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Massacre na Noruega deixou lições que podem ser aplicadas na luta global contra o terrorismo, diz ministro

O autor do massacre de julho de 2011 na Noruega, Anders Breivik, sorri enquanto escuta uma equipe de psiquiatras defender um relatório médico em seu julgamento em Oslo - Vegard Groett/EFE
O autor do massacre de julho de 2011 na Noruega, Anders Breivik, sorri enquanto escuta uma equipe de psiquiatras defender um relatório médico em seu julgamento em Oslo Imagem: Vegard Groett/EFE

Jonas Gahr Store

The International Herald Tribune

20/07/2012 06h00

No próximo domingo (22), fará um ano que a Noruega sofreu um dos piores ataques extremistas ocorridos na Europa Ocidental desde a Segunda Guerra Mundial, quando Anders Behring Breivik assassinou sistematicamente 77 pessoas e feriu centenas de outras.

A reação do primeiro-ministro norueguês Jens Stoltenberg foi inequívoca. Ele declarou que a arma mais poderosa da Noruega para responder aos atentados seria a adoção de mais transparência e democracia.

Os noruegueses apoiaram o primeiro-ministro. Nem os políticos nem a mídia transformaram a tragédia em uma questão político partidária. A população reagiu com tristeza, mas não pediu a adoção de medidas extraordinárias. E o Estado decidiu julgar Breivik em um tribunal público comum, com ampla cobertura pela mídia.

Muita gente fora da Noruega questionou a atitude do governo norueguês. Afinal, responder aos atentados com abertura e democracia não possibilitaria aos fanáticos divulgar as suas ideologias? Isso não faria com que aumentasse o risco de que os movimentos extremistas se fortalecessem? E por que não criar um ambiente judicial especial e fechado para lidar com esse tipo de caso?

Como ministro das Relações Exteriores da Noruega, eu me deparei diversas vezes com tais questões nos meses que se seguiram aos atentados. Sem nenhum preconceito em relação aos procedimentos legais que estão em andamento, eu acredito que essas questões sejam fundamentais. Como é que nós, como nações independentes, e como uma comunidade internacional, deveríamos combater o extremismo político violento que se encontra no cerne da política do século 21? Eu acredito também que a experiência norueguesa após os ataques gerou lições importantes que podem ser relevantes para outros países.

A última década nos demonstrou que a ideologia jamais poderá explicar integralmente por que grupos ou indivíduos cometem atos inimagináveis. Fatores sociais, psicológicos e individuais sempre desempenham papeis fundamentais. Mas o extremismo político não se desenvolve em um vácuo. Ideias se constituem no oxigênio que permitem que o extremismo cresça e se dissemine.

Os pontos de vista dos extremistas conquistam simpatias e recrutas porque eles oferecem narrativas que alegam identificar profundas injustiças e inimigos terríveis.

Na ausência desse combustível, as chamas do extremismo são rapidamente extintas. As redes da Al Qaeda foram alimentadas pelas ideias dos fundamentalistas islâmicos, da mesma forma que Breivik invocou as ideias e as histórias de outros extremistas ocidentais – e pode ter se inspirado nelas.

Portanto, confrontar e minar as narrativas e ideias dos extremistas precisa ser uma das nossas principais tarefas. Para isso, nós precisamos preservar a coragem das nossas convicções diante do extremismo.

Praticamente toda as modalidades modernas de extremismo acusam os sistemas democráticos ocidentais de serem hipócritas e fracos. A Al Qaeda retrata o Ocidente como um bando de imperialistas anti-islâmicos disfarçados de promotores da democracia. O extremismo de extrema direita sugere que o Ocidente está cometendo um suicídio cultural através do seu frouxo sistema judicial e do multiculturalismo ingênuo.

Ambos os movimentos cometeram atos terríveis planejados com o objetivo de fazer com que nós fôssemos tentados a trair os nossos valores e fizéssemos dos extremista mártires. Na verdade, é notável constatar quantas similaridades existem entre esses dois tipos de extremismo no seu desdém pela diversidade e pela sua violência indiscriminada contra civis.

Nesse contexto, seria um erro tratar os crimes cometidos por extremistas como exceções, que estariam sujeitas a processos especiais. Esses indivíduos têm que ser responsabilizados e punidos de acordo com os instrumentos jurídicos. Ocultar suspeitos dos olhares públicos só desumaniza os perpetradores e solapa quaisquer lições morais ou judiciais que estejam disponíveis.

Por outro lado, julgar extremistas que cometeram crimes em um tribunal público faz com que fique ainda mais chocantemente evidente que essa ações horríveis foram perpetradas por seres humanos, e que todos nós temos que trabalhar todos os dias para combater as ideias do extremismo.

Tem sido impressionante observar que a geração de noruegueses mais jovens --e especialmente os jovens sobreviventes do massacre da ilha de Utoya --manifestou confiança na abordagem aberta da Noruega em relação a essa questão. Esses jovens sabem que um sistema político baseado no império da lei não pode desprezar os procedimentos legais conforme cada caso específico. Eles entendem que fazer isso só proporcionaria aos extremistas provas de que a nossa democracia baseia-se em dois pesos, duas medidas.

Eu acredito que o mesmo princípio básico se aplica à luta global contra o terrorismo internacional. Osama Bin Laden teve sucesso em fazer com que o Ocidente recorresse a poderes excepcionais de uma forma que às vezes conflita com os nossos compromissos com os direitos humanos e a democracia. Isso só fortaleceu os argumentos dos extremistas, e demonstrou que nós devemos procurar evitar o excepcionalismo e que, em vez disso, temos que confiar no sistema aberto e democrático que estamos defendendo.

Não se trata de uma abordagem leniente. Isso é algo que exige e permite a aplicação de medidas de segurança duras. Mas tal abordagem está firmemente ancorada no Estado de direito e nos valores da democracia e da responsabilidade perante à lei.

O fato de o ambiente transparente da praça pública poder se constituir em um antídoto notável contra o extremismo não deve ser motivo de surpresa. Isso não se constitui apenas em um princípio democrático fundamental. Nós contamos também com amplas evidências históricas de que as ideologias extremistas prosperam melhor quando ficam confinadas nos subterrâneos.

O debate aberto é a nossa ferramenta mais poderosa para fazer frente ao extremismo. Uma opção muito mais perigosa é confinar as ideias extremistas à clandestinidade, onde elas podem se desenvolver sem enfrentarem nenhuma concorrência.

Além do mais, em um mundo globalizado, no qual as ideias e as redes circulam além da esfera de controle dos Estados, nós não temos muita escolha além de apresentar energicamente os nossos contra-argumentos e abraçar o desafio de combater o extremismo em campo aberto.

(Jonas Gahr Store é o ministro das Relações Exteriores da Noruega)