor em administração (USP)

É a grande oportunidade do Brasil cobrar reparações em nível internacional e dar o exemplo dentro de casa.
Douglas Belchior, co-fundador da Coalizão Negra por Direitos e presidente Uneafro

Mais de quatro séculos de dívidas

Países europeus foram os principais beneficiados do período de escravização, que durou mais de quatro séculos. Ao menos 12,5 milhões de pessoas foram tiradas do continente africano e levados à força por longas distâncias para serem comercializados em países colonizados.

"Pedir desculpas é a parte mais fácil", disse o presidente de Portugal. Durante a fala, Rebelo não pediu desculpas, mas reconheceu a responsabilidade da reparação. "Há ações que não foram punidas e os responsáveis não foram presos? Há bens que foram saqueados e não foram devolvidos? Vamos ver como podemos reparar isso", disse.

Mulheres negras cobraram reparação de Portugal na ONU. No Fórum Permanente para Pessoas Afrodescendentes — evento mais importante da Organização das Nações Unidas sobre a questão racial —, líderes de seis entidades da sociedade civil cobraram no último dia 19 um posicionamento de Lisboa sobre a escravidão.

ONU já admitiu que países poderão considerar reparações financeiras, não houve avanço. A entidade alegou que as reivindicações legais são complexas pelo tempo que passou e pela dificuldade de identificar os escravizadores e as vítimas.

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