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Gayer paga com dinheiro público empresa de político que estava no 8/1

Do UOL, em São Paulo

31/05/2023 04h00

O deputado Gustavo Gayer (PL-GO) paga com verba da cota parlamentar a empresa de um amigo e político que participou dos atos golpistas de 8 de janeiro em Brasília.

Procurada, a assessoria de Gayer afirma que João Paulo Cavalcante colaborou com as investigações ao depor na PF e que os pagamentos receberam aval da Câmara dos Deputados.

Como o dinheiro foi gasto

A Goiás Online Comunicações e Marketing Publicitário LTDA recebeu, ao todo, R$ 24 mil referentes a serviços de "publicidade das redes sociais" entre março, abril e maio deste ano.

A empresa tem como único sócio João Paulo de Sousa Cavalcante. Ele é suplente de vereador em Goiânia pelo Democracia Cristã e foi candidato a deputado estadual pelo PSL em 2018.

Os valores foram usados para "divulgação da atividade parlamentar". Esta é a maior fonte de gastos da cota parlamentar do deputado. Em abril, até a última atualização de contas, dos R$ 40.386,66 utilizados, R$ 22 mil se destinaram à divulgação. As informações estão disponíveis no portal da Câmara dos Deputados (veja aqui).

Durante o ataque golpista ao Congresso, João Paulo gravou um vídeo em que aparece em primeiro plano e diz: "Galera, hoje, dia 8 de janeiro de 2023, o Brasil faz história. Mais uma vez, milhões de brasileiros indignados com o sistema, demonstrando que a nossa República Federativa do Brasil não vai cair nas mãos de criminosos. Olhem só essas imagens históricas".

Em seguida mostra, ao fundo, golpistas subindo a rampa do Congresso Nacional. "Iremos dar o nosso sangue por essa pátria. Brasil acima de tudo, Deus acima de todos. Vem pra Brasília agora. Para tudo que você está fazendo, venha pra Brasília, galera", afirma.

Ao jornal O Popular, de Goiás, ele confirmou que esteve em Brasília naquele dia. João Paulo não estava entre os presos nos atos.

A empresa e a relação com Gayer

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CNPJ foi aberto 7 dias antes de emitir a primeira nota para o gabinete de Gayer e tem como único sócio João Paulo Cavalcante
Imagem: Arte/UOL sobre Reprodução Receita Federal e Câmara dos Deputados

O CNPJ da Goiás Online foi aberto no dia 15 de março de 2023. Uma semana depois, a empresa emitiu uma nota fiscal para o gabinete do deputado (veja aqui).

As notas de março, abril e maio descrevem o serviço como "publicidade de redes sociais, gerenciamento de publicações e distribuição em todos os veículos e demais meios de divulgação", com links das contas de Twitter, Facebook, YouTube e Instagram do deputado (veja aqui e aqui)

No Facebook de João Paulo há diversos vídeos em que ele aparece ao lado de Gustavo Gayer. Ele apoiou o deputado na campanha à Prefeitura de Goiânia em 2020 e também a deputado federal, em 2022.

O que diz Gayer

Procurada, a assessoria do deputado disse que João Paulo Cavalcante foi pago como um prestador de serviços e que os pagamentos passaram pelo crivo da análise dos departamentos competentes da Câmara dos Deputados;

Já sobre a participação de Cavalcante nos atos golpistas de 8 de janeiro, o gabinete afirma que ele colaborou com as investigações ao depor na Polícia Federal e esclarecer o que sabia. "Enquanto não houver uma implicação criminal ou cível do Sr. João Paulo, que comprove sua efetiva participação, a presunção de inocência deve vigorar", afirma a nota.

Leia a nota na íntegra:

O João Paulo Cavalcante foi pago como um prestador de serviços, através da sua empresa legalmente constituída e apta a aperfeiçoar contratados no âmbito público e privado. Ademais, os pagamentos realizados passaram pelo crivo da análise dos departamentos competentes da Câmara dos Deputados, sendo, portanto, legais.

No que tange ao possível envolvimento de João Paulo Cavalcante nos atos do dia 08 de Janeiro, até a presente data não tramita nenhuma ação contra ele, não há decretação de prisão preventiva, temporária ou de qualquer outra espécie, muito pelo contrário, ele colaborou com as investigações ao depor na Polícia Federal e esclarecer o que sabia sobre o tema.

Enquanto não houver uma implicação criminal ou cível do Sr. João Paulo, que comprove sua efetiva participação, a presunção de inocência deve vigorar.

Por fim, vale ressaltar que os atos que ensejaram depredação patrimonial foram repudiados pelo Deputado Federal Gustavo Gayer, e a realidade dos fatos serão apurados na CPMI já instauradas no Congresso, que inclusive foi subscrita e apoiada por ele.

Quem é Gustavo Gayer

Após a invasão do 8 de janeiro, defendeu sem provas a tese de que havia "infiltrados de esquerda" nos atos de destruição (aqui e aqui).

Durante a eleição, chegou a ter suas redes suspensas a pedido do TSE por publicar conteúdo falso sobre as urnas eletrônicas (veja aqui). Também é responsável por disseminar a desinformação de que o Ipec (Instituto de Pesquisa e Consultoria Estratégica), que realiza pesquisas eleitorais, funcionaria dentro do Instituto Lula (leia a checagem aqui). O conteúdo foi removido das redes por determinação do TSE.

Foi citado no relatório da CPI da Pandemia como um dos influenciadores digitais que usou o Youtube para disseminar desinformações sobre "tratamento precoce" e conteúdo antivacina (veja aqui). Um relatório produzido pelo Google e entregue à CPI indicou que o influenciador foi o segundo que mais lucrou com conteúdo falso sobre a pandemia na plataforma: R$ 40 mil.

Em novembro, a Justiça de Goiás determinou que ele publicasse um vídeo de retratação por mentiras sobre a pandemia (leia aqui).

Youtuber e professor de inglês, Gayer foi o segundo deputado federal mais votado em Goiás em 2022.

gayer e cavalcante - Reprodução Facebook - Reprodução Facebook
João Paulo Cavalcante fez campanha para Gayer quando ele foi candidato a prefeito de Goiânia em 2020
Imagem: Reprodução Facebook
gayer e cavalcante2 - Reprodução Facebook - Reprodução Facebook
Em vídeo publicado 2021, ele está dentro de um carro ao lado do deputado, que está dirigindo
Imagem: Reprodução Facebook
gayer e cavalcante 2022 - Reprodução Facebook - Reprodução Facebook
Em 2022, ele publicou um vídeo em defesa de Gayer: "nosso amigo"
Imagem: Reprodução Facebook

Esta matéria foi produzida como parte do curso "Jornalismo investigativo: da hipótese à construção da narrativa" oferecido pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo com apoio da Embaixada e consulados dos Estados Unidos no Brasil. A investigação contou com mentoria da repórter Juliana Dal Piva.