Apesar de decreto, Secretaria de Segurança de SP mantém sigilo sobre efetivo
O decreto do governador Geraldo Alckmin (PSDB) que revogou o sigilo de dados públicos em São Paulo não surtiu efeito na Secretaria de Estado da Segurança Pública, que mantém proibida a divulgação da distribuição do efetivo policial na capital. A pasta argumenta que saber quantos policiais trabalham em cada bairro da cidade pode pôr em risco a população paulistana.
Os dados permitiriam saber se os efetivos são distribuídos por critérios técnicos que levem em consideração o total de crimes e a população de cada bairro. Para tanto, a reportagem buscou no Serviço de Informações ao Cidadão (SIC), subordinado ao gabinete do secretário da Segurança Pública, Alexandre de Moraes, no dia 16, duas informações: o banco de dados da criminalidade e a distribuição de efetivo, viaturas e armas das Polícias Civil e Militar. O pedido foi feito no mesmo dia em que o governador revogou as classificações de sigilo.
O decreto de Alckmin foi uma resposta à revelação de que informações sobre obras e políticas da Polícia Militar, da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP), da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) e do Metrô haviam sido postas sob sigilo, fora do alcance da população.
Em primeira resposta à reportagem, o gabinete de Moraes alegou que não tinha as informações solicitadas, que deviam ser pedidas às polícias. Em reposta ao recurso da reportagem, o chefe de gabinete de Moraes, Olheno Ricardo de Souza Scucuglia, afirmou que o banco de dados era secreto (sigiloso por 15 anos, nos termos da Lei de Acesso à Informação) e a distribuição do efetivo policial era reservada (sigilosa por 5 anos).
"Informações sobre a quantidade de viaturas e armas da polícia, bem como o controle, a distribuição e utilização de efetivo existente, e seu respectivo regime de trabalho e escala de serviços, férias e licenças, são considerados imprescindíveis à segurança da sociedade e do Estado", informa. A reposta reafirma que a informação tem caráter reservado.
Transparência
A reportagem procurou três das instituições mais importantes do país ligadas ao tema da segurança pública: Instituto Sou da Paz, Fórum Brasileiro de Segurança Pública e o Núcleo de Estudos da Violência, da Universidade de São Paulo (USP). Os profissionais indicados pelos órgãos para analisar o problema são unânimes em afirmar que a divulgação da distribuição do efetivo não traz risco a ninguém.
"Essa informação não deveria estar em sigilo. É um dado que a população tem o direito de saber. Divulgar a distribuição do efetivo e detalhar os critérios de como é feita essa divisão poderia até blindar o governo de ingerências políticas. Não está sendo pedido o cartão de patrulhamento das viaturas, que diz em qual esquina os policiais vão estar e pode, sim, trazer risco à vida dos policiais", afirma Bruno Langeani, coordenador do Sou da Paz. A reportagem não pediu dados sobre horário, trajeto nem planejamento do patrulhamento das ruas.
"O efetivo deve ser distribuído por meio de critérios técnicos: população, população flutuante, o fato de o bairro ser residencial ou comercial e índices de criminalidade", diz o cientista político Guaracy Mingardi, do Fórum Brasileiro de Segurança. "Eles não revelam a distribuição do efetivo porque ela é feita a partir de critérios políticos."
Histórico
O cientista político Bruno Paes Manso, da USP, lembra que, até os anos 1990, na Polícia Militar, Diadema, na Grande São Paulo, era "um tipo de castigo, para quem cometeu algum delito".
"Isso mudou quando houve o caso da Favela Naval (onde blitze violentas da PM criaram uma crise na segurança pública do Estado). A PM então criou critérios técnicos para distribuir o efetivo. Esse modelo, com o passar dos anos, deixou de ser aplicado."
"Recentemente, quando estava sendo decidida a troca do secretário [da Segurança], um coronel da PM disse, em reunião, que a distribuição do efetivo era um dos principais problemas da polícia. Ele deu dois exemplos de bairros com uma distorção grande: Campo Belo (na zona sul) com um policial para 'x' habitantes, e Campo Limpo [extremo sul], com um policial para '20 x'. Um dos assessores disse, na hora: 'Mas eu moro no Campo Belo'", contou Paes Manso.
Para o cientista político, "esse é apontado como um dos problemas estruturais da polícia". "Aumenta a segurança da população acompanhar esses dados, porque os critérios têm de ser técnicos, não políticos."
Estudiosos da transparência pública também veem problemas. "A classificação de informações deve ser tratada como exceção, como está disposto na própria lei, mas infelizmente 'questões de segurança' vêm sendo usadas como desculpa para negar acesso à informação, reduzir transparência e diminuir a capacidade de fiscalização da mídia e da sociedade. O governo não pode classificar informações de maneira discricionária", diz Juliana Sakai, da Transparência Brasil. As informações são do jornal "O Estado de S. Paulo".
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