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Florista transforma casa arruinada em obra de arte em Michigan

Laura McDermott/The New York Times
Imagem: Laura McDermott/The New York Times

Stacy Cowley

Hamtramck (Michigan)

18/10/2015 06h00

Onze meses atrás, uma casa abandonada que hoje está lotada com 36 mil flores, continha coisas bem repugnantes. Um cachorro morto. Banheiros entupidos, sem manutenção durante anos. Cacos de vidro de janelas quebradas e garrafas de cerveja.

Quase 5.500 kg de lixo tiveram de ser retirados antes que Lisa Waud, uma florista que comprou o sobrado em um leilão por US$ 250 (R$ 960), pudesse ver que tipo de casa ela tinha comprado.

A estrutura da casa continua precária, mas sua atmosfera foi transformada. Este fim de semana, cerca de 2.000 visitantes vão passear pela Flower House [Casa das Flores], uma instalação de arte que Waud e mais de três dezenas de floristas colaboradores de todo o país criaram no local. O objetivo é lançar um novo olhar sobre a ruína que famosamente toma conta da região metropolitana de Detroit, e também sobre a atividade dos floristas.

Os quartos vazios da casa – com o papel de parede descascando, vigas de madeira expostas e alguns itens de mobiliário abandonados e inalterados – foram transformados em uma série de quadros de natureza morta. Todas as plantas e flores que os preenchem são produzidas nos Estados Unidos, uma raridade num setor que importa a maior parte de seus produtos da Colômbia e outros lugares.

Waud é dona da floricultura Pot & Box. Como a maioria dos floristas independentes, ela ganha a vida quase que totalmente com casamentos e serviços para clientes corporativos, mas se entusiasma quando fala sobre a beleza que as plantas podem acrescentar à vida cotidiana.

A inspiração para a Flower House veio em 2012, quando ela viu imagens do desfile de moda de Christian Dior daquela temporada, realizado numa mansão parisiense cheia de flores que formavam um arco-íris de cores.

"Foi incrível, e eu soube imediatamente que queria fazer aquilo – mas morando em Detroit, imaginei numa casa abandonada”, disse ela. “Estou tentando transformar as casas abandonadas num recurso.”

Sua visão começou a se transformar em realidade em novembro passado, quando ela pagou US$ 500 (R$ 1.920) num leilão, sem ver o local, pela casa que viria a se tornar a Flower House e a casa vizinha. À medida que ela contava a outros floristas sobre seu plano, buscando ideias e voluntários, o que havia começado como um devaneio artístico ia se transformando num projeto formal com orçamentos, autorizações, logística complicada e prazos.

Waud estimou que precisava levantar US$ 150 mil para cobrir o custo das flores da instalação, mas quando contatou seus fornecedores de costume, California Cut Flower Comission, Mayesh e Nordlie, todos os três se ofereceram para doar as flores. Os outros 36 floristas que criaram os quartos da Flower House estavam igualmente ansiosos para oferecer tempo e material.

Sally Vander Wyst, proprietária da Milwaukee Flower Co., ouviu falar do projeto através de um podcast e imediatamente entrou em contato com Waud para se voluntariar. Ela está criando uma cozinha, cobrindo uma mesa recuperada e os armários deteriorados com alcachofras, musgos, cipós, samambaias e uma profusão de dálias, gladíolos e campainhas.

"Nosso conceito é o pós-apocalíptico assombrado", disse ela. "Queremos que pareça que o mundo acabou e a natureza tomou as coisas de volta em segundos."

Para deixar a Flower House estável o suficiente para a instalação, Waud contratou a Reclaim Detroit, uma organização sem fins lucrativos especializada em desconstrução, uma alternativa mais cara porém mais ecológica do que a demolição. A equipe da Reclaim Detroit recicla e recupera o que consegue, revendendo os materiais para marceneiros e artesãos.

Como Waud, Craig Varterian, diretor-executivo da Reclaim Detroit, vê as construções abandonadas da região como um recurso econômico. "Estas estruturas vão de horríveis até o desastre absoluto, mas ainda existe valor nelas em termos de instalações e madeira", disse ele. "Antes de 1930, havia um tipo diferente de madeira. Ela tem valor, e não existe mais."

Os funcionários da Reclaim Detroit tiraram o lixo da casa de Waud e arrancaram camadas de sujeira. Misturados ao entulho, eles descobriram alguns indícios do passado da casa. Uma pilha espessa de páginas de calendário pregadas a uma parede terminava com janeiro de 1999 no topo. Fotos dos antigos proprietários, identificados por um vizinho, apareceram no sótão.

Em uma parede do quarto, Waud pendurou um prato de porcelana com uma mensagem que parecia feita sob medida para seu projeto: "Esta é minha casa e eu faço o que eu bem entender aqui."

A Flower House ficará aberta para visitantes pagantes de sexta a domingo. Quando a exposição terminar, a equipe da Reclaim Detroit vai derrubar a casa, deixando um terreno vazio. A madeira será reaproveitada em novos objetos, como mesas, violões e tábuas de corte.

"Estes materiais vão dar continuidade à história da Flower House de uma forma palpável”, disse Jeremy Haines, funcionário da Reclaim Detroit que coordenou o projeto. "Isso cria um legado que as pessoas terão em suas mãos."

A casa em si não é aproveitável. Assim como muitas das casas abandonadas de Detroit que são vendidas por preços irrisórios, o valor desta jamais chegaria ao quanto custaria reformá-la. Um engenheiro civil com quem Waud conversou estimou os custos de reforma em US$ 1 milhão (R$ 3,84 milhões). Pagar os impostos deste ano para a Flower House e a casa vizinha custou três vezes mais do que Waud gastou comprando as casas.

Quando o terreno for desocupado, Waud planeja transformá-lo num jardim sazonal para ajudar a produzir flores como peônias e dálias para o seu negócio.

Susan McLeary, proprietária da Passionflower em Ann Arbor, Michigan, e uma das floristas da Flower House, disse que este foi um dos aspectos que a atraiu no empreendimento. A agricultura urbana está ganhando atenção, mas poucas pessoas pensam em flores como um cultivo que dê dinheiro.

"As flores são uma das coisas mais rentáveis por metro quadrado que se pode fazer com a terra”, disse ela. "Esta pode ser uma ideia interessante de se conscientizar, de que você pode ser um produtor urbano de flores e trazer dinheiro para sua comunidade.”