Morto na ditadura, prefeito terá documento corrigido; Jair Renan foi contra


Do UOL, em São Paulo*
26/03/2025 15h00
Vereadores de Balneário Camboriú (SC) votaram ontem pela atualização de documentos sobre a morte do primeiro prefeito da cidade, Higino João Pio, assassinado pela ditadura militar em 1969. O único a votar contra o texto foi Jair Renan Bolsonaro (PL).
O que aconteceu
Desde 1997 familiares do ex-prefeito tentavam o reconhecimento da morte por motivos políticos, que só aconteceu este ano. "A causa da morte de Higino Pio, não foi natural, foi violenta, causada pelo Estado brasileiro no contexto da perseguição sistemática à população identificada como dissidente política do regime ditatorial instaurado em 1964", diz a certidão de óbito atualizada.
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Após atualização da certidão de óbito, Câmara votou pela retificação de documentos. A decisão dos vereadores foi por corrigir atas públicas que registraram erroneamente que o político havia cometido suicídio.
Somente o vereador Jair Renan (PL) votou contra o texto. Dos 19 vereadores do município, 16 votaram a favor da alteração na documentação, Victor Forte (PL-SC) estava ausente e o presidente da Câmara, Marcos Kurtz (Podemos-SC), não votou.
Câmara fará sessão solene em homenagem a Higino João Pio. Solenidade acontecerá na segunda-feira (31), às 19h.
Procurada pelo UOL, a assessoria de Jair Renan disse que ele não comentaria o voto. O espaço segue aberto para manifestações.
Quem foi Higino João Pio
Higino João Pio foi preso político. Além dele, outras 698 pessoas no estado de Santa Catarina sofreram violações de direitos humanos, segundo estima a Comissão Estadual da Verdade Paulo Stuart Wright.
A atualização da certidão de óbito ocorreu após resolução do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Aprovada em dezembro do ano passado, a resolução definiu que é dever dos cartórios reconhecer e retificar os certificados de óbito de todos os mortos e desaparecidos vítimas da ditadura militar.
"Demorou muito, a prova que ele foi assassinado foi em 2014", disse o filho do ex-prefeito, Julio Cesar Pio. Ao Estadão, ele contou que a família esperou por muitos anos pela retificação dos documentos de Higino Pio. Ele tinha 13 anos quando o pai foi levado por agentes da ditadura.
Higino João Pio foi eleito pelo PSD (Partido Social Democrático) em 1965. A eleição ocorreu assim que o município foi desmembrado de Camboriú. Conforme o relatório final da Comissão Estadual da Verdade Paulo Stuart Wright, o ex-prefeito foi preso em 19 de fevereiro de 1969, acusado de irregularidades administrativas.
A prisão estava relacionada, segundo o documento, a "disputas políticas locais e [ao fato] de [Higino] ser amigo pessoal de João Goulart". Outros funcionários da prefeitura também foram levados e conduzidos para a Escola de Aprendizes de Marinheiros de Florianópolis. Após prestarem depoimento, apenas Higino João Pio permaneceu detido.
Higino Pio foi encontrado morto em uma das celas da Marinha. No dia 3 de março, dia do aniversário da mulher dele, a família foi notificada de sua morte, por suicídio que teria sido causado por asfixia com um pedaço de arame, segundo a versão dos militares.
As fotos apresentam Higino João Pio com os pés firmemente no chão, o queixo apoiado num vão da parede e as mãos dobradas. Situação impossível para um suicida.
Comissão estadual da verdade de Santa Catarina
* Com informações do Estadão Conteúdo