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A polêmica guerra da Austrália contra o tráfico de imigrantes

19/06/2017 17h05

Sydney (Austrália), 19 jun (Minds/EFE).- Devido à chegada de mais de 20 mil imigrantes irregulares através de embarcações em seu litoral em 2013, o governo da Austrália implementou uma polêmica política militarizada contra esse tráfico que literalmente acabou com essas tentativas.

O primeiro-ministro conservador, Tony Abbott, declarou "guerra" aos traficantes ao chegar ao poder e iniciou a "Operação Fronteiras Soberanas", que endurecia a política contra a imigração ilegal.

O elemento central desta operação, marcado pelo caráter secreto, é a utilização da marinha, que obriga as embarcações com pessoas sem documentos que tentam chegar à Austrália a darem meia-volta e retornarem aos pontos de embarque na Indonésia.

Desde a sua implementação, apenas um barco com 160 solicitantes de asilo do Sri Lanka conseguiu se aproximar do litoral australiano, em 2014, enquanto que cerca de 30 embarcações com 765 imigrantes sem documentos a bordo foram forçadas a voltar a seus portos de origem.

"Desde a 'Operação Fronteiras Soberanas', não tivemos nenhum afogamento no mar", defendeu em entrevista à agência australiana "AAP" o ministro de Imigração, Peter Dutton, que comparou o resultado com os 1.200 mortos registrados durante o mandato do governo anterior (trabalhista, 2007-2013).

Esta política gerou críticas de várias organizações que recriminam a falta de escrúpulos da Austrália, país que, por outro lado, é um dos que mais recebe refugiados per capita do mundo.

O seu compromisso é acolher um mínimo de 13.750 pessoas no ano fiscal 2016-17, 16.250 em 2017-18 e 18.720 em 2018-19, além de 12 mil adicionais para cada ano provenientes da Síria e do Iraque.

A Anistia Internacional (AI) denunciou que oficiais da marinha e encarregados do controle de fronteiras da Austrália pagaram em maio de 2015 US$ 32 mil à tripulação de um barco com potenciais solicitantes de asilo para que voltassem à Indonésia.

Dutton se negou a comentar ou investigar o incidente e se limitou a dizer que o governo vai fazer "o que for necessário, dentro da lei australiana, para deter a chegada das pessoas por barco".

A AI considera alarmante que vários países europeus, da África, do Oriente Médio e da Ásia, que enfrentam uma forte pressão migratória e que foram nações que acolheram imigrantes durante décadas, olhem com interesse para as políticas australianas.

"Houve interesse de lugares como a Europa (...), viram como funcionamos sob o modelo da 'Operação Fronteiras Soberanas' e estão analisando o que poderiam fazer", disse em maio ao Senado o comandante desta operação, Stephen Osborne.

"É perigoso, porque isto colocaria em sério risco muitas vidas ao forçar, por exemplo, no Mar Mediterrâneo, os solicitantes de asilo a voltarem à Líbia", respondeu, por outro lado, à Agência Efe o coordenador para Refugiados da AI na Austrália, Graham Thom.

Além de obrigar o retorno dos barcos, a Austrália também recebeu críticas pela reabertura de centros de detenção em outros países, onde mantém sob custódia solicitantes de asilo; o outro lado da moeda de sua política contra a imigração ilegal.

O governo trabalhista recuperou em 2012 a política de detenção de solicitantes de asilo em centros nas ilhas Manus, em Papua Nova Guiné, e Nauru, após a chegada de 50 mil imigrantes sem documentos, a maioria procedente de Sri Lanka, Afeganistão, Iraque e Irã.

As críticas a esta política incluem as de agências da ONU e de organizações de defesa dos direitos humanos, que lembram que a Austrália deve cumprir com suas obrigações internacionais para proteger os refugiados.

Estas organizações denunciam as condições precárias nestes centros de detenção, onde foram registrados motins, assassinatos, imolações, tentativas de suicídio e autolesão, além de abusos físicos, mentais e sexuais.

Em 2014, a Austrália assinou um acordo com o Camboja para realocar os imigrantes durante quatro anos em troca de US$ 41 milhões, um plano ao qual se acolheram apenas cinco pessoas, quatro das quais retornaram a seus países pouco depois.

A Austrália fez um acordo com os Estados Unidos, sob a presidência de Barack Obama, para um plano de acolhimento para que cerca de 1.250 internos em Manus e Nauru fossem realocados em solo americano, o que o novo inquilino da Casa Branca, o republicano Donald Trump, qualificou como "o pior dos acordos" logo que assumiu o poder.

Esse plano foi estabelecido com a condição de que a Austrália recebesse cerca de 30 pessoas consideradas "vulneráveis" de vários países centro-americanos, entre eles El Salvador, Guatemala e Honduras.

O convênio foi recebido com ressalvas pela Anistia Internacional, que alertou que o mesmo "gera dúvidas" e privilegia "a política sobre as necessidades humanitárias".

"Muitos dos refugiados de Manus e Nauru têm família na Austrália e é provável que os da América Central tenham mais vínculos com os Estados Unidos", observou Thom.

O secretário-geral da AI, Salil Shetty, não poupou críticas à política migratória australiana ao qualificá-la como uma "violação flagrante" das convenções internacionais para a proteção dos refugiados e dos direitos humanos.

"Um dos países mais ricos do mundo nos diz que teve sucesso violando os direitos de algumas das pessoas mais pobres do mundo, isso é o que se define como sucesso na atualidade?", questionou Shetty, em entrevista para a "AAP".