Veto de Lula sobre 64 foi 'uma decepção', diz líder da Comissão de Anistia
A presidente da Comissão de Anistia do Ministério dos Direitos Humanos, Eneá de Stutz e Almeida, disse ter recebido com "surpresa e decepção" o veto do presidente Lula (PT) a atos que relembrem o golpe militar de 1964, que completam 60 anos na próxima segunda (1º).
O que acontece
O MDH pretendia fazer um ato de repúdio ao Golpe de 64, que relembrasse os diversos desrespeitos a direitos humanos sofridos durante 21 anos de ditadura militar no Brasil (1964-1985), mas foi desestimulado. "Recebemos essa decisão com perplexidade e decepção", disse a presidente da comissão, que participava dos preparativos, em entrevista à revista Veja.
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"Foi com muita surpresa, foi um verdadeiro choque quando recebi a notícia", disse Enéa. "Uma parte da população flerta hoje com o golpe porque não tem noção do que é um Estado de exceção."
Eu não consigo entender por que o presidente entende, de maneira acertada do meu ponto de vista, que é necessário investigar e, se for o caso, responsabilizar aquelas pessoas envolvidas em uma tentativa de golpe, que foi o que aconteceu ano passado, mas não vê razão para falar sobre o golpe.
Eneá de Stutz e Almeida, presidente da Comissão de Anistia do MDH
Embora fale sobre democracia em quase todos os discursos, Lula não citou até agora o golpe de 64. Preso pela ditadura no final dos anos 1970, uma das lideranças das Diretas Já e deputado constituinte, o hoje presidente pede que essa "disputa" fique no passado.
Na entrevista, divulgada hoje, Enéa também questionou essa ideia e relembrou que o próprio presidente citou o Holocausto judeu na Segunda Guerra recentemente. "O Holocausto aconteceu há mais de 80 anos. Então, ele vê, de maneira correta, importância em falar sobre o Holocausto. Qual a relevância de falar sobre o Holocausto em pleno Século 21? Toda", argumentou.
O que aconteceu na ditadura que se seguiu ao Golpe de 64 foram crimes contra a humanidade. Então, todo e qualquer ser humano foi e é atingido por esses crimes cometidos pelo Estado brasileiro. Todos os brasileiros -- inclusive os que não nasceram ainda-- são responsáveis por lembrar, por garantir que isso nunca mais aconteça.
Eneá de Stutz e Almeida, presidente da Comissão de Anistia do MDH
Ela disse ainda avaliar que o presidente "partilha da mesma perspectiva das Forças Armadas" de que a Lei da Anistia (n° 6.683/79) foi "uma lei de esquecimento", que "proíbe que se fale sobre os atos". "Não foi o caso", garante a pesquisadora. "Foi uma lei de memória, então ela exige que a gente lembre. Nesse sentido, me parece um enorme equívoco do presidente."
Oficialmente, o governo não tem tratado do assunto. Ministros evitam falar de uma imposição direta de Lula para que o assunto fosse esquecido, mas admitem que tampouco houve qualquer estímulo para debates sobre o marco. Postagens em redes sociais não estão descartadas, mas não deve haver um grande evento.