Desconfiança e mistério: mãe e filha 'moram' há 2 meses em McDonald's do RJ
Daniele Dutra
Colaboração para o UOL, no Rio de Janeiro
26/04/2024 11h56Atualizada em 27/04/2024 13h21
Duas mulheres acompanhadas de pelo menos cinco malas grandes, de boa qualidade, têm passado dias e noites acampadas no McDonald's do Leblon, zona sul do Rio de Janeiro. Mãe e filha estão há mais de dois meses no fast food, consomem lanches diariamente e só saem do local quando fecha, por volta das 5h da manhã, desde meados de fevereiro.
A mãe, de 64 anos, e a filha, de 31, são apontadas por moradores da região como responsáveis por darem calote em ao menos dois imóveis que tentaram alugar.
O UOL foi até o local, mas acabou sofrendo ameaças da filha antes mesmo de tentar uma entrevista. O local tinha ao menos cinco seguranças que se dividiam na calçada da lanchonete, no primeiro e no segundo andar, e seguiram a reportagem durante todo o momento — um deles afirmando que não se poderia tirar fotos ali. Minutos depois, o mesmo segurança avisou a mulher mais nova que uma fotografia havia sido tirada.
"Você já apagou a foto? Sabia que se eu chamar a PM agora você vai presa? Eu sou estudante de direito, você não vai me enrolar não. Eu vou processar todo mundo que está me expondo", disse a filha à reportagem. Ela se negou a conversar e explicar por que morava com a mãe há mais de dois meses no local.
Uma mulher que estava conversando com a mais nova, antes da ameaça, disse que é psicóloga e que ofereceu acolhimento e escuta para mãe e filha: "Elas estão muito abaladas e tristes com toda essa exposição. Não quiseram abrir a situação, falaram apenas que são do Sul e moram no Rio há alguns anos", disse ela.
Diferentemente das outras testemunhas ouvidas pela reportagem, ela disse que mãe e filha foram agradáveis, trocaram telefones e em momento algum fizeram algum tipo de grosseria.
Já na banca de jornal que fica a poucos metros da lanchonete, uma testemunha mostrou desconfiança: "Elas estão aí há meses, não têm casa, mas têm dinheiro para comer todos os dias? Muito esquisito. Para mim são duas trambiqueiras. Já arrumaram confusão com os seguranças, com os funcionários, com os clientes. São extremamente ignorantes com todo mundo que se aproxima. Muito estranho tudo isso, mas boa coisa não é", disse o homem, que preferiu não se identificar.
A lanchonete fica na esquina da avenida Ataulfo de Paiva e a rua Carlos Goís, ao lado de um mercado. Um dos funcionários disse ao UOL que as duas são conhecidas na região por darem calotes: "Todo mundo aqui na região se conhece e comenta sobre esse assunto. A fama delas é de ter dado calote em dois imóveis aqui na região. Elas alugam, não pagam e são despejadas. A outra história que contam que o marido da mulher mais velha mora na França e elas estão esperando ele voltar para se mudarem. Mas que marido é esse que não paga um hotel, um lugar para essas duas ficarem?", disse a testemunha.
Já do outro lado da rua, o funcionário de uma lanchonete contou que já viu várias vezes as duas dormindo na calçada, fora do McDonald's. Como a lanchonete fecha às 5h da manhã e reabre somente às 10h, elas ficam do lado de fora, esperando.
"É muito estranho. Um casal perguntou se elas gostariam de um lugar para tomar um banho, se precisavam de ajuda e ela foi super grossa, disse que não estava pedindo nada a ninguém. Já um outro, que é médico, percebeu que a mulher mais velha estava com problema no olho. Perguntou se ela queria ajuda, se queria ir ao médico, mas ela também foi ríspida. O que eu não entendo é como o McDonald's permite uma coisa dessas. Se eu que sou preto, morador de comunidade, decido me hospedar ali, não fico nem um dia. Rapidinho eles iam achar um jeito de me tirar de lá", disse o homem.
A dupla está sempre com dinheiro para pagar os lanches no fast food e bem vestidas. Bruna usava um blazer preto, com calça, blusa e uma bolsa de corrente. Já a mãe estava com um casaco marrom e óculos escuros, mesmo sendo à noite.
A Secretaria de Assistência Social da Prefeitura do Rio esteve no local nos dias 10 e 16 de março e disse que as mulheres não se sentem em situação de vulnerabilidade e nem quiseram receber ajuda.
"Apesar de terem oferecido vagas em abrigos e outros serviços disponíveis na rede de apoio socioassistencial, elas recusaram prontamente", diz a nota.
A Segurança Presente, órgão que faz apoio à segurança pública, esteve na lanchonete no dia 22 de março com assistentes sociais do Leblon Presente, acionadas por moradores para verificarem a situação dessas duas mulheres que carregavam grandes malas.
"Desde o dia 18 de fevereiro, elas aguardam a abertura do restaurante para passarem o dia no seu interior e, no horário de fechamento, a dupla se abriga na calçada da mesma rua. Ao serem abordadas pelas assistentes sociais, as mulheres afirmam não estarem interessadas em acolhimento institucional ou abrigo. Elas se recusam a aceitar ajuda e afirmam estar procurando um apartamento para alugar no Leblon. Também mencionaram que recebem apoio financeiro do marido de Susane, que mora na Inglaterra. A equipe de serviço social continua em contato com as mulheres, buscando estabelecer um vínculo de confiança para oferecer assistência e orientação adequadas. Até o momento, a situação não se alterou, e elas afirmam ter o direito de permanecerem no estabelecimento e consumir", diz a nota enviada ao UOL.
Já a Polícia Civil informou que de acordo com a 14ª DP (Leblon), o estabelecimento não registrou ocorrência contra as mulheres na delegacia da área e não há comunicação de crime relacionado à permanência delas no local.
A reportagem buscou um posicionamento do McDonald's, mas não obteve resposta até o momento.