Google criticou censura e falta de argumento, mas cumpriu ordem de Moraes
O Google Brasil viu risco de censura prévia e falta de fundamentação em uma ordem do ministro Alexandre de Moraes para derrubar um canal do YouTube, mas, diferentemente do X, cumpriu a decisão e não sofreu sanções.
O que aconteceu
Moraes ordenou bloqueio de envolvidos em campanha de difamação e ataques a delegados da Polícia Federal envolvidos em inquéritos que atingem diretamente o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus apoiadores. Google, X e Meta receberam ordens do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) em agosto. Das três empresas, apenas a Meta não recorreu da decisão nem reclamou de ter de bloquear seis contas do Instagram e quatro do Facebook.
Relacionadas
X e Google questionaram decisão. Em manifestações sigilosas encaminhadas ao STF, as duas empresas disseram que seria mais adequada a retirada somente das postagens com conteúdos ilícitos, e não o bloqueio completo de canais e perfis.
Google criticou derrubada de canal, em vez de seleção de conteúdo. A empresa ressaltou "que existem meios legítimos de responsabilização posterior em razão da publicação de vídeos e materiais considerados ilícitos pelo Poder Judiciário, diferentes da censura prévia de canais e páginas como um todo".
X usou argumento parecido, descumpriu determinação e foi punido com multas e suspensão de atividades. A empresa de Elon Musk afirmou que só deveria suspender conteúdos apontados como ilícitos, não uma conta integralmente. No caso do X, foi determinado o bloqueio de sete perfis na rede social. "A ordem de bloqueio integral das contas ilustra a desproporcionalidade da decisão", além disso, apontou que poderia "caracterizar-se, com o devido respeito, como censura prévia —o que não se pode admitir".
Bloqueios e sem ganhar dinheiro. Foi ordenado que as plataformas bloqueassem contas e canais, mantendo os dados das publicações, que impedissem a monetização desse conteúdo e que informassem sobre acessos a perfis ligados a 11 investigados pela campanha de ataques, entre eles o senador Marcos do Val (Podemos-ES).
Procurados pelo UOL, Google e Meta não comentam. Por meio de sua assessoria de imprensa, o Google informou que não fala sobre casos judiciais em segredo de Justiça. A Meta também informou, por meio de sua assessoria, que não iria comentar o assunto. O X encerrou seu escritório no Brasil.
O caso tramita em sigilo. Até o momento, não há nenhum indicativo de que o ministro tenha revisto sua decisão com base nos recursos apresentados pela Google e pelo X aqui mencionados.
O que argumentou o Google Brasil
A peticionária não poderia deixar de registrar que existem meios legítimos de responsabilização posterior em razão da publicação de vídeos e materiais considerados ilícitos pelo Poder Judiciário, diferentes da censura prévia de canais e páginas como um todo. O ponto se torna especialmente sensível diante da possibilidade de existência de conteúdos impertinentes ao contexto da investigação ou que constituem exercício legítimo da liberdade de expressão - que seriam suprimidos por mero arrastamento.
Sem prejuízo do acatamento, sempre muito respeitosamente, a peticionária pede vênia para pontuar que a ordem judicial direcionada à Google não veio acompanhada da fundamentação que motiva a decisão de bloqueio do canal como um todo na plataforma YouTube. o que contraria os requisitos de fundamentação decorrentes da Constituição, da legislação processual e do Marco Civil da Internet, naturalmente reforçados em matéria de restrições à liberdade de expressão e privacidade.
Com o genuíno respeito, a importância da fundamentação é reforçada pelo fato de a ordem determinar o bloqueio do canal como um todo. A jurisprudência desse Eg. Supremo Tribunal Federal sempre se postou de forma intransigente contra restrições genéricas e/ou prévias à liberdade de expressão, sem prejuízo dos mecanismos legítimos de remoção do que seja ilícito e responsabilização posterior dos seus autores.
Trecho da manifestação enviada ao STF em 19 de agosto
O que disse o X
Como é evidente, a ordem de bloqueio integral das contas @EdRaposo_, @Claudio061973, @PrJosiasPereira3, @marcosdoval, @DraPaola_, @mveustaquio, @xfischer ilustra a desproporcionalidade da r. decisão agravada, na medida em que acaba por afetar não apenas todo o conteúdo disponível na conta, como também restringe e proíbe a veiculação de conteúdo futuro, seja ele ilícito ou não, podendo caracterizar-se, com o devido respeito, como censura prévia - o que não se pode admitir. A ordem de remoção sempre deve se restringir ao conteúdo considerado ilícito, e nunca à integralidade da conta!
Diante do exposto, o X BRASIL respeitosamente requer seja reconsiderada a r. decisão agravada ou, caso assim não entenda Vossa Excelência, seja submetido o presente agravo à apreciação do Plenário desse Supremo Tribunal Federal, para que este a reforme e (i) determine a remoção apenas do conteúdo específico - identificado através de sua respectiva URL - e tido como potencialmente tipificados como ilícitos penais, nos termos da r. decisão agravada, revogando-se, por conseguinte, a ordem de bloqueio integral das contas @EdRaposo_, @Claudio061973, @PrJosiasPereira3, @marcosdoval, @DraPaola_, @mveustaquio, @xfischer, ou, alternativamente, (ii) estabeleça prazo máximo pelo qual as contas devem permanecer retida na plataforma X, igualmente em observância ao princípio da proporcionalidade.
Trecho da manifestação do X em 19 de agosto
Manifestação da Meta
A Ordem foi devidamente processada e a Meta Platforms informou diretamente ao endereço de e-mail xxxxxxxx@pf.gov.br que indisponibilizou as contas, tendo preservado seus dados e fornecido as informações básicas de usuário e os registros de acesso (logs de IP) disponíveis para os períodos mencionados (Doc. 02).
A Meta Platforms reforça que está à disposição desse E. Supremo Tribunal Federal e que disponibiliza o Sistema de Solicitações Online para Autoridades para o envio de ordens e outros documentos de natureza criminal, disponível em www.facebook.com/records, que permite o envio, acompanhamento e processamento online de requisições de dados de usuários por parte de autoridades públicas no curso de investigações e persecuções criminais, 24 (vinte e quatro) horas por dia, 7 (sete) dias por semana, em português.
Manifestação da Meta ao STF em 21 de agosto