Topo

Ouvidor de SP pede que PF investigue tiroteio entre policiais em Juiz de fora

Marcelo Godoy, Bruno Ribeiro e Leonardo Augusto, especial para a AE

Belo Horizonte

24/10/2018 07h40

O ouvidor do Estado de São Paulo, Benedito Mariano, pediu a entrada da Polícia Federal na investigação sobre o tiroteio envolvendo agentes de São Paulo e de Minas, ocorrido na sexta em Juiz de Fora. O confronto acabou com dois empresários baleados e um policial mineiro morto. As apurações também serão acompanhadas por uma comissão de cinco promotores mineiros, criada nesta terça-feira, 23, pelo Ministério Público.

Conforme as investigações iniciais, o empresário paulista Flávio de Souza Guimarães teria ido a Juiz de Fora trocar dólares por reais e, para isso, teria contratado uma empresa de segurança. Esta chamou para a escolta policiais civis. Em Minas, a outra parte na suposta negociação seria o também empresário Antonio Vasconcelos, que traria os reais. Ele também teria contratado policiais civis para escolta. A troca de tiros supostamente ocorreu após ter sido descoberto que os reais, cerca de R$ 14 milhões, seriam falsos.

O secretário de Segurança de Minas, Sérgio Barbosa Menezes, disse à imprensa nesta terça que a apreensão poderia justificar a entrada no caso da PF. "A investigação desse crime (falsificação de dinheiro) é da PF", ressaltou, destacando que as duas polícias estaduais vêm trabalhando em conjunto.

De acordo com Benedito Mariano, "a apuração trabalha com vários crimes: homicídio, lavagem de dinheiro, prevaricação (por parte dos mineiros), estelionato e organização criminosa" e a entrada dos agentes federais se faz necessária pelo fato de haver policiais de dois Estados sob suspeita de ação ilegal. A solicitação foi feita tanto à PF quanto ao ministro da Segurança, Raul Jungmann. A Polícia Federal informou que recebeu o ofício da Ouvidoria. A análise dependeria também da competência do caso passar da esfera da Justiça estadual para a federal.

Ainda em Minas, o procurador-geral de Justiça, Darcy de Souza Filho, determinou o acompanhamento do caso por uma força-tarefa especial. Ela será formada pelos promotores Juvenal Martins Folly e Cleverson Raymundo Sbarzi Guedes, da Comarca de Juiz de Fora; pela procuradora de Justiça Cássia Virgínia Serra Teixeira Gontijo, coordenadora do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco); e pelos promotores Rodrigo Gonçalves Fonte Boa e Luiz Felipe de Miranda Cheib, também do Gaeco.

Quatro policiais civis de São Paulo estão presos na Penitenciária Nelson Hungria, em Contagem, na Grande Belo Horizonte. Jerônimo da Silva Leal Júnior, que seria o dono da empresa de segurança contratada pelo empresário paulista, foi baleado no abdome e continua internado em estado grave no Hospital Monte Sinai. Todos tiveram prisão temporária convertida em preventiva. A participação de policiais civis de Minas Gerais no caso é investigada, mas ninguém foi preso até agora.

Na segunda-feira, 22, Flávio Guimarães, em depoimento à Corregedoria da Polícia Civil de São Paulo, disse que, na verdade, teria viajado a Minas para pedir empréstimo para sua empresa.

Sem antecedentes

Os policiais paulistas envolvidos não tinham antecedentes de infrações funcionais graves. O delegado Rodrigo Castro Salgado da Costa, de 31 anos, do Grupo de Operações Especiais (GOE), seria amigo do investigador Jorge Alexandre de Miranda, de 50 anos, que por sua vez é meio-irmão de Leal Junior. O dono da empresa de segurança teria conversado com Miranda sobre o trabalho, pedindo que o ajudasse a recrutar policiais para escolta. O convite chegou a Costa que, por sua vez, exigiu que outros policiais, seus amigos, participassem da operação.

Os detalhes do "desacerto", o desentendimento que resultou no tiroteio no estacionamento, ainda não estão claros. O agente mineiro Rodrigo Francisco, de 36 anos, foi morto no confronto em Juiz de Fora.

O empresário Flávio Guimarães afirmou na segunda-feira ter sido vítima de um "golpe", após pedir um empréstimo - de "R$ 6 milhões a R$ 8 milhões" - ao doleiro Antônio Vasconcelos. Em depoimento à Corregedoria da Polícia Civil de São Paulo, ele negou a troca de dólares, disse não saber do uso de notas falsas e refutou qualquer viés político no caso.

Guimarães alegou ser "presidente executivo do Grupo AJC, voltado para o mercado de engenharia", que estaria passando por "dificuldades financeiras". Seus superiores teriam aprovado a negociação.

No termo oficial registrado, Guimarães rejeita "qualquer vinculação dos fatos narrados com atividade político-partidária de qualquer espécie ou viés". "Refutando especialmente qualquer alegação no sentido de caixa dois eleitoral."

No depoimento, contou ter entrado em contato com o mineiro por meio de um empregado. "Nessas tratativas, discutiram sobre a forma de garantia que seria ofertada, sendo que a empresa não possuía condições de ofertar garantia em moeda ou fiança bancária, restando garantia real (imóveis), sobre o que inclusive foi elaborado uma minuta de contrato de mútuo em Minas Gerais", consta, no termo de declarações.

Ele afirmou que chegou a convidar Vasconcelos e seu funcionário para fechar o negócio em São Paulo, mas o doleiro teria se recusado e pedido para que fosse até Minas para "prosseguir as tratativas". Foi quando seguiu para Juiz de Fora, acompanhado do advogado da empresa, Mario Garcia Júnior, e do diretor Roberto Uyvari Júnior.

Guimarães afirmou que a empresa de Jerônimo da Silva Leal Júnior já prestava serviços de segurança para o grupo AJC. E R$ 30 mil teriam sido pagos para garantir a escolta. Ele alega não conhecer os agentes envolvidos e nega ter levado "qualquer quantia de dinheiro em moeda estrangeira e nacional".

No relato subsequente, admite ter ido até o estacionamento onde ocorreu o tiroteio. O empresário afirma que Vasconcelos abriu o porta-malas de um veículo, onde havia as malas com as notas de R$ 100, e teria insistido para que levasse o dinheiro. Guimarães afirmou ter recusado "sob o argumento de que não fora aquele o combinado contratualmente, entrando em pânico". "Nesse momento, tentou-se impedir a saída do declarante, que se desvencilhou, buscando o elevador como saída, enquanto Jerônimo sacava sua arma de fogo e abordava Antônio Vasconcelos, estando o Dr. Rodrigo (delegado) no mesmo local, deixando o declarante todos para trás e retornando de imediato para o hotel."

'Vítimas'

Procurados, a AJC Group e os executivos Flávio de Souza Guimarães e Roberto Uyvari Junior afirmaram que foram "vítimas de uma tentativa de golpe" e estão colaborando com as autoridades mineiras e paulistas "para o esclarecimento dos fatos". O advogado Garcia Júnior afirmou que "não esteve no local das imagens gravadas e só soube da tentativa de golpe contra seu cliente minutos depois do ocorrido". As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.