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"Que ronquem os motores": saiba quão alto nosso ronco pode ser

Segundo a Associação Brasileira do Sono indica que 24% dos homens e 18% das mulheres de meia-idade roncam - Getty Images
Segundo a Associação Brasileira do Sono indica que 24% dos homens e 18% das mulheres de meia-idade roncam Imagem: Getty Images

André Carvalho

Do UOL, em São Paulo

14/04/2017 04h00

Dormir acompanhado é bom, mas se a pessoa com quem você divide a cama ronca... Essa experiência certamente não será agradável, podendo, às vezes chegar a ser insuportável.

Se você acha que é exagero de quem ouve, estudos de monitoramento de sono realizados no Brasil revelam que já foram registrados roncos de até 80 decibéis, o que equivale a um barulho semelhante ao de um aspirador de pó grande, ou de um despertador a uma distância de 60 centímetros!

De acordo com a Associação Brasileira do Sono, 24% dos homens e 18% das mulheres de meia-idade do país roncam --acima dos 60 anos, o índice sobe para 60% e 40%, respectivamente.

O número elevado é explicado por vários os hábitos que levam as pessoas a produzirem barulho ao respirar durante o sono.

O que leva ao ronco?

Nossa garganta é estreita, comprida e repleta de músculos. E quando há uma vibração dessas paredes da faringe durante a passagem de ar, aí surge o ronco.

Para Edilson Zancanella, coordenador do Departamento de Medicina do Sono da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial, a obstrução das vias aéreas e o relaxamento muscular do corpo durante o sono são as razões que fazem com que as pessoas ronquem.

Assim, a posição em que se dorme, os hábitos alimentares, e a ingestão de bebidas alcoólicas e medicamentos influenciam nesta questão.

6.abr.2017 - A obstrução das vias aéreas e o relaxamento muscular do corpo durante o sono são as razões que fazem com que as pessoas ronquem - IStock - IStock
A obstrução das vias aéreas e o relaxamento muscular do corpo durante o sono são as razões que fazem com que as pessoas ronquem
Imagem: IStock
Dormir de barriga para cima, por exemplo, pode fazer com que a pessoa ronque. Geraldo Lorenzi Filho, diretor do Laboratório do Sono do Incor (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas) da USP, explica que isso acontece porque quando ficamos nesta posição, "a língua cai para trás" por conta do relaxamento da musculatura, causando a obstrução das vias aéreas.

"O ideal é dormir de lado com a cabeça de tal maneira que não forme nenhum ângulo no pescoço", explica. A obesidade é outro fator que leva à obstrução das vias aéreas e, consequentemente, ao ronco.

"Quando a gente ganha peso, a gente também ganha peso no pescoço. Ele vai ficando largo, mas a parte interna dele vai ficando mais estreita. E o fluxo do ar vai ter que passar nesse espaço menor. Aí você vai ter uma situação vibratória mais evidente", afirma Zancanella.

RONCO 2 - Getty Images/iStockphoto - Getty Images/iStockphoto
Imagem: Getty Images/iStockphoto

Bebidas também aumentam o barulho

A ingestão de bebidas alcoólicas pela noite é outro fator que pode fazer com que a pessoa ronque, já que o álcool relaxa a musculatura, deixando a língua mais propensa a atrapalhar a respiração.

O mesmo princípio vale para os remédios para dormir, que "favorecem, e muito, o aumento do relaxamento desta musculatura". Alimentar-se antes de dormir também não é algo recomendado, já que o próprio efeito da digestão também faz com que haja este relaxamento muscular.

Sono é sinônimo de dormir profundamente?

Mas o ronco primário, que geralmente ocorre durante o chamado sono leve (de estágio N2), pode não ser tão 'inocente' assim.

"Pacientes que roncam têm mais chances de ter placas, obstruções nas carótidas, com dificuldade de passagem do fluxo de sangue para o cérebro somente", diz a neurologista. Isso ocorre por conta da vibração frequente dos músculos das vias aéreas ocorrida próxima ao vaso sanguíneo, que acaba por impactá-lo.

Quando o ronco pode indicar algum risco à saúde?

"Roncar não é algo normal", afirma a neurologista Andréa Bacelar, diretora da Associação Brasileira do Sono. Para ela, o ronco "funciona como um alerta, como um fator de risco para o diagnóstico dos transtornos respiratórios do sono".

Para Zancanella, quando um simples ronco evoluir para uma apneia do sono, aí sim a pessoa deve se preocupar. “O grande problema é que quando a pessoa ronca, ela pode ter momentos de parada respiratória. E esse intervalo pode ser um período em que não houve entrada de oxigênio no corpo", explica. “Isso pode ser uma situação grave", completa.

Bacelar alerta, ainda, que há um estágio intermediário entre o ronco e a apneia: a síndrome de Resistência das Vias Aéreas Superiores (SRVAS). Quando isso ocorre, a pessoa não para de respirar porque seu cérebro nota essa dificuldade na passagem do ar e o acorda, fragmentando assim o sono em períodos mais curtos, explica a neurologista. 

Esta fragmentação do sono não faz nada bem para nossa saúde. "Vai gerar problemas cognitivos, cansaço, alteração de reflexo, alteração de memória e irritabilidade. E aí começa a comprometer o sistema nervoso central", diz Bacelar.

Quem sofre mais? Quem ronca ou quem não dorme?

É extremamente improvável, entretanto, que a própria pessoa tome consciência destes problemas, como a apneia e a Síndrome de Resistência das Vias Aéreas Superiores. E isso se dá por motivos óbvios: "O paciente não consegue dizer se ele ronca, já que o sono é uma situação de consciência diferente daquilo que é o habitual”, diz Zancanella.

Muitas vezes, então, é o companheiro de sono desta pessoa que ronca que a leva para uma consulta médica. Lorenzi Filho, no entanto, admite que mesmo os exames de polissonografia "não medem direito o ronco".

Ele explica, entretanto, que tais exames são muito úteis para o diagnóstico de doenças como a apneia.

Há também exercícios desenvolvidos pelo Laborátório do Sono, que reduzem significativamente o ronco, segundo o médico pneumologista, mas ainda não são tão valorizados.

"Está todo mundo esperando a pílula mágica que ainda não surgiu", brinca.