ESCÂNDALOS NO CONGRESSO

40.Congressistas são relacionados a superfaturamento de eventos

Data de Divulgação

4.dez.2010

O escândalo

Deputados e senadores usam suas emendas e prestígio no governo Lula para sustentar esquema de superfaturamento de eventos culturais, noticiou "O Estado de S.Paulo", em 4.dez.2010 e em 6.dez.2010. O jornal destacou que um dos supostos envolvidos, senador Gim Argello (PTB-DF), era relator e responsável por elaborar o projeto de Orçamento da União para 2011. Argello renunciou ao cargo em 7.dez.2010, após repercussão do caso.

A fraude ocorre, segundo o "Estado", da seguinte forma: institutos fantasmas recebem verba do governo, sem licitação, e a repassam para empresas abertas em nome de laranjas. O álibi para liberação do dinheiro é a organização de eventos culturais. Aqui, entrevista com um dos laranjas publicada pelo "Estado" em 4.dez.2010.

Em 14.dez.2010, quando mais nomes de congressistas já haviam sido relacionados ao caso, o "Estado" revelou a existência de investigação do setor de inteligência da Controladoria-Geral da União (CGU) que identificou esquema semelhante ao divulgado dias antes pelo jornal.

A investigação da CGU, segundo o jornal, aponta existência de "esquema envolvendo dois institutos de fachada e empresas fantasmas que usam um frentista de posto de gasolina e um motorista de caminhão como laranjas. Uma faxineira também aparece como testa de ferro nesse esquema, que levou R$ 20 milhões em emendas parlamentares liberadas pela pasta do Turismo desde 2008".

Envolvidos
"Pelo menos R$ 3 milhões dos cofres do governo federal caíram desde abril na conta de um jardineiro e um mecânico", afirmou o "Estado", em referência aos laranjas, em 4.dez.2010. Desses R$ 3 milhões, "ao menos R$ 1,4 milhão foi repassado para institutos fantasmas por meio de emendas individuais de Gim Argello", continua o jornal.

Além das emendas, Argello contribui para a fraude defendendo a liberação da verba diretamente a ministros de pastas ligadas à finalidade da emenda, como Cultura e Turismo. Segundo o "Estado", os Ministérios "não fazem a checagem presencial da prestação de contas do serviço, nem verificam a atuação do instituto e da empresa subcontratada".

O jornal menciona carta enviada pelo senador, em 29.jun.2010, ao ministro da Cultura, Juca Ferreira. "[Argello] fez um apelo: pediu que R$ 600 mil das emendas feitas por ele fossem transferidos para o Instituto Renova Brasil. O convênio foi aprovado e liberado em R$ 532 mil. Só que a entidade não existe. É fantasma. No endereço funciona uma vidraçaria, a Requinte Vidros", diz a reportagem.

Outros envolvidos, segundo texto publicado por "O Estado de S.Paulo", em 6.dez.2010, são a deputada Luciana Costa (PR-SP) e os deputados Laerte Bessa (PSC-DF), Carlos Alberto Leréia (PSDB-GO), Sandro Mabel (PR-GO) e Bispo Rodovalho (PP-DF).

Luciana Costa (PR), segundo o "Estado", repassou R$ 1,1 milhão para o Instituto Brasil Sempre à Frente (sediado em Brasília) realizar shows em cidades do interior de São Paulo. Por sua vez, o instituto mandou o dinheiro para a empresa goiana Vênus Produções, representada em Brasília por Vanildo Gomes Soares Júnior, presidente do Projeto Viver – que é um outro instituto, "beneficiado por emendas de Gim Argello e de Laerte Bessa".

Ligações entre os envolvidos não param aí: o jornal menciona, em 6.dez.2010, que Vanildo Gomes Soares é filho de Izanete Soares, presidente do Renova Brasil, sediado numa vidraçaria e que recebeu R$ 600 mil pelas emendas de Argello.

Carlos Alberto Lereia (PSDB-GO), Sandro Mabel (PR-GO) e Rodovalho (PP-DF), segundo a reportagem, destinaram, em 2010, R$ 470 mil ao Instituto Planalto Central, também ligado ao instituto Brasil sempre à Frente. O trio de deputados também enviou cartas ao ministro do Turismo, Luiz Barreto, para pedir a liberação do dinheiro.

"Conseguiram. A entidade é registrada numa sala comercial vazia em Brasília. Seu presidente, Divino Assis Júnior, trabalha com ciência da computação e abriu o instituto para fechar convênios com a União. Sua mãe, Silvia Silva, é tesoureira do Brasil Sempre à Frente", afirma "O Estado de S.Paulo".

"Mercado de institutos"
Os textos publicados pelo "Estado" explicam que as empresas que recebem o dinheiro público estão em nome de laranjas. Mas, antes disso, a verba passa por institutos, que são estabelecidos com a compra de estatutos de associações comunitárias de periferia.

"[Os fundadores do instituto] alteram seus artigos [da associação], trocam toda a diretoria e passam a atuar como empresas de eventos com recursos públicos sem licitação", descreveu o jornal em 4.dez.2010. No mesmo texto, o jornal apresenta declarações de pessoas que assumem ter comprado os estatutos.

O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), foi associado ao caso em 9.dez.2010, quando o "Estado" publicou o texto "Documento que deu aval a entidade fantasma foi assinado por ministro".

O jornal publicou documento em que o ministro afirma atesta que o Instituto Brasil de Arte, Esporte, Cultura e Lazer (Inbrasil) presta "serviços relevantes para a comunidade". O documento, segundo a reportagem, foi usado para obter convênios de R$ 3,1 milhões no Ministério do Turismo. Padilha reconheceu sua assinatura, mas nega tê-la colocado no documento. Por isso pediu investigação do caso à Polícia Federal, informou o "Estado".

O instituto beneficiado com o documento que leva a assinatura do ministro, Inbrasil, só existe no papel e está registrado no nome do pai de um empresário que se engajou na campanha de Dilma Rousseff (PT) à Presidência da República, afirma o "Estado". Antônio Carlos Silva é diretor fiscal do Inbrasil, usado por seu filho, André Fratti Silva, para obter verba publica sem licitação. O instituto recebe a verba e repassa para a empresa de Fratti, a Vibe Marketing Promocional.

"Esse instituto recebeu, por exemplo, R$ 1,1 milhão para realizar o Festival de Inverno de Brasília, organizado pela Vibe Marketing em junho. Outros R$ 2 milhões foram liberados para um projeto sobre os 50 anos de Brasília, idealizado pela Vibe e que ainda não foi executado. Tudo sem licitação", diz o texto do jornal.

"Uma ex-assessora de Padilha, Crisley Lins, contou ao Estado que pediu ao ministro para assinar uma declaração atestando o funcionamento do Inbrasil. Esse tipo de documento, com respaldo de alguma autoridade, é exigido pelos ministérios para a abertura do cofre. Ex-assessora do ministro, Crisley hoje trabalha para o deputado Paulo César (PR-RJ) que, embora seja do Rio, destinou R$ 300 mil de suas emendas orçamentárias para o evento do Inbrasil em Brasília", afirma a reportagem.

Em 7.dez.2010, Gim Argello renunciou ao cargo de relator do Orçamento por conta da repercussão do caso. A senadora Ideli Salvatti (PT-SC) assumiu e deixou o posto rapidamente, porque foi convidada para ser ministra do governo Dilma (que começa em 1.jan.2010). O cargo ficou então com a senadora Serys Slhessarenko (PT-MT).

Tanto Ideli quanto Serys foram relacionadas a problemas com emendas. Ideli porque, supostamente, favorece seus aliados de Santa Catarina com dinheiro das emendas, publicou a "Folha" em 12.dez.2010 (aqui, para assinantes do jornal e do UOL). De acordo com a reportagem, a senadora destinou R$ 1,25 milhão de sua cota de emendas para entidades dirigidas por petistas em Santa Catarina, Estado que representa no Senado.

Serys Slhessarenko, por sua vez, aparece em texto da revista "Veja" (publicado no site em 13.dez.2010) como tendo uma assessora que preside instituto que recebeu R$ 1 milhão de emendas do deputado Jilmar Tatto (PT-SP).

Defesa
Procurado pelo "Estado", o senador Gim Argello (PTB-DF), disse não conhecer de perto os institutos para os quais direciona suas emendas porque é movido pelo "mérito do projeto" e não pela "identidade do executor". Ele nega conhecer as empresas subcontratadas pelos institutos. As declarações foram publicadas em texto exclusivo para a defesa do senador em 4.dez.2010.

"O Instituto Renova Brasil encaminhou à minha assessoria um projeto para realização de evento na Granja do Torto de Brasília, de nome Encontro Cultural de Brasília, e o Projeto Viver apresentou outro, de nome São João Mió de Bão, que tratava de festas juninas em Planaltina e São Sebastião. Os eventos tiveram apoio das comunidades locais e chegaram ao meu gabinete apoiados por lideranças representativas", declarou Argello.

Em 6.dez.2010, Argello enviou nota à imprensa dizendo que "nenhum parlamentar pode ser responsabilizado por qualquer falha na execução de um convênio". Segundo ele, "o sistema de liberação de verbas por emenda ou solicitação parlamentar tem como pressuposto uma habilitação prévia das entidades ou dos institutos interessados perante o Sistema de Convênios do governo federal, o Siconv". As declarações enviadas na nota foram publicadas pelo portal UOL.

"O Estado de S.Paulo" informou, em 6.dez.2010, que procurou os deputados mencionados e enviou perguntas, via e-mail, para seus assessores. "Mas nenhum respondeu até o fechamento da edição".

A assessoria do Ministério do Turismo informou ao "Estado" que os convênios são aprovados com base em documentos apresentados pelos institutos e que apenas 35% dos convênios são fiscalizados presencialmente. "Não faz parte de exigência legal visita à sede de entidades", explicou a assessoria, segundo texto do jornal.

Em nota, o Ministério da Cultura disse que vai apurar os fatos e tomar as medidas cabíveis. " O ministério analisará o processo e, no caso de qualquer indício de irregularidade, o projeto será encaminhando aos órgãos competentes", diz o texto do Ministério, segundo publicou "O Estado de S.Paulo".

O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), nega ter assinado o documento que atestou credibilidade a um instituto fantasma. ""Por se tratar de um documento inidôneo, o ministro Alexandre Padilha encaminhou ofício ao Ministro da Justiça solicitando o envolvimento da Polícia Federal na apuração dos fatos e da veracidade do documento", diz nota oficial do Ministério, segundo publicou o "Estado", em 9.dez.2010.

"Essa declaração tem sinais evidentes de falsidade, de fraude", disse Padilha à reportagem. "O timbre está incorreto, bem como todos os dados de seu cabeçalho: o telefone da Secretaria; o e-mail apresentado e a sua identidade visual. Os dados pessoais do ministro também estão equivocados, como a numeração de seu RG", afirma a nota oficial.

Apesar disso, a assessora Crisley Lins manteve a versão de que solicitou ao ministro o favor de assinar uma declaração de funcionamento do instituto Inbrasil e nega fraude no documento. "Para quê faria um documento com fraude? Eu passei para lá e eles em enviaram documento eletrônico", disse a assessora ao "Estado".

O que aconteceu?

O Ministério Público (MP) no Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu investigar os fatos em 6.dez.2010, noticiou o "Estado" no mesmo dia da decisão.

Segundo o jornal, o procurador Marinus Marsico, representante do MP no TCU, vai recomendar até 4ª feira que os Ministérios do Turismo e da Cultura façam apuração interna sobre as denúncias e solicitar todos os convênios suspeitos para investigação no TCU.

"Os ministérios deveriam se encarregar da lisura dos processos e se cercar para que não repasse dinheiro a entidades que não existem. É preciso, pelo menos, confrontar informações, CNPJs (Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica)", afirmou o procurador do jornal.

Caso comprovadas as irregularidades os repasses serão suspensos e os responsáveis identificados, disse o procurador. Para ele, é importante que o Ministério Público Federal (MPF) entre no caso para investigar suposto desvio de verbas e pagamento de propinas.

Em 6.dez.2010, após repercussão do caso, Argello suspendeu "todas as emendas de promoção de eventos e patrocínios culturais que ele mesmo havia apresentado ao Orçamento deste ano e solicitou a transferência dos recursos para investimentos em infraestrutura turística em Brasília", informou o UOL

"Diante das dúvidas suscitadas e de possíveis falhas no sistema, resolvi cancelar todas as minhas emendas que tenham por objeto eventos e patrocínios culturais, e transferi-las para a infraestrutura turística", disse Argello em nota à imprensa.
 

Em 7.dez.2010, o senador renunciou ao cargo de relator do Orçamento de 2011 e se afastou da Comissão Mista de Orçamento. Segundo texto publicado pelo "Estado", em 7.dez.2010, Argello declarou que tomou a decisão para não atrapalhar a aprovação do Orçamento para o próximo ano.

O jornal publicou trecho da nota enviada pelo senador à imprensa: "há uma tentativa recorrente de associar esta Comissão a supostas irregularidades na aplicação de verbas públicas. Como parlamentar atento aos meus deveres e obrigações, considero meu afastamento uma iniciativa que deve contribuir para não contaminar os bons trabalhos que aqui vêm sendo realizados em prol da sociedade".

Com a saída de Gim Argello, quem assumiu a relatoria do Orçamento foi a senadora Ideli Salvatti (PT-SC), segundo noticiou "O Globo", em 7.dez.2010. Ideli, no entanto, deixou a relatoria após ser convidada pela presidente eleita, Dilma Rousseff, para assumir o Ministério da Pesca. Assim, ela evita constrangimentos ao relatar projeto que coloca recursos também no Ministério que vai assumir, segundo informou a "Folha de S.Paulo", em 12.dez.2010 (aqui, íntegra para assinantes da "Folha" e do UOL; aqui, reprodução de parte do texto).

A sucessora de Ideli na relatoria do Orçamento deve ser a senadora Serys Slhessarenko (PT-MT), noticiou o portal "G1" em 13.dez.2010. As duas também foram relacionadas a problemas com emendas.

Ideli Salvatti favorece seus aliados de Santa Catarina com dinheiro de suas emendas, publicou a "Folha" em 12.dez.2010 (aqui, para assinantes do jornal e do UOL). De acordo com a reportagem, a senadora destinou R$ 1,25 milhão de sua cota de emendas para entidades dirigidas por petistas em Santa Catarina, Estado que representa no Senado.

Procurados pela "Folha", representantes das entidades beneficiadas com emendas de Ideli afirmaram terem sido contemplados pelos projetos apresentados e não por serem filiados ao PT, escreveu o jornal em 12.dez.2010 (aqui, para assinantes da "Folha" e do UOL). "A senadora Ideli Salvatti (PT-SC) não respondeu às ligações da reportagem", diz  texto publicado.

Serys Slhessarenko, por sua vez, aparece em texto da revista "Veja" (publicado no site em 13.dez.2010) como tendo uma assessora que preside instituto que recebeu R$ 1 milhão de emendas do deputado Jilmar Tatto (PT-SP). Ela negou conhecer o instituto ou ter contribuído para a liberação da verba, noticiou o "G1" em 13.dez.2010. Além disso, exonerou a assessora também em 13.dez.2010.

No entanto, em 15.dez.2010, a "Folha" revelou que Serys tinha conhecimento da ocupação de sua assessora no Ipam (Instituto de Pesquisa e Ação Modular). O jornal relata que questionou a senadora, em abril, sobre a atividade de Liane Muhlenberg no Ipam, "relatando inclusive que ela havia se beneficiado de emendas ao Orçamento de outros parlamentares".

A resposta de Serys foi em defesa da legalidade das atividades de Liane. "Busquei as informações e vimos que é tudo [os eventos feitos pela ONG] regular. E que ela pode ser comissionada e participante da organização", publicou a "Folha".

A senadora descarta renunciar à função de relatora, conforme registrado em texto de "O Estado de S.Paulo" de 13.dez.2010.

STF
Em 10.dez.2010, "O Estado de S.Paulo" publicou que Gim Argello (PTB-DF) é alvo de 2 inquéritos que tramitam no STF (Superior Tribunal Federal). Um deles chegou ao tribunal em 2008. Segundo documento encaminhado à Corte em 2009 pelo então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, a investigação tem por objetivo apurar crime decorrente de dispensa indevida de licitação (justamente o cerne do esquema dos institutos fantasma), noticiou o jornal.

A outra investigação chegou ao Supremo em 2007 e é destinada a apurar "suposto envolvimento do senador com crimes de apropriação indébita, peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro", informou o "Estado".

Se a investigação do Ministério Público Federal (MPF) concluir que há indícios de participação de Gim nas irregularidades, o congressista será denunciado e os ministros do STF deverão aceitar ou não a denuncia. Caso aceita, Argello passa a ser réu em processo criminal, explicou a reportagem do "Estado".

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