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Congresso mais à direita, um freio para Lula ou caminho livre para Bolsonaro?

11/10/2022 15h01

O novo Congresso Nacional, ainda mais inclinado à direita, poderia dificultar um eventual terceiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ou dar mais tranquilidade a Jair Bolsonaro (PL), se for reeleito.

O líder da extrema direita, de 67 anos, superou as expectativas ao encostar em Lula, de 76, que venceu por estreita margem o primeiro turno da eleição presidencial. Os dois vão disputar o segundo turno no próximo dia 30.

Bolsonaro também tem razões para comemorar o resultado das eleições legislativas: seu Partido Liberal (PL) terá a maior bancada nas duas casas do Congresso, quando a nova legislatura começar, em fevereiro.

Na Câmara dos Deputados, o PL terá a maior bancada desde 1998, com 99 dos 513 deputados (23 a mais do que hoje). Com o Progressistas (PP) e o Republicanos, que compõem a base de apoio a Bolsonaro, seriam quase 190 deputados.

No Senado, com 81 assentos, o PL aumentou seis cadeiras, para 13, e no total, os partidos de direita vão controlar 53% da Câmara Alta.

"É um Congresso conservador, liberal, de centro direita", comemorou o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), que declarou apoio a Bolsonaro para o segundo turno.

- Um Congresso "hostil" -

Como o Legislativo vai agir se as pesquisas se confirmarem e Lula vencer?

"O Congresso será bastante hostil, devido ao crescimento da direita, especialmente da extrema direita, mais radical", explica à AFP Oliver Stuenkel, professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Para o especialista, detratores como o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do presidente, ou o senador eleito Sergio Moro (União-PR), que quando era juiz condenou Lula no âmbito da operação Lava Jato, "vão tentar complicar a vida" do petista desde a posse, em 1º de janeiro.

Pedidos de impeachment poderiam surgir "desde o primeiro momento", assegura Stuenkel.

Conseguir aliados para aprovar sua agenda de reformas, como o aumento dos impostos aos mais ricos e uma nova legislação mais favorável aos trabalhadores será "mais difícil", concorda Sérgio Praça, professor e pesquisador da Escola de Ciências Sociais (CPDOC), da FGV.

Mas, ao mesmo tempo, analistas acreditam que o ex-presidente Lula (2003-2010) poderia, como fez em seus dois governos anteriores, construir uma coalizão de esquerda (cerca de 120 deputados) com o centro, estratégico para governar o país.

O "Centrão", que reúne um punhado de partidos conservadores, porém pragmáticos, domina há décadas a política brasileira e todos os presidentes precisaram formar alianças para governar.

"Sua ideologia é muito mais maleável", afirma Stuenkel.

Segundo algumas estimativas, o "Centrão" tem agora mais de 240 congressistas.

Para Carolina Botelho, pesquisadora de comunicação política e opinião pública da Universidade do Estado do Rio Janeiro (UERJ), com um governo Lula, a maioria dos grupos de direita terão que buscar o diálogo.

"Mudar a liderança impõe uma pressão forte sobre essas pessoas mais estridentes e radicais (...) São só alguns deputados e senadores (...), não têm partido de massa organizado", diz Botelho.

- Bolsonaro, parte dois -

Se Bolsonaro for reeleito, especialistas preveem mais facilidade para governar.

"O Congresso está pacificado. Essa maioria nos permite dar agilidade nas propostas" de lei, afirmou o presidente.

O presidente aplaudiu um Legislativo mais concentrado na defesa da família, que não quer discutir o aborto ou "a ideologia de gênero", em alusão à diversidade sexual e de gênero.

Terá, ainda, o poder de nomear dois ministros ao Supremo Tribunal Federal (STF) em 2023, alterando a composição da máxima corte, que tem nas mãos vários processos que o comprometem.

E poderia tentar usar sua influência no Senado para pedir o impeachment de outros ministros.

Para Stuenkel, "o maior risco para a democracia em um segundo governo de Bolsonaro seria sua capacidade crescente de exercer pressão sobre o sistema judicial".

Outra incógnita é se nomes ultraconservadores no Congresso, como a ex-ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos Damares Alves, uma pastora evangélica, poderão fazer avançar a "agenda de costumes" relacionada aos valores tradicionais.

"Não vejo como medidas muito extremas seriam passadas de forma muito rápida ou facilmente", afirma Botelho.

Mesmo sendo derrotado, Bolsonaro poderia sair ganhando com este Congresso.

O presidente foi investigado, entre outras razões, por divulgar informações falsas e a Câmara recebeu 150 pedidos de impeachment contra ele. Além disso, a justiça está de olho nos negócios de sua família.

"Ali tem toda chance de ser protegido", afirma Botelho.

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© Agence France-Presse