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Brasil pode perder R$ 7,7 bi com contrabando de cigarro eletrônico em 2025

A venda e publicidade de DEFs são proibidas no Brasil pela Anvisa desde 2009 Imagem: iStock

Do UOL, em São Paulo

26/09/2024 05h30

Um estudo feito por pesquisadores da USP (Universidade de São Paulo) aponta que o Brasil pode deixar de arrecadar R$ 7,7 bilhões em impostos estaduais e federais em 2025 com o comércio ilegal de cigarros eletrônicos.

O que aconteceu

Pesquisa foi apresentada na quarta-feira (25). O estudo foi realizado pela Esem (Escola de Segurança Multidimensional), do IRI (Instituto de Relações Internacionais) da USP, e patrocinada pela PMI Impact, que é uma iniciativa da empresa multinacional Philip Morris International, produtora de tabaco e derivados, que visa "fortalecer iniciativas de combate ao comércio ilegal".

Segundo o levantamento, a tributação média no país poderia ser de até R$ 10,3 bilhões em 2028. O cálculo segue uma "perspectiva conservadora do crescimento do mercado e do consumo mensal dos DEFs". Especialistas já ouvidos pelo UOL, porém, alertaram que os valores arrecadados podem ser insuficientes para lidar com os gastos futuros em saúde pública por danos provocados pelo uso dos DEFs (Dispositivos Eletrônicos para Fumar).

O estudo se baseou no levantamento da Fiemg (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais). Os dados indicaram um mercado consumidor potencial de 3,3 milhões de usuários de DEFs no território nacional. Já o crescimento do mercado foi estimado a partir do aumento observado nos últimos anos, identificado pela consultoria Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria), e o crescimento populacional indicado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

O professor Leandro Piquet, coordenador da Esem-USP, destacou o comércio intenso de produtos desse mercado na internet. O professor apontou que esses produtos podem ser comprados "facilmente" por canais digitais. A venda e publicidade de DEFs são proibidas no Brasil pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) desde 2009. Em abril deste ano, a agência regulatória também reforçou e aumentou as imposições em torno dos produtos.

Os pesquisadores envolvidos no estudo indicaram que o crescimento contínuo no consumo dos DEFs, mesmo diante da ilegalidade, põe em xeque a eficácia das políticas atuais de proibição. Eles também sugeriram que a regulamentação, com a tributação dos itens, "poderia ser uma solução mais viável para combater tanto o mercado ilegal quanto os problemas de segurança pública associados a ele". Todavia, esses argumentos foram rebatidos por especialistas da área da saúde ouvidos pelo UOL (entenda mais abaixo).

O comércio ilegal de cigarros eletrônicos está sustentando em quatro pilares: proibição, contrabando, corrupção de agentes públicos e comercialização digital. (...) Redes criminosas nacionais e transnacionais, organizadas ou não, estão suprindo o lado da oferta de forma eficiente e eficaz, praticando preços condizentes com o mercado brasileiro e canalizando recursos econômicos para outras atividades criminosas, como corrupção de agentes públicos, tráfico de armas, tráfico de drogas, entre outros.
Professor Leandro Piquet, coordenador da Esem-USP

Pesquisa analisou a perda em alguns estados

São Paulo deixou de arrecadar R$ 1,65 bilhão em impostos estaduais e federais com o comércio ilegal de cigarros eletrônicos em 2024. Conforme os pesquisadores, o estado representa 20% de todas as apreensões de DEFs realizadas no país.

Já no Rio Grande do Sul, se considerado o aumento anual de 10% no mercado dos cigarros eletrônicos, a arrecadação estadual poderia atingir R$ 503,14 milhões em 2028. Os valores se baseiam na estimativa de crescimento contínuo da demanda dos consumidores por DEFs e no aumento da venda em lojas físicas e plataformas onlines com uma possível liberação dos produtos, segundo a pesquisa. Eles ponderam que o estado tem uma localização estratégica por fazer fronteira com outros países, o que facilita a entrada de mercadorias legais e ilegais.

Outro estado analisado é o Paraná, que deixou de arrecadar R$ 350 milhões em impostos em razão do comércio ilegal de DEFs. O número pode chegar a R$ 500 milhões em 2028. O estado faz fronteira com o Paraguai, que é hoje o maior mercado exportador dos produtos para o Brasil, Argentina e Uruguai. Enquanto isso, a estimativa de perdas anual para a Bahia foi de R$ 533 milhões, segundo o estudo, podendo chegar a R$ 780 milhões até 2028.

Projeto de lei quer regularizar produtos

Imagem: iStock

Os cigarros eletrônicos são proibidos no Brasil, contudo, o PL (Projeto de Lei) 5008/2023 prevê regulamentar os produtos, definindo exigências para a indústria. O texto indica multa e detenção para quem vender os DEFs para menores de 18 anos. Além disso, a indústria seria obrigada a ter registro na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), cadastro na Receita Federal e no Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial).

A autora do PL, senadora Soraya Thronicke (Podemos), argumentou que os cigarros eletrônicos já são vendidos sem nenhuma regra sanitária. Além disso, a parlamentar expõe que o Estado não consegue arrecadar impostos com os produtos contrabandeados — o que não aconteceria com o produto legal. O projeto aguarda votação no Senado Federal.

A Abifumo (Associação Brasileira da Indústria do Fumo) defende que seja suspensa a proibição do cigarro eletrônico no Brasil. O objetivo, de acordo com a entidade, seria estabelecer parâmetros para a comercialização.

Especialistas demonstram preocupação

À reportagem do UOL neste mês, especialistas apontaram problemas relacionados à dependência em cigarro eletrônico, inclusive entre o público adolescente e jovem. Para instituições, o dinheiro arrecadado com impostos não daria conta de sanar os danos futuros, provocados pelos DEFs, na saúde pública do Brasil.

Em agosto, mais de 80 entidades médicas brasileiras emitiram nota repudiando a possível legalização dos cigarros eletrônicos.

O país vai enfrentar um grande problema de saúde pública por conta dos vapes em pouco tempo, alerta pneumologista. Fred Fernandes, integrante do conselho da SPPT (Sociedade Paulista de Pneumologia), avalia que argumentar que o dinheiro arrecadado poderia ser usado na saúde pública "é completamente obtuso". "É como pedir dinheiro para um agiota, você vai pagar uma conta muito maior em pouco tempo lá na frente", comentou.

"Deve se tornar um grande problema, talvez mais rápido do que o cigarro". Fernandes explica que, ao contrário dos cigarros tradicionais, os pods, vapes e semelhantes têm um grande apelo estético ao público jovem.

Cigarro eletrônico pode ser mais nocivo que o tradicional. Um usuário de cigarro eletrônico carrega em seu organismo de 3 a 6 vezes mais substâncias nocivas do que um usuário de cigarro comum, segundo pesquisa do InCor (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da USP). De acordo com Jaqueline Scholz, diretora do Núcleo de Tabagismo do InCor e coordenadora da pesquisa, "o estudo indica que a intoxicação por nicotina em quem usa o cigarro eletrônico é tão alta quanto, ou até pior, que nos usuários de cigarro tradicional".

Não tenho a menor dúvida de que o cigarro eletrônico, se não for trabalhada a questão do uso, vai se tornar um problema de saúde pública tão importante nesse século como foi o cigarro no século passado. A gente viu a explosão do câncer de pulmão, que era uma doença rara e se tornou o câncer que mais mata. Já existem dados de que dentro da fumaça do cigarro eletrônico existem muitas substâncias tóxicas, além da nicotina, usada para viciar.
Fred Fernandes, pneumologista

Imagem: Arte/UOL

A nicotina presente nos vapes, principalmente nesses de geração recente, é o sal de nicotina, que tem um potencial viciante maior. Ele consegue penetrar no pulmão e na circulação de forma mais rápida. Chega ao sistema nervoso central mais rápido, ativando o prazer da dopamina, que leva o indivíduo ao vício.
Fred Fernandes, pneumologista

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