Comissão Europeia cede a pressões e propõe adiar aplicação de lei contra desmatamento
A Comissão Europeia propôs, nesta quarta-feira (2), um adiamento por um ano da implementação da controversa lei de desmatamento, que deveria entrar em vigor no fim de 2024 e é alvo de questionamentos de importantes aliados comerciais do bloco, incluindo o Brasil.
A legislação, que veta na União Europeia a importação de produtos que gerem desmatamento, deveria entrar em vigor em dezembro desse ano, mas os prazos e as exigências do projeto provocaram graves questionamentos.
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"Tendo em conta os comentários recebidos por parceiros internacionais sobre o estado dos seus preparativos, a Comissão propõe também dar às partes interessadas tempo adicional para se prepararem", anunciou a instituição em comunicado.
Em setembro, o Brasil apresentou formalmente ao comissário europeu de Agricultura, Januz Wojciechowski, um pedido de adiamento da vigência da lei, iniciativa que foi respaldada pela Alemanha, motor econômico da UE.
Em um comunicado divulgado nesta quarta-feira, a Comissão Europeia propôs que controversa Lei Antidesmatamento [conhecida por suas siglas EUDR] entre em vigor em 30 de dezembro de 2025 para as grandes empresas, e em julho de 2026 para as PMEs.
"Dado que todas as ferramentas de implementação estão tecnicamente prontas, os 12 meses adicionais podem servir como um período de introdução gradual para garantir uma implementação adequada e efetiva", afirmou a instituição.
Esse adiamento deve agora ser aprovado pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho Europeu.
De acordo com a Comissão, a proposta anunciada nesta quarta-feira "não coloca em dúvida de modo algum os objetivos nem o conteúdo da lei".
"Vários parceiros globais expressaram repetidamente sua preocupação por seu estado de preparação, mais recentemente durante a semana da Assembleia Geral da ONU", acrescentou a Comissão.
Além disso, admitiu que "o estado dos preparativos entre as partes interessadas na Europa também é desigual".
- Questionamentos de aliados -
De acordo com a ONG Fórum Mundial para a Natureza (WWF, na sigla em inglês), as importações da UE são responsáveis por 16% do desmatamento mundial.
Em resposta aos dados, o bloco adotou um controversa lei para vetar a entrada de produtos que gerem desmatamento.
No entanto, depois que o Brasil apresentou seu pedido formal, a Alemanha somou seu apoio à ideia, alegando que "as empresas precisam de tempo para se preparar".
A postura alemã foi anunciada pelo ministro da Agricultura, Cem Ozdemir, um representante dos Verdes na política alemã.
Somente um dia antes, o chefe de Governo alemão, Olaf Scholz, admitiu que havia sugerido à presidente da Comissão, Ursula von der Leyen, postergar a implementação da lei "até que as questões abertas sejam esclarecidas".
Em junho, os Estados Unidos também pediram o adiamento da implementação da lei, que suscita preocupações por parte de países africanos e asiáticos.
Em setembro de 2023, um grupo de 17 países (11 latino-americanos, três asiáticos e três africanos) alertou a UE sobre os efeitos da norma.
Grupos ambientalistas europeus opõem-se ao adiamento da implementação da lei.
"UE cede a lobby do agro", criticou o Observatório do Clima, uma rede brasileira de organizações ambientais e de pesquisa, que denunciou a proposta da Comissão como um "recuo vergonhoso", que coloca em risco a redução do desmatamento e a integridade de territórios indígenas .
"No momento em que a América do Sul tosta sob o efeito da pior seca em décadas e o Brasil é consumido por queimadas, a Europa abre mão, deliberadamente, de um instrumento que poderia ajudar a reduzir a pressão sobre os ecossistemas naturais e as emissões de carbono por desmatamento", criticou a organização em nota.
Para Julian Oram, diretor de política da ONG Mighty Hearth, a iniciativa da Comissão é uma "traição às gerações presentes e futuras de cidadãos da UE".
Postergar a legislação "é um ato de vandalismo contra a natureza que apenas servirá para impulsionar uma maior destruição industrial das florestas tropicais", acrescentou.
Enquanto isso, Luciana Tellez Chávez, pesquisadora de Meio Ambiente e Direitos Humanos da Human Rights Watch (HRW), disse que a iniciativa "contradiz o compromisso da UE em virtude da Declaração de Glasgow de 2021 para encerrar a perda de florestas".
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