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Quem foi Martinho Lutero?

Volker Wagener (rw)

27/10/2017 12h50

Você já ouviu falar na figura que revolucionou a Igreja com a Reforma Protestante, há 500 anos? Pouco se sabe sobre ele e sua vida, e geralmente se tratam de meias-verdades e lendas."Tão logo uma moeda na caixa cai, a alma do purgatório sai." Este ditado é atribuído ao monge dominicano Johan Tetzel, que era conhecido por vender indulgências em toda a Alemanha. O trabalho de Tetzel era irrelevante para as preocupações teológicas de Martinho Lutero, mas o reformador estava irritado com a venda de indulgências, o pagamento de dinheiro à Igreja em troca da remissão de pecados.

Ele nunca teve a intenção de questionar a Igreja ou o papa, mas, em 31 de outubro de 1517, Lutero escreveu ao arcebispo Albrecht de Mainz pedindo a correção e disputa acadêmica, ou seja, um debate sobre o assunto.

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Lutero preparou, então, uma série de argumentos e críticas para serem usadas no debate. De acordo com ele mesmo, 95 dessas teses foram pregadas pessoalmente por ele, com um martelo, na porta da igreja de Wittenberg. Isso, no entanto, nunca foi provado.

Por outro lado, essas teses causaram um efeito fenomenal, que rapidamente se espalhou por todo o país. Lutero provavelmente se tornou famoso porque as teses que criticavam a Igreja foram impressas em um folheto que conseguiu grande circulação.

"Inventor" da língua alemã

Luther traduziu o Novo Testamento para o alemão em apenas 11 semanas. Ele não foi o primeiro a traduzir a Bíblia, mas foi o primeiro a usar o grego como texto original, e não a tradução latina. Ele traduziu o texto histórico com grande habilidade linguística, poesia e imagens. Sua tradução superou todas as traduções para o alemão anteriores. Todo mundo conseguiu entender a Bíblia, pois foi usada uma linguagem simples. Não admira que seus escritos se espalharam rapidamente, pois em pleno século 16 tiveram a ajuda da então "nova tecnologia" de impressão de livros. Lutero se tornou famoso justamente por causa de sua linguagem rude, como por exemplo na frase: "Por que vocês não arrotam ou peidam?"

Revolucionário social?

Longe disso! Lutero queria reformar a Igreja e a fé junto com as autoridades da Igreja, e não contra elas. Ele não era um revolucionário no sentido moderno da palavra. Hoje em dia, historiadores o caracterizam como "último homem da Idade Média e o primeiro da Moderna". A tolerância e o pluralismo foram apenas uma consequência indireta disso. Durante a revolta dos camponeses contra a aristocracia, de 1524 a 1526, Lutero inicialmente conclamou todas as partes a buscarem a paz, mas mais tarde escreveu que os camponeses eram "hordas salteadoras e assassinas" e pediu às autoridades que usassem contra eles suas espadas em nome de Deus.

Obediência à autoridade

Lutero distinguiu o reino divino do secular. A revolta dos camponeses, que, por um lado, se baseavam nele e em sua nova doutrina, mas, por outro, tinha reivindicações de mudanças sociais e políticas, foi para Lutero uma mistura inaceitável dos dois reinos. A perda iminente da ordem secular representou para o reformador uma ameaça a seus objetivos teológicos. E assim incitou as autoridades a agir contra os insurgentes. Lutero não exigiu nada mais do que a obediência dos serviçais aos seus senhores. Mais tarde, no século 19, suas ideias serviriam de base para governos autoritários alemães. Hoje em dia, no entanto, pesquisadores veem isso de outra forma.

Liberdade de consciência

A Reforma de Lutero praticamente acabou com a função do clero como ligação entre o crente e Deus. Esta vaga foi preenchida pela consciência humana. Os pensamentos e os atos de cada cristão deixavam de ser uma hierarquia eclesiástica.

Em vez disso, cada ser era o único responsável pela própria consciência. Isso foi revolucionário, mas não teve nada a ver com o individualismo como o conhecemos hoje. Para Lutero, a liberdade de consciência significava concretamente que a consciência era prisioneira da palavra de Deus. Essa liberdade era para Lutero simplesmente a fé.

"Aqui estou..."

A citação provavelmente mais famosa de Lutero no Reichstag em Worms em 1521, na qual se recusou a revogar suas críticas à Igreja, não foi comprovada. Depois de ter argumentado com base nas Sagradas Escrituras e em sua consciência, ele terminou seu discurso com as palavras: "Deus me ajude. Amém."

A frase adicionada, "Aqui estou, não o posso diferente", é evidentemente uma lenda, pois não foi documentada nem nas atas nem nos relatos de testemunhas. Talvez tenha sido acrescentada para efeitos dramáticos, a fim de retratar a determinação de Lutero.

Lutero e a música

Lutero também pode ser considerado o inventor dos hinos religiosos. Ele mesmo escreveu uma série deles. O canto coral foi um dos elementos definidores do movimento da Reforma e uma parte integrante dos serviços da igreja. Desde a era de Lutero, cantar juntos faz parte da tradição e identidade dos protestantes.

Algumas das músicas de Lutero até se tornaram canções folclóricas espirituais. A mais conhecida talvez seja "Vom Himmel hoch, da komm ich her" (literalmente "Do alto céu, de lá eu venho"), que não pode faltar nas festas e celebrações de Natal na Alemanha.

Celibato e sexualidade

Muito antes de se casar com Katharina von Bora, Lutero tinha uma opinião clara sobre a sexualidade de monges e freiras. Ele acreditava que o celibato exigia poderes sobre-humanos e que apenas uns poucos entre milhares poderiam abster-se de sexo, mesmo com a ajuda de Deus. Em suma, para Lutero, a sexualidade e o casamento eram parte da ordem divina.

Embora quando jovem ele mesmo tenha vivido em celibato, logo após o casamento ele falou em "inferno do celibato", que arruína os cristãos. Desde então, a imagem do presbitério protestante, com um pastor casado e com muitos filhos, é um símbolo do protestantismo. Isso serviu de base para a propagação da educação acadêmica, sendo os filhos de pastores os beneficiários. Já no século 16 havia um ditado segundo o qual pastores têm muitos livros e muitos filhos.

Antijudaísmo

Podemos celebrar um homem que falou e escreveu de forma tão implacável sobre os judeus? À luz do Holocausto, séculos mais tarde, a Igreja Protestante tem um problema, especialmente no ano de seu jubileu. A polêmica de Lutero contra o povo judeu revela uma agressividade desenfreada combinada com fantasias de aniquilação. O próprio Lutero mal teve contato com judeus. Suas ideias sobre judeus e muçulmanos decorrem da noção de que a verdade cristã é absoluta.

Sua posição antijudaica, no entanto, não teve nada a ver com o antissemitismo nazista que veio bem depois. Mas os nazistas usaram amplamente as tiradas agressivas de Lutero. Somente na década de 1950, a Igreja Protestante gradualmente se distanciou da imagem que Lutero tinha dos judeus. E hoje?

"Sua hostilidade em relação aos judeus provavelmente o desqualificaria tanto que ele nem seria mais convidado para um congresso da Igreja Evangélica", afirmou a presidente do Encontro das Igrejas Evangélicas Alemãs, Christina Aus der Au.

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