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Ministros do STF ficam 'surpresos' com demissões e avaliam que Bolsonaro tentou 'politizar' Forças Armadas

Fernando Azevedo Silva teria deixado o comando da Defesa por se recusar a "politizar as Forças Armadas", segundo relato de ministros do Supremo - Joedson Alves/EPA
Fernando Azevedo Silva teria deixado o comando da Defesa por se recusar a 'politizar as Forças Armadas', segundo relato de ministros do Supremo Imagem: Joedson Alves/EPA

Nathalia Passarinho

Da BBC News Brasil, em Londres

30/03/2021 16h04

A saída do ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e a troca dos comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica surpreenderam alguns ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que enxergaram uma tentativa do presidente Jair Bolsonaro de "politizar" as Forças Armadas.

A BBC News Brasil apurou que Azevedo conversou com ministros do Supremo após pedir demissão, inclusive com o presidente do STF, Luiz Fux. Após o telefonema, Fux compartilhou com interlocutores a percepção de que Azevedo saiu por se recusar a "politizar as Forças Armadas".

Na avaliação do presidente do Supremo, a saída de Azevedo, que continua sendo "uma figura importante" no Exército, indica que a cúpula das Forças Armadas está comprometida com a democracia. Azevedo, que é tido como um militar moderado, também teria dito a ministros que deixou o cargo porque estava insatisfeito e "não era ouvido".

Em um anúncio surpreendente nesta segunda-feira (29/3), ele comunicou sua saída do Ministério da Defesa, sem explicar oficialmente os motivos.

"Nesse período, preservei as Forças Armadas como instituições de Estado", escreveu o general em sua carta de demissão. Segundo apuração da BBC News Brasil, Bolsonaro pediu sua saída do cargo por estar insatisfeito com a falta de apoio das Forças Armadas a bandeiras do governo.

Para o lugar de Azevedo, foi anunciado o general da reserva Walter Souza Braga Netto, que até então comandava a Casa Civil.

Depois, nesta terça (30), os três comandantes das Forças Armadas deixaram os cargos: Edson Pujol, comandante do Exército, Ilques Barbosa, da Marinha, e Antônio Carlos Moretti Bermudez, da Aeronáutica.

A saída dos comandantes é vista como um ato de protesto pela demissão sumária de Azevedo. Essa é a primeira vez que os três comandantes das Forças Armadas deixam seus cargos ao mesmo tempo por discordância com o presidente da República.

Azevedo era visto como uma figura moderada, que procurava os ministros do STF com frequência para tranquilizá-los sobre o compromisso das Forças Armadas com a democracia sempre que havia atritos entre integrantes do governo Bolsonaro e o tribunal.

Apesar da substituição dele por Braga Netto, Fux comentou com colegas acreditar que o novo ministro da Defesa também poderá ser um "bom interlocutor" com o Supremo.

Especialistas em Forças Armadas, por outro lado, manifestaram preocupação com a saída de Azevedo e dos comandantes das Forças Armadas- trocas que ocorrem na véspera do aniversário do golpe militar de 1964, nesta quarta (31).

Para o professor Juliano Cortinhas, do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), a troca de comando do Exército por um general mais alinhado a Bolsonaro seria um sinal ruim para democracia, considerando o perfil autoritário do presidente, que em toda sua vida política exaltou a Ditadura Militar.

'Surpresa' e afago ao centrão

Um outro ministro do STF disse que ficou "surpreso" com as mudanças na cúpula do Ministério da Defesa.

Azevedo teria dito a ministros que outro motivo que o levou a pedir para sair do governo Bolsonaro foi a intenção do presidente de fazer trocas ministeriais para acomodar interesses de parlamentares do bloco do chamado centrão, grupo político que apoia o governo federal no Congresso.

No mesmo dia em que o ministro da Defesa pediu demissão, Bolsonaro promoveu mudanças no comando de outros quatro ministérios, além da Advocacia-Geral da União, responsável por representar o governo federal em processos judiciais, inclusive no Supremo.

O advogado-geral da União José Levi foi substituído por André Mendonça, que comandava o Ministério da Justiça. Essa troca foi interpretada por um ministro do STF como forma de acomodar os interesses do centrão. Para esse ministro, o presidente Bolsonaro ficará "mais na mão" desse grupo de parlamentares, após as mudanças realizadas nos ministérios.

A saída de Levi também teria relação com o fato de ele não ter querido assinar, como advogado-geral da União, a Ação Direta de Inconstitucionalidade que Bolsonaro apresentou ao STF contra medidas de confinamento implementadas por três Estados para controlar a pandemia do coronavírus.

O relator do pedido, ministro Marco Aurélio Mello, arquivou a ação sem analisar o mérito, por considerar que ela era inválida sem a participação da AGU.

Com a substituição de Levi por Mendonça, o cargo de ministro da Justiça foi entregue a Anderson Gustavo Torres, secretário de Segurança do Distrito Federal, que teria sido indicado por parlamentares do centrão.

Já para a Casa Civil, foi indicado o general Luiz Eduardo Ramos, que estava na Secretaria de Governo. Para o cargo dele, Bolsonaro nomeou a deputada federal Flávia Arruda (PL-DF), em mais um aceno à sua base de apoio no Congresso Nacional.