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A volta à escola de Joseph - o menino que sofreu um aneurisma aos 3 anos e perdeu 40% do crânio

 A médica que atendeu Joseph explicou que ele sofreu um sangramento intracraniano devido a uma malformação arteriovenosa cerebral - Arquivo pessoal
A médica que atendeu Joseph explicou que ele sofreu um sangramento intracraniano devido a uma malformação arteriovenosa cerebral Imagem: Arquivo pessoal

Alessandra Corrêa

De Winston-Salem (EUA) para a BBC Brasil

03/09/2019 09h58

Joseph sempre foi uma criança saudável até que um dia acordou gritando e vomitando. O quadro do menino acabou se revelando muito mais grave do que se pensava inicialmente.

Assim como milhares de alunos que vão iniciar o ano letivo no Estado de Nova York nesta semana, o menino americano Joseph Federico, de 5 anos, está empolgado com seu primeiro dia de aula no jardim de infância.

Mas essa nova conquista tem um significado especial para Joseph e sua família. Um ano atrás, seus pais, Ann Marie e Joseph Federico Sr., não sabiam se o filho algum dia poderia frequentar uma escola.

Em maio do ano passado, poucos dias antes de completar quatro anos de idade, Joseph sofreu um aneurisma cerebral. Nas semanas e meses seguintes, ele teve de ser submetido a oito cirurgias, incluindo a remoção e, posteriormente, substituição de 40% do seu crânio.

Joseph ficou com o lado esquerdo do corpo paralisado. Nos últimos meses, o menino teve de reaprender a caminhar, falar e até mesmo a se alimentar sozinho. Sua recuperação e determinação impressionaram a família e os médicos.

"Ele sofreu um sangramento devastador. É um milagre que tenha chegado tão longe", diz à BBC News Brasil a médica Kathy Silverman, chefe da unidades de traumatismo cranioencefálico do Hospital Infantil Blythedale, no condado de Westchester, em Nova York.

Criança saudável

Joseph sempre foi uma criança saudável, sem nenhum problema de saúde. "Um menino completamente normal, muito atlético, muito inteligente", diz à BBC News Brasil sua mãe, Ann Marie.

Mas na noite de 7 de maio de 2018, ele acordou aos gritos. Seus pais correram para seu quarto e viram o menino vomitando.

"Inicialmente, pensei que fosse um vírus estomacal ou que talvez ele estivesse desidratado. Mas então ele começou a revirar os olhos e perder a consciência. Meu marido tentou molhar o rosto dele com água fria, para reanimá-lo, e perguntou: 'Joseph, você sabe quem está aqui?'. Ele respondeu: 'Papai'. E foi a última coisa que falou", conta Ann Marie.

Joseph BBC - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Joseph sempre foi uma criança saudável até que um dia acordou gritando e vomitando. O quadro do menino acabou se revelando muito mais grave do que parecia inicialmente.
Imagem: Arquivo pessoal

Na época, o segundo filho do casal, Charlie, tinha apenas um ano de idade, e Ann Marie estava grávida de nove meses de sua filha, Sienna.

Logo, uma ambulância chegou e, depois que os socorristas perceberam a gravidade do quadro, Joseph foi transportado de helicóptero para o Hospital Infantil Maria Fareri, a cerca de uma hora de distância da cidade de New Windsor, onde a família mora. No hospital, foi submetido a uma cirurgia de emergência.

"Joseph sofreu um sangramento intracraniano devido a uma malformação arteriovenosa cerebral, que é um vaso sanguíneo malformado que cresce e acaba se rompendo", diz a médica Kathy Silverman.

"Costumamos pensar nisso em adultos, o que chamamos de derrame. Mas também ocorre em crianças, pode ocorrer em qualquer idade, e não há como prever", afirma.

Os pais relatam que, nessa primeira noite, estiveram muito perto de perder Joseph. "Depois que tudo passou, um dos médicos nos disse: 'Vocês são uma família tão boa, eu estava torcendo para que, quando Joseph morresse, meu plantão tivesse terminado, para que eu não tivesse de ser a pessoa a dar a notícia'", recorda Ann Marie.

Série de cirurgias

Como o cérebro de Joseph estava traumatizado e inchado, os médicos recorreram a uma craniectomia descompressiva, em que parte da caixa craniana foi removida, dando espaço para o cérebro se expandir e se recuperar sem sofrer pressão, o que poderia agravar os danos.

A pele de Joseph não era suficiente para cobrir a área inchada do cérebro, que estava fora da caixa craniana, e os médicos tiveram de usar um enxerto de pele de cadáver.

Joseph e seu pai - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

"A cada três dias, à medida que seu cérebro se recuperava e encolhia, ele tinha de ser submetido a uma nova cirurgia para retirar o excesso de pele", lembra a mãe.

O cérebro acabou voltando ao tamanho normal, e os médicos puderam fechar a área usando a própria pele do menino e um enxerto ósseo.

A mãe relata que Joseph inicialmente ficou em estado de coma induzido por mais de duas semanas. Ele foi submetido a uma traqueostomia para respirar e tinha uma sonda no estômago para alimentação.

A mãe revela que um dos momentos mais difíceis foi quando deu à luz sua filha e teve de ficar vários dias sem ver Joseph, já que ele estava na UTI, o que poderia representar risco de infecção para a irmã recém-nascida.

Nesse período, o marido de Ann Marie, que é sargento do Departamento de Polícia de Nova York, e os avós se revezavam para ficar com o menino. "Ele nunca ficou sozinho, a família estava com ele o tempo todo", afirma.

Recuperação

Em junho do ano passado, depois das cirurgias iniciais, Joseph foi transferido para o Hospital Infantil Blythedale, onde passou por novas cirurgias e começou seu processo de reabilitação, sob a supervisão de Silverman.

Quando chegou ao hospital, ele mal conseguia sentar-se, depois de tanto tempo na cama. Seu lado esquerdo estava paralisado, ele não caminhava e não falava e havia perdido quase completamente a visão do olho esquerdo.

"Por causa da traqueostomia, não conseguia falar. Também não conseguia comer, depois de tanto tempo com uma sonda de alimentação. Precisou reaprender a mastigar, a engolir", lembra a mãe.

Joseph fez fisioterapia para reaprender a falar, para retomar os movimentos dos membros superiores, para voltar a se alimentar e a se vestir, e também fisioterapia para recuperar a mobilidade e reaprender a ficar em pé e caminhar.

Joseph amigos - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Nesta semana, Joseph terá o primeiro dia de aula no jardim de infância, após recuperar fala e movimentos. Na foto, ele aparece com outras crianças em atividades de reabilitação do hospital
Imagem: Arquivo pessoal

Em setembro do ano passado, o menino recebeu alta, mas continuou participando de programas diários no hospital para crianças que já podem morar em casa, mas ainda necessitam de cuidados médicos e de reabilitação.

Também participou de um programa especial para pacientes com membros superiores debilitadosd por diferentes problemas médicos.

"Seu sucesso até agora superou as expectativas dos médicos", comemora a mãe. "Um ano depois de ficar paralisado, ele já caminha, corre. Estou conversando com você (por telefone) da casa de minha irmã, e ele está brincando com meu sobrinho, correndo, nadando."

Joseph ainda usa um capacete especial para proteger a cabeça de eventuais quedas e está reaprendendo até a praticar seu esporte favorito, beisebol.

Volta às aulas

Na primeira semana de setembro, Joseph terá seu primeiro dia de aula no jardim de infância da Mt. Pleasant-Blythedale, escola pública que funciona dentro do próprio hospital, a única do tipo no Estado de Nova York.

Com cerca de 140 alunos, a escola permite que as crianças continuem sua educação durante o período de recuperação médica. Além das aulas, que seguem o mesmo currículo das outras escolas públicas do Estado, os estudantes recebem cuidados médicos e diferentes tipos de terapia, de acordo com suas necessidades individuais.

Ann Marie elogia a coragem e determinação do filho. "Ele tem uma atitude muito positiva diante de toda essa situação. Imagine um dia acordar sem poder mexer metade do seu corpo, sem poder falar. E ele nunca chorou, nunca perguntou por que isso teve de acontecer com ele. Todas as manhãs ela acorda com um sorriso no rosto", observa.

"E eu olho para ele e penso, se Joseph consegue ser tão positivo e alegre, tão determinado a melhorar, do que eu posso reclamar? Não me entenda mal, às vezes tenho meus momentos (de tristeza). Mas coisas bobas que antes me aborreciam, me estressavam, perderam a importância. Isso tudo me deu uma perspectiva completamente nova sobre a vida."