O último embaixador nos EUA

Sérgio Amaral diz que iniciou aproximação com EUA e joga para Senado responsabilidade sobre Eduardo Bolsonaro

Talita Marchao Do UOL, em São Paulo Marlene Bergamo/Folhapress

Para quem entra na sala repleta de livros de história e política internacional da casa do último embaixador brasileiro nos EUA, Sérgio Amaral, 75, uma das fotos pode passar despercebida atrás dos retratos íntimos da família: a imagem ao lado do ex-presidente Barack Obama, com uma pequena dedicatória.

"O Trump não mandou fotos para as embaixadas", justifica o embaixador aposentado. A fotografia com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso está em primeiro plano —Amaral chegou a ser o porta-voz durante o governo do tucano.

O diplomata já estava aposentado quando, a pedido do ex-presidente Michel Temer (MDB), assumiu a embaixada nos EUA, em 2016. Já tinha decidido voltar para o Brasil após a mudança de governo. É ele que o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho de Jair Bolsonaro, almeja substituir na principal embaixada do xadrez diplomático do Itamaraty.

O embaixador tenta, pela segunda vez, se aposentar, ainda que isso lhe pareça tarefa difícil. Entre almoços com embaixadores de outros países e novos trabalhos, desde que voltou dos EUA, passou alguns dias na China, tornou-se sócio em um escritório de advocacia, está ligado à Fundação FHC e retomou as atividades de sua consultoria na área internacional. "Acho que não gostaria de não ter nenhuma atividade", diz o diplomata ao UOL em São Paulo.

Além de embaixador nos EUA, Amaral ainda comandou as embaixadas em Londres e em Paris, representou o Brasil na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e participou das negociações para a criação da OMC (Organização Mundial de Comércio). Durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, foi ministro em duas ocasiões: na Secretaria de Comunicação e na pasta de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Seu nome chegou a ser citado como forte candidato ao cargo de chanceler em diferentes ocasiões.

Muito diplomático, Amaral desconversa quando é perguntado sobre a possibilidade de Eduardo ocupar o cargo que está vago desde a sua saída da capital norte-americana. Na entrevista, diz ainda que o escritor Olavo de Carvalho não era uma pessoa presente na embaixada durante o seu comando e elogia a mudança consolidada pelo seu ex-funcionário, o agora chanceler Ernesto Araújo, no comando do Itamaraty. Mas não sem invocar sua parcela de responsabilidade na reaproximação com a Casa Branca.

"Me empenhei muito pessoalmente nesta aproximação maior com os EUA. A embaixada já estava engajada neste processo", diz Amaral. A afirmação, ainda que indireta, pode ser considerada como uma resposta ao comentário feito por Bolsonaro há alguns meses de que nada foi feito pelos últimos embaixadores brasileiros nos EUA desde 2003.

Ouça também a íntegra da conversa com Sérgio Amaral no podcast UOL Entrevista. O vídeo completo está disponível no canal do YouTube do UOL. Continue nesta página para ler o texto.

'Me empenhei pessoalmente na aproximação com os EUA a pedido de Temer'

UOL - O senhor já estava aposentado quando aceitou a proposta para comandar a embaixada em Washington. Como foi o período em que o senhor esteve à frente da embaixada?

Sérgio Amaral - Foi um momento bastante ativo e também, de certa forma, tumultuado, porque estou convencido que estamos vivendo uma grande transformação no mundo, nas relações internacionais. Esse período de transformações muito grandes que ocorreram nos Estados Unidos, na Europa, no Brasil, na América Latina, no mundo em geral, eles tiveram o epicentro nos Estados Unidos, pela importância do país e, ao mesmo tempo, pelo protagonismo do presidente Trump.

O epicentro foi justamente na mudança de governo nos EUA?

Sim, começou aí. E as mudanças na política externa americana foram grandes. As mudanças na política interna também. Tive o privilégio de ver esse mundo em grandes transformações, que foram, de certa forma, uma ressaca da globalização. Globalização que talvez tenha sido muito grande ou muito rápida, e ela afetou a democracia liberal. Ela levou à falta de capacidade dos partidos políticos em dar uma resposta às novas demandas da sociedade, à volta do populismo e do protecionismo. Foi um privilégio estar em um posto de observação privilegiado para observar, buscar entender e participar.

A embaixada em Washington, nesse xadrez diplomático, é a mais importante, principalmente no governo Bolsonaro. E a gente tem visto imagens, vídeos e eventos em que o escritor Olavo de Carvalho participa na embaixada. Ele tinha alguma influência na embaixada? Como era essa atuação dele dentro da missão diplomática brasileira, já que o senhor esteve lá nos três últimos anos...

Durante o tempo em que estive lá, eu sequer conheci Olavo de Carvalho. Ele não era uma pessoa presente na embaixada. Eu só vim a conhece-lo pessoalmente na visita do presidente Bolsonaro aos Estados Unidos, no jantar que ofereci à delegação brasileira.

Nessa visita que ele fez em março, certo?

Sim.

E o chanceler Ernesto Araújo foi seu funcionário na embaixada em Washington, correto? Ele foi parte da sua equipe...

Por muito pouco tempo. Ele era ministro encarregado dos assuntos de cooperação técnica e tecnológica. Mas acho que nos cruzamos por cerca de um mês, dois meses, no máximo.

Depois de tanto tempo na sua carreira diplomática, na sua trajetória, como o senhor vê as mudanças que o Ernesto tem feito na liderança do Itamaraty agora? Nesse novo Itamaraty que eles estão recriando?

Acho que algumas mudanças no Itamaraty foram positivas.

Essa aproximação maior com os EUA foi algo em que eu mesmo me empenhei muito pessoalmente. Aliás, foi essa a orientação que recebi do presidente Temer, de ampliar e aprofundar as relações com os EUA, de forma que a embaixada estava engajada nesse processo. E a visita do presidente Bolsonaro certamente deu uma consolidação, um coroamento desse esforço que vinha sendo feito.

Em certos temas, eu teria alguma convergência. Em outros, eu não teria convergência. Mas o que acho mais importante é que nós estamos assistindo, a meu ver, uma inflexão da política externa e àqueles temas que provocaram uma surpresa, ou mesmo espanto, porque fugiam da tradição diplomática brasileira, aos poucos vão sendo flexibilizados e, de certa forma, atenuados.

Como, por exemplo, a decisão anunciada de transferência da embaixada de Tel Aviv para Jerusalém; as restrições ao mundo árabe; como algumas restrições, no início, ao Mercosul. Então, acho que hoje estamos progressivamente voltando um pouco àqueles que são os nossos interesses mais permanentes e que tiveram um papel grande na diplomacia brasileira, tradicionalmente. Eu acho que a segunda opção é positiva.

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Reprodução G1

Eduardo ainda não foi indicado pelo pai

Eduardo Bolsonaro ainda não foi indicado como substituto de Sérgio Amaral, ainda que este seja o desejo de pai e filho.

O presidente Trump já concedeu o agrément, a autorização para que Eduardo represente o Brasil na embaixada em Washington. Bolsonaro, que deve viajar para os EUA neste mês para discursar na abertura da Assembleia-Geral da ONU, precisa ainda oficializar a indicação do 03 no Diário Oficial.

Em seguida, o deputado federal precisa ser sabatinado pela Comissão de Relações Exteriores do Senado e, depois, passar por votação na Casa.

Enquanto não tiver a certeza de que o filho será aprovado, Bolsonaro pai não deve formalizar a indicação —e o Brasil segue sem interlocutor direto nos EUA.

Sérgio Amaral não opina sobre a indicação do deputado, mas diz que, nas atribuições de um diplomata, "um embaixador tem acesso à Casa Branca quando a Casa Branca tem a iniciativa de convidá-lo".

'Senado é competente para avaliar a compatibilidade do candidato'

UOL - O Itamaraty já teve embaixadores que não eram diplomatas, mas nunca o filho de um presidente. Nem o governo americano, nem o próprio Trump fez isso. Como o senhor vê a indicação de Eduardo Bolsonaro para embaixada. O senhor vê nepotismo, por exemplo?

Sérgio Amaral - Veja bem, essa é uma pergunta que eu não me considero capaz de responder, porque isso já foi objeto de uma decisão, de uma avaliação, das instâncias do Executivo, que se considera que é competente neste tipo de questão. Assim como o Senado é competente para avaliar a compatibilidade do candidato com as funções que, se aprovado, ele vai exercer.

Eduardo é presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara. E, quando ele listou os motivos pelos quais ele poderia ser embaixador, disse que tinha feito intercâmbio, fritado hambúrguer, que fala inglês e que é próximo da família Trump. Esse fator "amigo da família Trump" faz diferença? Ele facilita essa relação?

Estou muito aberto a um debate de política externa. Mas o debate de pessoas, sobre pessoas, nunca foi a minha vocação nem a minha inclinação. Acho que nós temos que discutir e ser assertivos, firmes nas posições de princípio, de política, e não em torno de pessoas.

Mas o senhor chegou a se encontrar com o presidente Trump ou com o presidente Obama algumas vezes? Como é o trabalho de um embaixador? Ele tem esse acesso à Casa Branca, ou é muito mais com o Departamento de Estado? Minha dúvida é neste sentido...

O embaixador tem acesso à Casa Branca quando a Casa Branca tem a iniciativa de convidá-lo. Dificilmente um presidente, sobretudo nos EUA, onde há cerca de 200 representações de caráter diplomático, pode atender às demandas de embaixadores. Dificilmente a Casa Branca, ou outro presidente de outro país, poderá atender aos presidentes de outros países. Quanto mais aos embaixadores.

Eu tive ocasião de me avistar com o presidente Trump quando ele fez um jantar para quatro presidentes, entre os quais o presidente Temer. Tive a ocasião de ser convidado para jantar pelo genro do presidente Trump, o Jared Kushner, com a esposa [Ivanka Trump], na casa deles, no ambiente totalmente familiar, com os filhos por perto. Eles tinham muito interesse em saber a minha opinião e a minha avaliação sobre a presença chinesa no Brasil.

Quando foi isso?

Foi no primeiro ano do presidente Trump, quando os assuntos sobre a China afloraram como uma prioridade da política de Estado americano.

[Kushner e Ivanka como atuam conselheiros não remunerados de Trump na Casa Branca, com escritórios próximos do Salão Oval e acesso irrestrito ao presidente americano. Ivanka chega a representar o pai em reuniões e cúpulas internacionais. No começo de setembro, passou por países da América do Sul, como Colômbia e Argentina, mas não no Brasil.]

Reprodução

Donald Trump recebe o presidente Michel Temer em jantar na Casa Branca em setembro de 2017, na véspera da Assembleia-Geral da ONU. No centro, ao fundo da foto, o embaixador Sérgio Amaral durante o encontro com o presidente americano. A questão venezuelana foi a protagonista do evento.

'Retórica exacerbada entre Brasil e França'

UOL - Na sua trajetória diplomática o senhor serviu na missão diplomática brasileira em Paris e hoje o Brasil vive um dos momentos, talvez seja o pior momento, na relação diplomática com a França. Queria saber como que o senhor está acompanhando isso...

Sérgio Amaral - Olha, eu teria dúvidas em dizer que é o pior momento da relação diplomática com a França, poucas semanas depois de ter sido concluído o acordo entre o Mercosul e a União Europeia, que a meu ver, foi um ponto de inflexão. Foi uma grande mudança com o impacto muito positivo para os dois grupos, o Mercosul e a União Europeia.

O que acredito é que hoje existe um ruído, uma retórica exacerbada de ambos os lados, mas que isso tende a se atenuar na medida em que as forças da economia e da política venham a trazer todo o seu peso. O acordo é importante na economia, no sentido de que ele poderá, e deverá, retirar US$ 4 bilhões de impostos sobre o comércio. Ele poderá trazer novos investimentos e, de certa forma, os países e as indústrias já estão se preparando para isso. E marca, sobretudo, uma decisão de ambos os lados de compartilharem os seus destinos. Isso é muito importante.

Haverá sempre incidentes. Esse incidente que houve, acredito que tenha sido desnecessário. Mas o próprio tempo vai mostrar que ele é apenas um acidente de percurso, no contexto de uma relação que tem sólidos pilares e sólida sustentação na sociedade.

O acordo com União Europeia ajudou em uma espécie de reposicionamento do Mercosul, que passa a ganhar um fôlego, um protagonismo não só para o Brasil, mas para a própria Argentina, o Uruguai, o Paraguai. O senhor acredita que essa crise diplomática e até a questão ambiental, a crise internacional que foi gerada pela queimada, pode afetar o Mercosul e esse fôlego que ele ganhou com o acordo com a UE?

Acho que este acordo foi muito importante para o Mercosul, inclusive porque induziu uma convergência entre os países do bloco durante o processo de negociação com a Europa. Tinham que se entender para poder ter uma presença comum. Ele também permitiu um maior protagonismo. O Mercosul, de certa forma, revive com este acordo, que é muito importante.

Agora, na questão ambiental, as pessoas não estão percebendo que o acordo trouxe um reforço do compromisso ambiental muito maior do que se não tivesse havido acordo. Não só as regras são mais claras, às vezes mais rigorosas, mas também o capítulo ambiental do acordo entre o Mercosul e a União Europeia tem um sistema de solução de controvérsias próprio. Quer dizer, haverá um constrangimento e uma imposição para os Estados a praticarem medidas na defesa do meio ambiente. Então, sobre esse aspecto, o acordo é bastante positivo.

Sobre esse constrangimento que o Brasil protagonizou nas últimas semanas por conta das queimadas, que também gerou toda a crise com a França, a Alemanha e a Noruega. O senhor acredita que ela teve força para tirar esse protagonismo gigantesco que o Brasil tinha na questão ambiental nas últimas décadas? Viramos párias nessa questão ou não?

Eu acho que essa questão foi ruim para a imagem do Brasil no exterior. E, nas últimas décadas, essa imagem vinha se consolidando com um ativo para o país. Desde a Conferência do Rio em 92, o Brasil operou uma mudança na sua postura e na sua percepção sobre a questão climática. Este episódio das queimadas na Amazônia, de certa forma, afeta essa imagem que o Brasil vinha construindo. Mas o fato é que, se nós olharmos o que o Brasil fez e aquilo que ele vai fazer em função dos compromissos que ele assumiu, com o acordo com a União Europeia, nós voltaremos a ser percebidos como um país que não busca atender ao que a comunidade internacional espera, mas que está cumprindo com o que a sociedade brasileira quer. Isso porque a sociedade brasileira tem um compromisso com a questão ambiental, sobretudo os mais jovens.

Reprodução/Facebook

Sérgio Amaral apresenta suas credenciais ao presidente Barack Obama na Casa Branca, em 2016, quando assumiu o comando da embaixada brasileira. Permaneceu no cargo até abril. Em entrevista ao UOL ainda quando ocupava o posto diplomático, contou que já tinha tomado a decisão de deixar a embaixada no fim do governo Temer e que considerou natural Bolsonaro querer indicar seu próprio representante para o cargo.

Ichiro Guerra/Folhapress

Disputa EUA x China pode nos favorecer

UOL - Como que o Brasil poderia manter a parceria com a China e com os EUA enquanto as maiores economias do mundo estão nessa disputa comercial. Existe uma forma de a gente não sair prejudicado, ou até mesmo a gente tirar vantagem dessa disputa comercial?

Sérgio Amaral - Nós não temos como influir na dinâmica da disputa comercial. Mas o momento poderá nos favorecer ou poderá nos prejudicar. Quando é que a disputa comercial entre EUA e a China nos favorece? Quando os EUA impõem sanções sobre as exportações norte-americanas para a China, e a China, em represália, impõe sanções, sobretudo no setor agrícola norte-americano, que está pagando uma boa parte do custo dessa guerra comercial. Não podendo comprar, como comprava antes, um volume grande de produtos do agronegócio americano, a China passou a comprar do Brasil.

O caso mais notório é o da soja. No ano passado, 86% da soja exportada pelo Brasil foi para a China. Se essa disputa comercial prosseguir, nós continuaremos a ser beneficiados. Se houver um acordo que leve a um desvio do comércio chinês do Brasil de volta para os EUA, nós poderemos ser prejudicados. No caso da carne, por exemplo, não temos como interferir neste processo. Mas, sim, nós temos que manter as boas relações que nós temos e que se ampliaram com os EUA. Mas não precisa ser em detrimento de outros países. Nós podemos também manter relações econômicas e comerciais muito positivas com a China, porque nós temos uma grande complementaridade econômica. E o próprio presidente Bolsonaro diz que o Brasil não vai tomar partido nessa guerra comercial, o que eu achei uma posição muito oportuna. E Bolsonaro vai para a China em outubro.

O Brasil tem o que a China não tem, que é terra e água. Nós teremos sempre uma agricultura muito competente, o que os chineses precisam.

Não só o presidente Bolsonaro vai para a China, como o presidente chinês, Xi Jinping, também vem agora para o Brasil para a cúpula dos Brics, quando deve ser apresentado o projeto da nova Rota da Seda, para atrair investimento para cá. Como o senhor vê isso?

A Rota da Seda não é tratado do qual a gente faz parte, pede a adesão, tem que ratificar. Não é nada disso. Os chineses começaram com a Rota da Seda há mais tempo, quando perceberam que o percurso que eles tentavam fazer como desdobramento dos seus planos nacionais sobre os transportes, ferrovias e navegação tomavam mais ou menos o caminho na rota da seda de muitos séculos atrás. A seguir, a Rota da Seda passou a chamar One Belt One Road [Iniciativa do Cinturão e Rota], porque eles ampliaram o espaço, e o que aconteceu é o que eu chamo de geopolítica da infraestrutura.

A construção de estradas trouxe investimentos para as novas regiões beneficiadas e trouxe evidentemente, por decorrência, aumento da influência chinesa. A partir daí, o projeto passou a ser visto como uma ofensiva, um expansionismo chinês. Eu acho que nós podemos participar de alguns projetos. Nós podemos dizer que não pensamos em participar. Agora, esta questão está perdendo um pouco de sentido no momento em que um país como a Itália anuncia a sua intenção de aderir à One Belt One Road. O fato é que a China, depois de se transformar em um importante investidor em vários países, está se expandindo além das suas fronteiras. E isso, evidentemente, provoca uma preocupação em alguns dos seus parceiros, notadamente os EUA, na região latino-americana.

Trump não poderia se incomodar com essa participação brasileira e dos países da região?

Veja bem, quase todos os países latino-americanos têm na China o seu principal parceiro comercial, e vários desses países tiveram investimentos chineses. Nosso caso é um pouco diferente. Primeiro, por causa do tamanho da nossa economia, da importância dos nossos projetos.

Nós temos perfeitas condições de negociar com a China uma parceria equilibrada e em alguns casos nós podemos não ter interesse.

O que acontece é que os países estão necessitando de investimentos. Nós estamos vivendo um momento de retração dos investimentos em escala mundial, em que os investidores preferem aplicar recursos em títulos do governo americano do que investir em situações que, dada a instabilidade da economia mundial, podem ser de risco.

Então, não vejo problema que o Brasil receba investimentos aqui, desde que esses investimentos se comportem dentro das regras brasileiras. Se há interesse dos dois lados, não vejo por que não se possa fazer negócios, como quer que você chame isso. Os chineses podem chamar One Belt One Road, nós podemos chamar de Projeto Nordeste. Pode chamar como quiser. O fato é que os investimentos, se contribuem para o nosso desenvolvimento e se comportam dentro das regras que nós determinamos, não tem razão para impedirmos.

Para encerrar, aproveitando para amarrar toda a sua experiência de Estados Unidos com o que vai ter de mais importante que no ano que vem: a eleição americana. Os últimos índices econômicos americanos têm mostrado uma recuperação, geração de emprego, números estáveis. Isso favorece Trump? Qual é a expectativa do senhor para o ano que vem? Arrisca um palpite?

É muito difícil fazer uma previsão porque ainda tem muito tempo pela frente. Acho que uma parte da força política do presidente Trump vem da reforma tributária, que atendeu às preocupações e às posições do establishment da liderança republicana e de parte da sociedade que queria uma economia mais desimpedida de uma série de regulamentos e licenças. A outra parte vem do seu eleitorado, que ele soube cultivar e que se manteve estável com uma aprovação dele de 37% a 42%. Mantidas essas circunstâncias atuais, a probabilidade de Trump ganhar é maior do que a probabilidade de ele perder.

Além dos seus ativos, que seriam a economia e a fidelidade do seu eleitorado, ele tem também o fato de que os democratas até agora não definiram que história vão contar para a população e quem é que vai contar essa história. E estes são dois pontos absolutamente definitórios do resultado do processo eleitoral. Portanto, mantidas as circunstâncias atuais, eu acredito que Trump teria mais chance de ganhar. É preciso ver também, e esse é o segundo ponto importante, se a economia vai continuar a render os dividendos em termos de crescimento e de emprego que trouxe até agora em favor de Trump.

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