Escândalo da Americanas pode ser só o começo
Escândalo da Americanas pode ser só o começo - Empresas brasileiras podem estar diante de uma onda de falências. Economia estagnada se soma a dificuldades para obter crédito nos bancos, que temem novos escândalos contábeis.Já se passaram seis semanas desde o provável maior escândalo de fraude contábil da história do Brasil. Foi no dia 11 de janeiro que a rede varejista Americanas anunciou que havia irregularidades no seu balanço.
Desde então sabe-se que sumiram cerca de R$ 20 bilhões na contabilidade da empresa, a quinta maior do setor varejista. A isso somam-se dívidas da ordem de mais R$ 20 bilhões.
Tudo isso foi um choque para acionistas e para a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), instituição que fiscaliza o mercado de valores. As ações da Americanas despencaram.
Ainda não está claro como foi possível uma fraude ao longo de tantos anos nem quem é o responsável por ela. Ninguém foi dar explicações publicamente: nem da parte da empresa, nem da auditoria contábil, nem da CVM, nem da Justiça.
Tudo isso surpreende, porque a Americanas era como uma empresa-modelo do mercado financeiro brasileiro. Há 40 anos que três investidores lendários dão as cartas na Americanas: são eles o suíço-brasileiro Jorge Paulo Lemann, a pessoa mais rica do Brasil, de acordo com a Forbes, com um patrimônio de 15,4 bilhões de dólares; Marcel Telles, que segundo a Forbes tem 10,3 bilhões; e Beto Sicupira, que dispõe de 8,5 bilhões de dólares.
Esse trio de investidores é considerado extremamente bem-sucedido desde que, a partir da fusão da Brahma com a Antarctica, criou a maior companhia cervejaria do mundo, a Anheuser-Busch Inbev. Ao contrário dos conglomerados de Eike Batista ou da família Odebrecht, que viraram pó por causa de corrupção e de promessas não cumpridas, o império do trio de brasileiros parecia ser sólido.
Mas agora não só a reputação deles está arranhada: as demais empresas brasileiras também estão sofrendo diretamente as consequências do escândalo.
Os bancos brasileiros não confiam mais nos balanços delas. Eles estão avaliando com rigor se algo semelhante pode se repetir em outras redes varejistas, fabricantes de bens de consumo e prestadoras de serviços, e quase não estão mais concedendo empréstimos.
De um modo geral, o que aconteceu na Americanas secou o mercado de crédito. Com uma taxa básica de juros de 13,75% ao ano, ele já não funcionava muito bem. Mesmo empresas de boa reputação e balanços sólidos estão pagando juros de 20% para seus empréstimos. Poucas conseguem obter margens de lucros desse porte.
O problema é que elas se endividaram fortemente durante a pandemia, quando a taxa de juros ainda era de 2%. O dinheiro era barato, e agora elas não conseguem pagar as dívidas.
A isso soma-se o fraco crescimento da economia neste ano: só com sorte a economia brasileira não vai estagnar em 2023. Economistas do setor financeiro esperam um crescimento de 0,8%. Isso é muito pouco para melhorar as perspectivas das empresas.
Tudo indica, portanto, que as companhias brasileiras estão diante de uma onda de falências.
---
Há mais de 25 anos, o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul do grupo editorial Handelsblatt (que publica o semanário Wirtschaftswoche e o diário Handelsblatt) e do jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em São Paulo e Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.
O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.
Autor: Alexander Busch
Desde então sabe-se que sumiram cerca de R$ 20 bilhões na contabilidade da empresa, a quinta maior do setor varejista. A isso somam-se dívidas da ordem de mais R$ 20 bilhões.
Tudo isso foi um choque para acionistas e para a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), instituição que fiscaliza o mercado de valores. As ações da Americanas despencaram.
Ainda não está claro como foi possível uma fraude ao longo de tantos anos nem quem é o responsável por ela. Ninguém foi dar explicações publicamente: nem da parte da empresa, nem da auditoria contábil, nem da CVM, nem da Justiça.
Tudo isso surpreende, porque a Americanas era como uma empresa-modelo do mercado financeiro brasileiro. Há 40 anos que três investidores lendários dão as cartas na Americanas: são eles o suíço-brasileiro Jorge Paulo Lemann, a pessoa mais rica do Brasil, de acordo com a Forbes, com um patrimônio de 15,4 bilhões de dólares; Marcel Telles, que segundo a Forbes tem 10,3 bilhões; e Beto Sicupira, que dispõe de 8,5 bilhões de dólares.
Esse trio de investidores é considerado extremamente bem-sucedido desde que, a partir da fusão da Brahma com a Antarctica, criou a maior companhia cervejaria do mundo, a Anheuser-Busch Inbev. Ao contrário dos conglomerados de Eike Batista ou da família Odebrecht, que viraram pó por causa de corrupção e de promessas não cumpridas, o império do trio de brasileiros parecia ser sólido.
Mas agora não só a reputação deles está arranhada: as demais empresas brasileiras também estão sofrendo diretamente as consequências do escândalo.
Os bancos brasileiros não confiam mais nos balanços delas. Eles estão avaliando com rigor se algo semelhante pode se repetir em outras redes varejistas, fabricantes de bens de consumo e prestadoras de serviços, e quase não estão mais concedendo empréstimos.
De um modo geral, o que aconteceu na Americanas secou o mercado de crédito. Com uma taxa básica de juros de 13,75% ao ano, ele já não funcionava muito bem. Mesmo empresas de boa reputação e balanços sólidos estão pagando juros de 20% para seus empréstimos. Poucas conseguem obter margens de lucros desse porte.
O problema é que elas se endividaram fortemente durante a pandemia, quando a taxa de juros ainda era de 2%. O dinheiro era barato, e agora elas não conseguem pagar as dívidas.
A isso soma-se o fraco crescimento da economia neste ano: só com sorte a economia brasileira não vai estagnar em 2023. Economistas do setor financeiro esperam um crescimento de 0,8%. Isso é muito pouco para melhorar as perspectivas das empresas.
Tudo indica, portanto, que as companhias brasileiras estão diante de uma onda de falências.
---
Há mais de 25 anos, o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul do grupo editorial Handelsblatt (que publica o semanário Wirtschaftswoche e o diário Handelsblatt) e do jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em São Paulo e Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.
O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.
Autor: Alexander Busch
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.