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OPINIÃO

Ex-procurador da Lava Jato: Centro deve se unir já no 1º turno por um nome

DIDA SAMPAIO/ESTADÃO CONTEÚDO
Imagem: DIDA SAMPAIO/ESTADÃO CONTEÚDO

Carlos Fernando dos Santos Lima*

Especial para UOL

20/03/2021 04h00

A política no Brasil é dominada hoje pela defesa do interesse próprio, pela irresponsabilidade com os destinos da população e pelo insulto como forma de atuação, estando as instituições públicas reféns, paralisadas e amedrontadas com a ousadia desses desonestos. E isto ocorre pela hipertrofia do poder político em detrimento das leis e da própria Constituição, uma vez que muitos que deveriam guardar nosso Direito são sabujos representantes desse sistema.

Não se pode mais, por exemplo, admitir que as escolhas para ministros dos tribunais superiores, e mesmo dos quintos do Ministério Público e advocacia, tenham que passar por um beija-mão de poderosos. Não é razoável que a escolha do procurador-geral da República seja feita sem obediência a uma lista tríplice, prática salutar já prevista nos Estados para a escolha dos chefes dos Ministérios Públicos estaduais.

Não é possível mais assistir à competição venal entre "juristas" para agradar o presidente da República à custa da Justiça, na esperança de serem alçados a uma cadeira no STF; ou que este compre a cadeira de presidente da Câmara dos Deputados para um acusado de corrupção, em seguida "absolvido" por três ministros do STF, o qual impede a tramitação de dezenas de pedidos de impeachment do mesmo presidente da República e daqueles que o absolveram.

São tantas as mazelas da nossa política, que fica difícil acreditar que haja solução. Entretanto, como temos que viver neste país, o que nos resta fazer é insistir na mudança nessa situação desalentadora, mesmo que ela venha a ser pequena.

Muitos imaginam que a solução virá da escolha de um presidente comprometido com as mudanças. Essa esperança exclusiva na vontade de uma única pessoa é extremamente nociva, se não um reflexo do nosso caudilhismo congênito, pois nenhum chefe do executivo será capaz de corresponder às expectativas da população, fazendo com que esta sempre caia em frustração quando perceber que as esperanças que lhe foram vendidas eram apenas mentiras de políticos incapazes de se contrapor ao mecanismo.

É claro que um presidente pode muito, especialmente para o mal, como foi Lula ao comandar a corrupção em seu governo, Dilma, com sua arrogante ignorância econômica ou Bolsonaro ao fazer política contra a vida dos brasileiros. Por isso devemos em 2022 escolher o melhor nome para escapar da armadilha de termos no segundo turno a escolha entre o péssimo e o pior, como aconteceu em 2018.

Será necessário que o centro democrático se una já no primeiro turno em torno de um nome competente, pacificador e prático para iniciar a longa jornada para fora desse fundo do poço em que estamos; mas não podemos apostar todas as fichas nisso.

Temos, isto sim, que olhar para os dois mais importantes centros de resistência às mudanças: a Câmara dos Deputados e o Senado Federal. Não é possível mais aceitar que o Congresso Nacional não tenha sequer 10% de parlamentares realmente comprometidos com um país melhor. Mudam os nomes, mas continuamos com aqueles mesmos 300 picaretas uma vez mencionados por Lula, que depois passou a lhes ser patrono.

Se existe hoje um grupo de parlamentares completamente destituídos de interesse público a que chamamos Centrão, há muito de culpa nossa em dispersarmos os votos em centenas de nomes incapazes de realmente serem eleitos, deixando que eles nos influenciem com brindes e cabos eleitorais, mas não por caráter e propostas. Esse grupo precisa ser confrontado internamente, no próprio Congresso Nacional, não com discursos inócuos em plenário, mas com a formação de uma frente de parlamentares que, sem necessariamente concordarem em todos os pontos, sejam comprometidos com mudanças necessárias na forma pela qual se faz política no Brasil.

A ideia é um "Centrão do Bem", que reúna as forças democráticas e republicanas de centro-direita e centro-esquerda em torno de propostas mínimas, não demagógicas, de mudanças possíveis, mas não tímidas, em temas importantes como o combate à corrupção, a democratização dos partidos políticos, em regras eleitorais mais rígidas para diminuir o número de partidos, autonomia dos órgãos reguladores e investigativos e uma nova forma de se escolher ministros dos tribunais superiores.

Não precisamos de arrivistas, como muitos dos eleitos na esteira da Lava Jato nas últimas eleições, mas que eram apenas hipócritas sedentos de poder.

É hora de pessoas de bem, com importância perante grupos sociais, se apresentarem, mesmo que em sacrifício pessoal, para ajudarem a retomar o país desses desqualificados que vemos hoje. Já passou da hora de termos no Congresso Nacional políticos que correspondam ao ideal de Max Weber: uma pessoa com paixão por sua causa, ética em sua responsabilidade e gentileza em sua atuação.

* Carlos Fernando dos Santos Lima é advogado especialista em compliance e procurador da República aposentado. Integrou a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba entre 2014 e 2018