Folga forçada, turista na mão: greve dá à Argentina dia com cara de feriado
Colaboração para o UOL, em Buenos Aires
25/09/2018 17h57
Nem mesmo o domingo mais tranquilo se compara à calmaria vista nas ruas de Buenos Aires nesta terça-feira (25) - dia da quarta greve geral convocada durante os menos de três anos do governo de Maurício Macri.
O 'subte', o metrô portenho, deixou de funcionar às 20h de ontem. Os ônibus não circularam, e os voos foram cancelados. Como resultado, as ruas da metrópole de 3 milhões de habitantes estiveram praticamente vazias.
Também deixaram de funcionar a coleta de lixo, as entregas dos caminhoneiros e os bancos. Há três anos na Argentina, o advogado brasileiro Afonso Aiquel diz que "no Brasil, nunca viu greve assim".
Em alguns pontos estratégicos da capital portenha, viram-se manifestações e piquetes. Os argentinos se queixam da situação econômica do país, que há meses sofre com a desvalorização do peso, inflação e diminuição de financiamentos do governo. No auge da crise, hoje, o presidente do Banco Central do país renunciou ao cargo.
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A greve que se propunha a ser geral não teve adesão de todas as empresas. Mas algumas se viram obrigadas a dispensar seus empregados pela dificuldade que eles teriam para chegar ao seu local de trabalho.
No entanto, basta percorrer algumas quadras da cidade para perceber que não se trata de um dia normal.
As caras da greve
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Imagem: Luciana Rosa / UOL Imagem: Luciana Rosa / UOL Folga forçada
A diarista Mirta Fernández foi obrigada a tomar o dia de folga. Ela não conseguiu transporte da Grande Buenos Aires, onde mora, até a capital, onde trabalha: "Se eu não posso ir trabalhar, perco dinheiro. Consegui reacomodar meus clientes, mas, se fosse uma semana na qual eu já tivesse todos os dias ocupados, seria pior. O meu sobrinho teve de dormir no trabalho, a pedido dos patrões. Ele é acompanhante terapêutico e não podia faltar. No meu caso, tenho um filho com necessidades especiais, não posso passar a noite no trabalho, então aproveitei para passar o dia com minha família".
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Imagem: Luciana Rosa / UOL Imagem: Luciana Rosa / UOL Brasileiras pegas de surpresa
As turistas cariocas Joselaine Cerqueira e Eliane Vieira foram pegas de surpresa ao tentar visitar o museu de Belas Artes de Buenos Aires, na Recoleta. "Nós ficamos sabendo da greve ontem à noite, quando o metrô parou de funcionar. Hoje nós tentamos encontrar informação no site do museu, mas não dizia nada. Acabamos caminhando desde Palermo, onde estamos hospedadas, até aqui para encontrar o museu fechado", lamenta a professora. Para as brasileiras é curioso ver tanta gente nos parques e praças em um dia de semana. "Isso lá no Rio a gente vê mais na zona sul da cidade, aqui eu não sei se é por causa da greve, mas tem gente por todo o lado aproveitando o dia de sol", se surpreende Eliane.
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Imagem: Luciana Rosa / UOL Imagem: Luciana Rosa / UOL Sem trânsito
Diretor de contas de uma multinacional, Ezequiel Stisin teve de ir ao escritório, longe de casa, mas notou que não havia trânsito. "Fiz o trajeto na metade do tempo. Levantei ouvindo o som dos pássaros nas árvores com uma paz, uma calma, um silêncio impressionante. Isso que eu vivo a duas quadras de Cabildo (uma movimentada avenida do bairro de Belgrano). Hoje em dia, mesmo com os protestos, tenho a sensação de que não há perigo de agressão àqueles que decidam ir trabalhar, há quatro ou cinco anos atrás não era assim".
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Imagem: Luciana Rosa / UOL Imagem: Luciana Rosa / UOL Gaúcho nunca viu greve assim
Há três anos em Buenos Aires, o brasileiro Afonso Aiquel é advogado em uma multinacional alemã. "Hoje meu chefe liberou todo mundo para trabalhar de casa, mesmo aqueles que têm carro. Eu prefiro e tento ter empatia com a situação de outros trabalhadores ou até mesmo de pessoas que não têm trabalho hoje em dia, do que pensar no que vai afetar a mim, durante um dia, não ter transporte público". Ele diz que não lembra ter vivido uma paralisação geral como as três que já vivenciou na Argentina.
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Imagem: Luciana Rosa / UOL Imagem: Luciana Rosa / UOL Dia no parque
Os advogados Daniel Cabrera e Carina Tedella optaram por não trabalhar hoje e aproveitar a tarde no parque. "Além de não haver transporte, não trabalhamos hoje por uma questão ideológica. Este governo nos tirou muito dinheiro, apesar de que trabalhamos na Justiça e temos um salário que não foi tão afetado, mas são políticas que nos estão levando todos a estar muito mal", diz Daniel. "A paralisação é uma medida super necessária para visibilizar um pouco o que está acontecendo", apoia Carina.