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As cidades solitárias de Fukushima

Pertences de estudantes permanecem largados em escola primária desde que deixaram a sala de aula há seis anos, em Futaba, cidade que fica dentro da zona de exclusão nuclear de Fukushima, no Japão - (Ko Sasaki/The New York Times
Pertences de estudantes permanecem largados em escola primária desde que deixaram a sala de aula há seis anos, em Futaba, cidade que fica dentro da zona de exclusão nuclear de Fukushima, no Japão Imagem: (Ko Sasaki/The New York Times

Motoko Rich

12/03/2017 04h00

Milhares de pessoas fugiram de suas casas, escritórios e escolas há seis anos, após um terremoto e tsunami devastadores terem provocado uma fusão em uma usina nuclear em Fukushima, Japão. Até hoje, poucas retornaram, deixando para trás cidades fantasmas onde sinais estranhos daqueles que partiram permanecem sob uma camada de poeira.

Tomioka, a pouco mais de 10 km ao sul da usina Fukushima Daiichi, era lar de 15.830 habitantes antes do acidente. Eles partiram às pressas. Em um restaurante na estrada principal que corta a cidade, os pratos foram deixados na pia.

Algumas cidades, como grande parte de Futaba, a apenas 6 km da usina nuclear, podem nunca mais ser reocupadas. Perambulando por suas ruas desertas, vendo uma arte de uma criança aqui, um velho fichário Rolodex de um trabalhador ali, sou atingida por uma sensação estranha de perda e devastação.

23.fev.2017 - Rua deserta na cidade de Futaba, que fica dentro da zona de exclusão nuclear de Fukushima - Ko Sasaki/The New York Times - Ko Sasaki/The New York Times
Rua deserta na cidade de Futaba
Imagem: Ko Sasaki/The New York Times

23.fev.2017 - Pertences de estudantes continuam espalhados em sala de aula de escola primária em Futaba, na zona de exclusão nuclear de Fukushima, no Japão - Ko Sasaki/The New York Times - Ko Sasaki/The New York Times
Pertences de estudantes continuam espalhados em sala de aula de escola primária em Futaba
Imagem: Ko Sasaki/The New York Times


Evidência da fuga repentina está por toda parte. O terremoto sacudiu uma escola primária com tamanha força que os alunos nem mesmo conseguiam permanecer em pé. Quando as crianças partiram, eles presumiram que voltariam poucos dias depois. Em vez disso, partiram e nunca mais voltaram.

Os retratos dos antigos diretores estavam espalhados pelo chão, a história esquecida de uma escola abandonada.

A maioria das 21.434 pessoas que viviam na cidade de Namie se estabeleceu em outros lugares. Elas agora pedem para a prefeitura simplesmente demolir suas casas. Pouco mais de 800 casas e lojas já foram derrubadas, com outras 1.280 em uma lista de espera.

22.fev.2017 - Cemitério em ruínas após o terremoto e o tsunami que atingiu a cidade de Namie há seis anos, no Japão; local também está na zona de exclusão nuclear  - Ko Sasaki/The New York Times - Ko Sasaki/The New York Times
Cemitério em ruínas após o terremoto e o tsunami que atingiu a cidade de Namie há seis anos
Imagem: Ko Sasaki/The New York Times

22.fev.2017 - Sala de pachinko (jogo de azar) em Tomioka, uma cidade na zona de exclusão nuclear de Fukushima, no Japão - Ko Sasaki/The New York Times - Ko Sasaki/The New York Times
Sala de pachinko (jogo de azar) em Tomioka
Imagem: Ko Sasaki/The New York Times


Em Tomioka, conheci Chiharu Matsumoto, 68 anos, uma ex-moradora que trabalha como voluntária em um centro de descanso na cidade, para pessoas que retornam para limpar e buscar as coisas em suas casas. Agora ela vive em uma cidade a oeste e disse que não planeja se mudar de volta. Seus filhos adultos não visitaram Tomioka desde a evacuação após o desastre.

"Eles não sabem quanta radiação podem receber", ela disse.

O governo diz que será seguro para os moradores retornarem em abril. Até o momento, 304 pessoas se mudaram de volta com autorizações temporárias. Com o retorno de tão poucas pessoas, não faz muito sentido para muitas operações comerciais reabrirem. Muitas das lojas de conveniência, restaurantes e casas de pachinko (mistura de entretenimento e jogo de azar) ainda não foram limpas ou reparadas.

Alguns cientistas dizem que a radiação em muitas cidades caiu para níveis que não devem causar problemas de saúde de longo prazo. Outros se perguntam se até mesmo doses pequenas são seguras.

Mas "a situação está muito além da ciência", disse o dr. Otsura Niwa, presidente da Fundação para a Pesquisa dos Efeitos da Radiação em Hiroshima, que conduziu uma extensa coleta de amostras em Fukushima desde o desastre. "É o elemento humano que exerce o maior papel."

As pessoas com maior probabilidade de voltar são os idosos. Ichiro Tagawa, 77 anos, se mudou de volta para Namie com uma autorização especial em setembro e reabriu sua oficina de reparo de bicicletas, que está em sua família há mais de 80 anos.

24.fev.2017 - Entrada de loja de conveniência em Okuma, uma cidade na zona de exclusão nuclear em Fukushima, no Japão - Ko Sasaki/The New York Times - Ko Sasaki/The New York Times
Entrada de loja de conveniência em Okuma
Imagem: Ko Sasaki/The New York Times

22.fev.2017 - Loja de macarrão em Okuma, na zona de exclusão nuclear de Fukushima, no Japão - Ko Sasaki/The New York Times - Ko Sasaki/The New York Times
Loja de macarrão em Okuma
Imagem: Ko Sasaki/The New York Times


"Sou velho e não me importo com os níveis de radiação", ele disse, "que, na verdade, são muito baixos".

Outro motivo para querer voltar foi estar próximo dos túmulos de sua família. Um grande cemitério próximo da costa foi altamente danificado pelo tsunami.

"Queremos visitar os túmulos de nossos ancestrais", disse Tagawa. "Mas estamos vivendo em uma cidade muito solitária."