STF define na quarta a quantidade de maconha que diferencia porte e tráfico
O STF (Supremo Tribunal Federal) definirá em uma nova sessão nesta quarta-feira (26) os critérios para diferenciar porte e tráfico de maconha. A Corte decidiu na tarde de terça, por 8 votos a 3, descriminalizar o porte para uso pessoal.
O que aconteceu
Os ministros se reunirão às 14h da quarta-feira para definir os critérios que diferenciam porte e tráfico de drogas. O UOL apurou que a Corte vai decidir a tese (orientação para instâncias inferiores) e a quantidade máxima de maconha para enquadramento como porte.
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Entre os ministros, há três correntes distintas em relação à quantidade tomada como referência. Luís Roberto Barroso, Cristiano Zanin e Kassio Nunes Marques estabeleceram 25 gramas, mas podem mudar o posicionamento para mais, para 40 gramas. Por outro lado, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Cármen Lúcia e Rosa Weber (aposentada) defenderam a quantidade de 60 gramas, mas podem decidir por menos, 40 gramas.
O terceiro grupo abrange Edson Fachin, Dias Toffoli, Luiz Fux e André Mendonça. Eles afirmam que cabe ao Congresso ou ao Executivo estabelecer os critérios. Segundo eles, o ideal seria deixar que a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) defina a quantidade.
Ministros entenderam que há a chamada "presunção relativa". Isso significa dizer que os juízes podem fazer uma diferenciação entre o usuário e o traficante ao analisar cada caso. Quando a quantidade de droga for a única prova, vale o critério que o STF estabelecer. Até esse quantidade, o porte não será crime, mas sim um ilícito sem efeitos penais.
A Lei de Drogas não especifica os critérios para diferenciar usuário e traficante. Com isso, na prática, acaba ficando a cargo das autoridades locais, como polícia, Ministério Público e o juiz, definir se a pessoa que está com drogas é usuário ou traficante. O STF pretende estabelecer critérios para padronizar as abordagens policiais no país.
Outros pontos em aberto, além da quantidade
Sessão precisa definir se decisão terá efeito para casos passados, avaliam advogados. O diretor da Plataforma Justa, Cristiano Maronna, disse que os ministros precisam debater os efeitos da decisão. "Vai valer para casos passados ou será somente para casos futuros? Se fixarem a quantidade em 40 gramas, as pessoas presas e condenadas serão beneficiadas?", afirma ele.
Maronna diz ainda que os ministros precisarão debater o conjunto de provas que definirá a atividade como tráfico. "O ministro Alexandre de Moraes defendeu a presunção relativa de uso pessoal no caso de porte de até 60 gramas, exceto quando presentes outros indícios de traficância. Chamo isso de 'testemunho policial e provas a ele ancoradas', o que significa que ficará a cargo do policial relatar se há indícios de tráfico durante a abordagem", explica.
A decisão sobre a quantidade tem impactos sobre instâncias que legislam. No âmbito do direito administrativo, estados e municípios têm competência para legislar.
Outro ponto em aberto é qual instituição vai atuar na fiscalização. "Quem teria a função de fiscalizar a aplicação da norma? Seriam as polícias ou as guardas municipais? Para impedir abusos e violações de direitos humanos, o uso de câmeras corporais é um ponto essencial", diz Maronna.
Posição dos ministros foi considerada conservadora, segundo advogado. "Houve uma autocontenção demasiada. A pressão da extrema direita funcionou. O Congresso atropelou o STF e intimidou a Corte", disse o diretor do Justa. Na noite de terça-feira, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), criticou a decisão e disse que a descriminalização por decisão judicial é "invasão à competência" do Legislativo.
A decisão do STF sobre a descriminalização trata de um modelo de segurança pública do país. Mas, infelizmente não toca nos pontos nevrálgicos. O que tem que mudar é a atuação da polícia e do sistema de Justiça.
Cristiano Maronna, diretor da plataforma Justa
Discordo da decisão do Supremo Tribunal Federal [de descriminalização do porte de drogas para uso pessoal]. (...) Há uma lógica jurídica, política, racional em relação a isso, que, na minha opinião, não pode ser quebrada por uma decisão judicial que destaque uma determinada substância entorpecente, invadindo a competência técnica que é própria da Anvisa e invadindo a competência legislativa que é própria do Congresso Nacional.
Rodrigo Pacheco, presidente do Senado
Como votaram os ministros
Votaram a favor da descriminalização do porte de maconha:
- Gilmar Mendes
- Luís Roberto Barroso
- Edson Fachin
- Rosa Weber (quando ainda era ministra; por causa disso, seu sucessor, Flávio Dino, não votou)
- Alexandre de Moraes
- Dias Toffoli (mas para que não se restrinja apenas à maconha)
- Luiz Fux
- Cármen Lúcia
Votaram contra a descriminalização do porte de maconha:
- Cristiano Zanin (mas que o usuário não seja preso)
- André Mendonça
- Kassio Nunes Marques (mas que o usuário não seja preso)
Toffoli reapresenta voto, após dúvidas
Até semana passada, eram 5 votos favoráveis à descriminalização do porte e 3 contrários. Na quinta-feira (20), Toffoli abriu uma divergência, defendendo que a lei já presume que o ato de portar drogas não é crime e que, portanto, não fazia sentido votar pela descriminalização. Com o voto dele, o julgamento foi suspenso e, segundo a assessoria do STF, o placar ficou em 5-3-1.
Depois, Toffoli pediu para pronunciar novamente seu voto. Ele disse que talvez não o tivesse explicado corretamente. O ministro votou com a maioria, considerando que o porte de drogas não é crime. Ele reiterou que considera que a própria lei já não criminaliza o porte, mas admitiu que, no julgamento específico, estava de acordo com a maioria.
Voto de Fux gera dúvida, e Cármen Lúcia vota com maioria
O ministro Fux seguiu o entendimento de Toffoli, de que a lei analisada não criminaliza o porte. Ele disse que, no julgamento específico, seguia a maioria. Inicialmente, o voto foi interpretado como pela criminalização do porte. O ministro apontou que o Brasil não está pronto para legalizar o consumo de drogas e trouxe dados sobre consumo e tráfico. Ao final da sessão, porém, ele explicou novamente sua posição, computando seu voto com a maioria.
A ministra Cármen Lúcia foi a última a votar e se juntou à maioria. Ela fez apenas uma nova proposição, que será votada amanhã. No entendimento da ministra, a decisão do STF relacionada à quantidade de maconha permitida deve passar a valer assim que for tornada pública, até que o Legislativo defina outros critérios.