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CIA registrou suspeitas em relação a Snowden em 2009

Snowden se encontra em Moscou com outros ex-informantes dos arquivos secretos dos EUA - Wikileaks/Divulgação
Snowden se encontra em Moscou com outros ex-informantes dos arquivos secretos dos EUA Imagem: Wikileaks/Divulgação

Eric Schmitt

Em Washington

11/10/2013 11h59

Quando Edward J. Snowden se preparava para deixar Genebra e seu emprego como técnico da CIA em 2009, o seu supervisor registrou uma nota depreciativa em seu arquivo pessoal, notando uma nítida mudança no comportamento e nos hábitos de trabalho do jovem, bem como uma suspeita preocupante.

A CIA suspeitava que Snowden estava tentando invadir arquivos de computador secretos para os quais não tinha autorização e decidiu mandá-lo para casa, de acordo com dois altos funcionários norte-americanos.

Os sinais de alerta, entretanto, foram ignorados. Snowden deixou a CIA e foi contratado pela Agência de Segurança Nacional (NSA). Quatro anos mais tarde, ele vazou milhares de documentos secretos. A nota de advertência do supervisor e as suspeitas da CIA, aparentemente, não foram encaminhadas à NSA ou às suas empresas terceirizadas e vieram à tona apenas depois que os investigadores federais começaram a examinar o histórico de Snowden, quando os documentos começaram a ser divulgados, segundo os agentes de inteligência e policiais.

“A informação passou despercebida”, disse um veterano da polícia.

Os porta-vozes da CIA, NSA e FBI recusaram-se a comentar a natureza precisa do alerta e por que não foi encaminhado, citando a atual investigação das atividades de Snowden.

Meia dúzia de autoridades policiais, de inteligência e funcionários do Congresso com conhecimento direto do relatório do supervisor foram contatados para este artigo. Todos concordaram em falar sob condição de anonimato por causa da investigação criminal corrente.

Segundo as autoridades, em retrospecto, o relatório do supervisor da CIA e as suspeitas da agência podem ter sido os primeiros sinais sérios da possibilidade de um futuro vazamento de informações e a maior oportunidade perdida para rever a autorização de acesso a documentos secretos por parte de Snowden, ou pelo menos colocar seu trabalho na NSA sob maior vigilância.

“A problema do sistema foi que, mesmo com a nota depreciativa, Snowden ainda pôde manter sua autorização de segurança e passar para outro emprego, e a informação não foi encaminhada”, disse um parlamentar republicano que foi informado sobre o caso.

Snowden atualmente está morando em Moscou, onde apareceu esta semana pela primeira vez, desde que recebeu asilo temporário do governo russo durante o verão. Na quarta-feira (9) à noite, ele se reuniu com quatro americanos que também fizeram denúncias e têm defendido o seu caso nos Estados Unidos. Eles presentearam Snowden com um prêmio concedido anualmente por um grupo de agentes da CIA aposentados aos membros da comunidade de inteligência “que apresentam integridade”.

Em uma entrevista à televisão, uma integrante do grupo, Jesselyn Radack, ex-funcionária do Departamento de Justiça, disse que Snowden “estava ótimo”.

“Ele me pareceu muito centrado e brilhante”, disse Radack. “Inteligente, engraçado, muito empenhado. Achei que parecia muito bem”.


Outra delatora, Coleen Rowley, ex-agente do FBI que testemunhou perante o Senado sobre os erros da agência na investigação dos ataques de 11 de setembro de 2001, disse: “Nós conversamos sobre exemplos anteriores de grandes pessoas na história que tinham passado por esse tipo de pressão, e ele está extremamente centrado”.

Na quinta-feira, o pai de Snowden, Lon, chegou a Moscou para ver o filho, após garantias do assessor jurídico do Snowden de que “não haveria complicações” na organização de um encontro. Mas, em uma entrevista por telefone no final do dia, Lon Snowden disse que ainda não tinha sido capaz de encontrar-se com o filho.

“Eu não posso dizer onde e quando”, disse o pai de Snowden. “Eu não tenho a menor ideia. Espero que algo aconteça”.

É difícil dizer o que teria acontecido se os supervisores da NSA tivessem sido informados do alerta da CIA sobre Edward Snowden.

“O espectro de coisas no arquivo pessoal de cada um pode ir de A a Z”, disse Charles B. Sowell, que até junho era um alto funcionário do Escritório do Diretor de Inteligência Nacional, incumbido da tarefa de melhorar o processo de habilitação de segurança. “Há uma chance dessa informação ser perdida e não vir à tona”.

Sowell, hoje vice-presidente da Salient Federal Solutions, uma empresa de tecnologia da informação em Fairfax, Virgínia, enfatizou que deixou o governo antes das denúncias de Snowden se tornarem públicas.

Agentes da inteligência e da polícia dizem que o relatório poderia ter afetado as atribuições de Snowden, em primeiro lugar como funcionário terceirizado da NSA, contratado pela empresa Dell no Japão e, mais tarde, pela Booz Allen Hamilton no Havaí, bem como o nível de supervisão imposto a ele.

Os sistemas eletrônicos que a CIA e a NSA usam para gerenciar os níveis de segurança de seus funcionários e terceirizados têm a intenção de controlar as principais infrações baseadas em regras, e não as queixas menos graves sobre o comportamento pessoal, disse um alto funcionário da polícia. Assim, era pouco provável que informações negativas menores sobre Snowden fossem enviadas à NSA, a menos que tivessem sido solicitadas. Como resultado do caso de Snowden, essa falha foi corrigida e as informações estão sendo encaminhadas, segundo dois agentes da polícia.

A revelação do relatório depreciativo da CIA ocorreu enquanto o Congresso está examinando o processo de concessão de autorizações de segurança, especialmente pela Usis, uma empresa que realiza 700 mil verificações de segurança anuais para o governo. Entre os indivíduos que a empresa vetou estavam Snowden e Aaron Alexis, que atirou e matou 12 pessoas na Marinha de Washington no mês passado.

“Temos uma necessidade imperiosa de monitorar aqueles que têm acesso a essas informações sensíveis com maior regularidade e com conjuntos mais amplos de dados”, disse Kathy Pherson, ex-agente de segurança da CIA que pertence a uma força-tarefa da indústria de inteligência que emitirá um relatório sobre o assunto até o final do ano.

Apesar de não estar claro o que exatamente dizia a nota negativa do supervisor, ela coincide com um período de vida de Snowden, em 2009, quando fazia muitos comentários na Internet sobre questões de governo e de segurança, reclamava da vigilância civil e, segundo um amigo, estava sofrendo “uma crise de consciência”.

Snowden conseguiu um emprego com tecnologia da informação na CIA em meados de 2006. Apesar de não ter credenciais formais, ele teve o acesso liberado a documentos ultrassecretos e conseguiu uma vaga no Departamento de Estado em Genebra. Pouco se sabe sobre seus deveres por lá.

Mavanee Anderson, que trabalhou com Snowden em Genebra e também tinha acesso liberado a arquivos de alta segurança, disse em um artigo no jornal “Chattanooga Times Free Press of Tennessee” em junho que, quando trabalharam juntos, de 2007 até o início de 2009, Snowden “já estava enfrentando uma espécie de crise de consciência”.

“Qualquer pessoa inteligente o suficiente para se envolver no tipo de trabalho que ele fazia, que tem acesso ao tipo de informação que ele tinha, passará pelo menos por alguns momentos assim”, disse ela.

Mais tarde, Snowden disse ao jornal “The Guardian” que ficou chocado e triste com algumas das técnicas que os agentes da CIA em Genebra utilizavam para recrutar suas fontes.

“Muito do que eu vi em Genebra realmente me desiludiu sobre o funcionamento do governo do meu país e seu impacto no mundo”, disse ao “The Guardian”. “Percebi que eu fazia parte de algo que estava fazendo muito mais mal do que bem”.

Tradução: Deborah Weinberg