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'Nem sempre o que é popular é o melhor para o país', diz líder do Vem pra Rua sobre reformas de Temer

Rogério Chequer, líder do Vem pra Rua: "O grande alvo é a renovação política" - Fabio Braga/Folhapress
Rogério Chequer, líder do Vem pra Rua: "O grande alvo é a renovação política" Imagem: Fabio Braga/Folhapress

26/03/2017 07h09

O movimento Vem pra Rua, um dos que arrastou multidões contra o governo Dilma Rousseff em 2015 e 2016, volta às manifestações nesse domingo, junto com o Movimento Brasil Livre, entre outros.

O foco, no entanto, não é a crítica à administração do presidente Michel Temer, cuja agenda econômica agrada a esses movimentos, mas a defesa da "renovação politica", afirma à BBC Brasil Rogério Chequer, líder do Vem pra Rua.

Na pauta comum das manifestações, aguardadas em várias cidades do país, está a oposição ao foro privilegiado; à anistia a crimes cometidos por políticos, como o caixa 2; ao aumento do financiamento público de campanha; e à adoção de listas fechadas (definidas pelos partidos) na eleição de deputados federais, estaduais e vereadores.

Sobre as denúncias envolvendo ministros de Temer (um terço da esplanada aparece em delações da Odebrecht, acordo dentro da Operação Lava Jato), o líder do Vem pra Rua diz que as nomeações do presidente "deixam muito a desejar" e que o movimento é "a favor da remoção imediata de qualquer um que tenha comprovação de envolvimento com corrupção".

Mas afirma que o cenário parece diferente do que ocorria no governo petista, no qual "foi levantado um esquema absolutamente sistêmico de corrupção".

No campo econômico, Chequer defende a importância das reformas que estão sendo discutidas e implementadas no atual governo, como alterações na legislação trabalhista e na Previdência.

Questionado se não seria autoritário implementar essa agenda sem que ela tenha sido submetida ao crivo nas urnas, em uma disputa eleitoral, disse que é "muito hipotético" discutir se tal proposta seria rechaçada pelos eleitores.

"Nós temos problemas inúmeros que exigem a atuação de qualquer governo que seja minimamente responsável. Fechar os olhos para essa realidade para fins eleitoreiros não é o que nós esperamos de qualquer candidato a governante. Nem sempre o que é popular é o que é melhor para o país", defendeu.

BBC Brasil - Qual é o alvo das manifestações desse domingo?

Rogerio Chequer - O grande alvo das manifestações de domingo é a renovação política. A gente está numa fase no Brasil onde a sociedade, de forma muito mais organizada, está exigindo ser escutada, exigindo ser representada.

Do lado dos representantes, eles estão assustados, ameaçados pela Lava Jato e pelas exigências da sociedade. E eles estão tentando se defender, trazendo a preservação de poder e privilégios, o que eu tenho chamado de combo.

É um combo de anistia (para crimes), (manutenção do) foro privilegiado, lista fechada (para eleição de deputados e vereadores) e aumento de financiamento público (para campanha). São ações que vão todas na direção de se perpetuarem no poder e manter os privilégios, para não serem atacados nem pelas denúncias do que fizeram e nem pelas exigências da sociedade.

BBC Brasil - Então, vocês acreditam que com essas mobilizações vão conseguir barrar o andamento dessas propostas no Congresso?

Chequer - Nosso objetivo é que fique claro para o Congresso e para o governo que o povo não está inerte e não vai aceitar calado as mudanças que eles estão prestes a fazer. Lista fechada, (mais) financiamento público e anistia são mudanças muito graves para a democracia.

BBC Brasil - O Brasil é um país grande, os Estados também são grandes, campanha custa dinheiro e é importante na democracia que os candidatos consigam levar sua mensagem e dialogar com os eleitores. Qual a proposta de vocês para financiar as campanhas?

Chequer - Isso une o assunto financiamento e o sistema eleitoral. Em primeiro lugar, se o objetivo é baratear campanha, a melhor alternativa é implementar o voto distrital. Ao limitar o distrito e, no caso de São Paulo, (reduzir em) até 70 vezes o número de eleitores para o qual você tem que fazer campanha, você barateia em até cinco vezes a campanha. Então o sistema é tão fundamental quanto o financiamento, na verdade é um conjunto.

E o tipo de financiamento que deve ser feito é um financiamento privado, vindo de pessoas que queiram ajudar. Ele até poderia ser de empresas, desde que haja transparência, agora ele pode vir de pessoas. Ao ter esse financiamento vindo de pessoas os partidos passam a ser obrigados a atender essas pessoas. Isso traria ideologia para os partidos que hoje, com uma abundância de financiamento público, não precisam se conectar com a sociedade, porque eles já recebem recursos suficientes para eleger os candidatos que eles querem e não a sociedade.

BBC Brasil - No caso da lista fechada, essa proposta veio a público com mais força depois de uma reunião no palácio do Planalto do presidente Temer com os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), do Senado, Eunício Oliveira (PMDB), e do TSE, Gilmar Mendes. Como vocês veem a atuação do presidente Temer nessa negociação? A informação que veio à tona é de que ele se comprometeu a não vetar a lista fechada caso o Congresso aprove a proposta.

Chequer - Nós estamos muito preocupados com o envolvimento que ele pode estar tendo com esse plano. Se for verdade essa informação de que ele se comprometeu a não vetar, ele já está tomando um partido a favor dessa mudança antidemocrática e ele deveria ser criticado por isso. Eu não tinha essa informação de que ele tinha se comprometido a isso. Eu vejo ele envolvido nessas negociações o que me leva a crer que ele pode sim estar apoiando essas medidas. Isso eleva nosso temor de que ele pode estar envolvido com esse grande combo de anistia, foro privilegiado, lista fechada e aumento de financiamento.

BBC Brasil - Voltando aos protestos, há uma discussão sobre se há ou não um racha na direita, devido a algumas diferenças entre Vem Pra Rua e MBL. Mas vocês convocaram protestos para o mesmo dia, então pergunto o contrário: vocês estão bem articulados?

Chequer - Há uma articulação e os movimentos saírem por pautas muito convergentes no mesmo dia não é uma coincidência. Agora, acho positivo o fato de haver vários movimentos porque eles são complementares, Cada um está mais ligado a uma faixa etária e isso é extremamente saudável para a democracia brasileira.

BBC Brasil - Além da questão de o MBL ter um público mais jovem que o Vem pra Rua, qual é outra diferença que seria central entre os movimento? Poderia dizer a ligação com partidos, já que MBL elegeu candidatos em 2016?

Chequer - Sim, eu acho que no caso do MBL existe uma diferença de audiência e existe uma diferença de estilo. Quem acompanha os dois consegue perceber. Agora uma diferença estrutural é a opção que o MBL fez, a qual eu não condeno, de lançar nomes, de fazer alianças diretas com determinados partidos e passar a ter uma conotação mais partidária.

Eu acho que tudo isso ainda é um grande experimento, para o Brasil. A gente vai descobrir em alguns anos quais são as vantagens e os cuidados que a gente tem que ter com isso, mas eu acho que é muito positivo para o exercício democrático.

Eu não olho isso com maus olhos, principalmente porque a sociedade tem opção agora de estar ligada a vários movimentos e escolher se quer movimentos mais partidários ou mais suprapartidários, como é o caso do Vem pra Rua.

BBC Brasil - No caso do MBL, ele lançou candidatos pelo DEM, e o DEM também é às vezes alvo de denúncias de corrupção. Essa mistura talvez acabe atrapalhando de alguma forma o discurso, as estratégias dos movimentos de direita?

Chequer - Eu acho que desde que eles não se envolvam com corrupção, o assunto corrupção não é o mais grave. Eu acho mais delicado, por exemplo, você estar num partido que tem a presidência da Câmara e que defende a lista fechada. Então essa diferença ideológica acho que gera mais conflitos do que casos de corrupção que, se eles não se envolverem com isso, não deveriam ser confundidos com quem se envolve.

BBC Brasil - Houve recentemente uma denúncia com relação ao vereador por São Paulo Fernando Holiday (DEM), liderança do MBL, de que ele teria usado recursos não declarados para pagar cabos eleitorais. É uma denúncia que o BuzzFeed fez e veio com entrevistas de testemunhas, planilhas com os nomes. Isso não cria um constrangimento para os movimentos? Como você recebeu essa denúncia?

Chequer - Em primeiro lugar, cada movimento é um movimento, um não deveria responder pelas coisas do outro. Eu não tenho nada a dizer sobre esse caso. Eu não vi evidências suficientes que tornam esse caso algo inegável. Eu vejo o MBL se defendendo contra isso e pelo que eu escutei eles estão inclusive processando a jornalista, por falta de evidências nas acusações que ela fez.

BBC Brasil - Você pessoalmente, embora o movimento tenha se mantido distante dos partidos, tem algum plano de se candidatar a algum cargo, por exemplo em 2018?

Chequer - É algo que eu escuto diariamente, pessoas falando, sugerindo. Eu acho nobre alguém se candidatar para servir o país. Não é algo que faça parte do meu planejamento ainda.

BBC Brasil - Ainda, mas talvez em algum momento você possa cogitar?

Chequer - O futuro é longo demais, em algum momento isso pode ser cogitado.

Eu não comecei esse movimento e essas ações pensando absolutamente nesse assunto. 2018 está muito próximo, isso não está no meu radar para agora.

BBC Brasil - Sobre a eleição presidencial de 2018, recentemente Ciro Gomes disse que em um eventual segundo turno entre João Doria (prefeito de São Paulo) e Jair Bolsonaro (deputado federal), fica com o Bolsonaro. Gostaria de perguntar para você: em um eventual segundo turno entre Lula e Bolsonaro, quem o movimento apoiaria?

Chequer - O movimento toma muito cuidado em apoiar não necessariamente pessoas, mas apoiar agendas. Nós pretendemos lançar em 2018 um agenda em torno da qual nós poderíamos apoiar candidatos que se comprometessem com ela. Pelo que a gente vê hoje de uma agenda de Doria e uma agenda (de Bolsonaro)... Assim, eles não apresentaram agendas formais ainda para uma campanha presidencial, mas diante das declarações e atitudes que os dois têm feito até agora, a agenda do Doria é muito mais alinhada com a ideologia do Vem pra Rua do que a do Bolsonaro, que traz divergências significativas com o que nós acreditamos ser bom para o Brasil.

BBC Brasil - Quais seriam essas divergências?

Chequer - É um estilo de não-igualdade, de tratamento diferenciado de pessoas e de extremismo em vários momentos que não condizem com o que o Brasil precisa como um bom político.

BBC Brasil - Mas em um segundo turno eventual entre Lula e Bolsonaro, se o Bolsonaro aderir mais às agendas que vocês estão propondo do que o Lula, vocês apoiariam o Bolsonaro?

Chequer - Nenhuma das anteriores. Eu não quero responder aqui a uma pesquisa de voto de segundo turno. Está muito cedo para a gente se posicionar. Não é nem claro que num caso desse nós apoiaríamos alguém.

BBC Brasil - Sobre Bolsonaro, você acha que de alguma forma a ascensão desse ator controverso acaba sendo um elemento negativo para a direita?

Chequer - Eu não gosto de fazer esses posicionamentos unificando uma direita. Eu acho que os conceitos de direita e esquerda no Brasil estão totalmente distorcidos. O que eu acredito é que qualquer extremismo hoje no Brasil é prejudicial para o desenvolvimento de uma nova democracia que está nascendo.

BBC Brasil - Voltando novamente para os protestos, tem ocorrido uma diminuição de público em relação às grandes manifestações pró-impeachment. Qual a expectativa para esse domingo?

Chequer - Não é nosso objetivo número de pessoas e sim a pauta que a gente está levando. Nós sabemos que essa manifestação não é da magnitude que foram aquelas duas grandes manifestações com um milhão de pessoas na Avenida Paulista (março de 2015 e março de 2016). Mas eu acho que ela vai estar enquadrada em algumas das grandes manifestações que o Brasil já teve.

O que eu posso te dizer é o seguinte, nessa última semana, diante dos últimos acontecimentos políticos, o ritmo de engajamento da sociedade para domingo está aumentando.

BBC Brasil - Temos um governo impopular e há várias denúncias contra ministros, outros integrantes. Por que os protestos não têm a magnitude dos anteriores?

Chequer - Eu acho que o momento é completamente diferente. O povo antes estava indo às ruas para tentar se livrar de um governo que estava levando o país à bancarrota. O caso agora é completamente diferente. Nós temos sinais de melhoria econômica. Você tem um governo que se preocupa agora com inflação, um governo que está preocupado com resultado de contas (gastos e despesas públicas). Nós estamos trabalhando muito mais em cima de uma renovação dos políticos que não servem ao Brasil nesse momento, do que simplesmente a substituição de uma pessoa, que acaba sendo uma causa mais simplista. E acho que essa simplicidade acaba às vezes reunindo mais gente.

BBC Brasil - Do ponto de vista de corrupção, que era também uma bandeira importante dos protestos, você acha que há uma diferença entre esse governo e o anterior nesse quesito?

Chequer - É impossível saber. Eu não tenho os dados que a Polícia Federal tem, eu não estou envolvido nas investigações. Casos de corrupção não são públicos enquanto eles ocorrem, eles são públicos depois que eles ocorrem. Eu faço parte do público que fica sabendo depois das coisas. Então é impossível para mim saber qual o nível de corrupção atual.

BBC Brasil - Há várias denúncias contra ministros, contra lideranças dos partidos da base, PMDB e o PSDB, assim como havia contra o PT, não?

Chequer - Não. O que foi levantado foi um esquema absolutamente sistêmico de corrupção. Eu não sou ingênuo para achar que não existe mais corrupção no Brasil. Agora, o que nós precisamos saber, e a gente precisa escutar da Polícia Federal, do Ministério Público, dos julgamentos, quais são os esquemas atuais. Afirmar que o que está acontecendo hoje é exatamente o que acontecia antes, eu acho que é uma informação que ninguém, ninguém, ninguém, pode trazer por enquanto.

BBC Brasil - O PMDB, partido que era presidido por Temer, fazia parte do governo anterior. Você acha que o PMDB não participou do Petrolão?

Chequer - Tudo que já foi levantado até agora indica que o PMDB, junto com outros partidos, estavam totalmente envolvidos com Petrolão. Não estou entendendo sua pergunta. Foi comprovado que o PMDB participou do Petrolão.

BBC Brasil - O PMDB está governando o país hoje. Por que vocês não protestam mais claramente contra o governo?

Chequer - Porque a gente não vai protestar contra o governo como um todo. A gente protesta contra vários casos. Nós somos totalmente a favor da eliminação de todos os ministros que apareceram com envolvimento comprovado com corrupção. E seremos a favor da remoção imediata de qualquer um que tenha comprovação de envolvimento com corrupção. Nós, de forma alguma defendemos, seja o governo, sejam as nomeações que foram feitas. Eu acho que as nomeações do governo Temer, e espero que isso aqui não seja tirado fora de contexto, eu acho que as nomeações do governo Temer deixam muito a desejar em termos de escolher pessoas que estejam totalmente desvinculadas com os grandes esquemas de corrupção, que apareceram até hoje.

BBC Brasil - Qual sua expectativa em relação ao julgamento do TSE que pode vir a cassar o presidente Temer? Se houve ilegalidade na campanha, o presidente Temer deve ser cassado?

Chequer - Olha, eu não quero fazer projeções hipotéticas em cima de um caso que está ainda sendo investigado. Se aparecerem evidências suficientes, deve ser feito com Michel Temer o que deveria ser feito com qualquer outro presidente ou vice-presidente. Nós não temos qualquer motivo para tratar Michel Temer diferente de qualquer outro presidente que nós tenhamos tratado no passado, inclusive Dilma Rousseff.

BBC Brasil - Dá para ver que o movimento está satisfeito com a condução da economia. Há muitas reformas impopulares sendo implementadas ou debatidas no Brasil, como a reforma da Previdência, a ampliação da terceirização. Você acredita que essas reformas passariam no crivo das urnas?

Chequer - O que que vc quer dizer com isso?

BBC Brasil - Um candidato a presidente que tivesse levado durante a campanha essa plataforma, de terceirização, de reforma radical da previdência, esse candidato teria sido eleito?

Chequer - Não sei, é altamente hipotética essa pergunta.

BBC Brasil - A pergunta seria no sentido de discutir se não seria antidemocrático essas reformas serem implementadas sem o crivo das urnas.

Chequer - De novo, (é um debate) hipotético. O quanto que não seria falado em campanha, mencionou-se, não mencionou-se (as reformas).... Nós sabemos que temos alguns grandes problemas no Brasil. Temos um problema tributário, com uma carga de impostos das maiores do mundo sem retorno em serviços, nós temos uma legislação trabalhista que enterra a contratação de novos empregos, nós temos um sistema previdenciário que está prestes a ser quebrado. Nós temos problemas inúmeros que exigem a atuação de qualquer governo que seja minimamente responsável.

Fechar os olhos para essa realidade para fins eleitoreiros, não é o que nós esperamos de qualquer candidato a governante. Nem sempre o que é popular é o que é melhor para o país.