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Descriminalização do aborto não deu certo, diz pesquisador mexicano

20/08/2018 16h47

Cristina Sánchez.

Cidade do México, 20 ago (EFE).- Amplamente debatido atualmente, a descriminalização do aborto na capital mexicana "foi um fracasso na política pública", na opinião de Cándido Pérez, doutorando em Políticas Estratégicas de Gestão e Desenvolvimento na Universidade de Anahuac e médico do Centro de Estudos e Formação Integral para a Mulher do México (CEFIM), pois não diminuiu o número de mortes de mulheres que procuram esse procedimento e nem a clandestinidade.

Essa está no relatório "Aborto, a política de um Estado claudicante", que faz uma cronologia dos eventos mais relevantes dos últimos 25 anos sobre o aborto no México. O documento foi elaborado por um grupo multidisciplinar de mulheres e homens especialistas no assunto, com o apoio do CEFIM.

"O impacto da legalização do aborto não foi o esperado. A única coisa que gerou foi privar as mulheres da autonomia da decisão, deixando somente o aborto como opção", disse ele.

Conforme o relatório, pouco mais de uma década depois de ter sido liberado na Cidade do México, o aborto representa 10,7% das mortes maternas na capital, taxa que está acima da média nacional, de 9,2%.

"O mais preocupante é que se desconhece em que condições são realizados nove de cada dez abortos na Cidade do México", argumentou.

Para ele, descriminalizar esta prática e elas aumentarem em hospitais público, não significa que as mortes não irão ocorrer. Segundo ele, nenhuma autoridade do setor da saúde sabe sobre os hospitais privados que realizam o procedimento.

"É difícil dizer que (o aborto) acaba com a clandestinidade, quando se desconhece tudo o que acontece no âmbito privado. Uma das grandes deficiências é o fato de hospitais particulares não terem a obrigação de informar nenhuma autoridade pública sobre quantos abortos realizam, em que condições ou que tipo de procedimento fez", apontou.

O relatório afirma que, conforme pesquisas acadêmicas, nos últimos 11 anos cerca de 1,5 milhões de abortos foram feitos na Cidade do México. O dado se choca com o número das autoridades da saúde, que indicam pouco mais de 175 mil interrupções.

"Esse grande desconhecimento dos hospitais privados nos faz questionar o impacto a respeito da clandestinidade", afirmou Pérez.

O estudo também destaca o grande número de mulheres que abortou mais de uma vez.

"Mais de 11 mil mulheres reincidiram, chegando a dois ou mais abortos. É preocupante, porque, de acordo com a literatura, muitas vezes, a reincidência do aborto está associada a outros problemas, como a violência doméstica", defendeu.

Segundo ele, isso se deve ao fato de que as autoridades realizam os abortos, mas não se preocupam em conhecer as condições e razões das mulheres para isso e não terem registros das reincidentes.

"Não sabemos se determinada mulher volta a fazer porque têm uma relação violenta com o parceiro ou porque não teve acesso a mecanismos de prevenção ou por qualquer outro motivo", afirmou.

O médico ressaltou as experiência de alguns países da Europa, onde existem programas e formas de dar acesso à informação, bem como acompanhamento das mulheres, o que ajudaria a entender as principais razões da escolha pelo aborto. O pesquisador lamentou que, apesar da permissão na capital mexicana, há uma ausência de preocupação real sobre alternativas para diminuir a taxa de mortalidade e a incidência. A prática é proibida em todo o resto do país.

"Não se pode falar de liberdade de decisão das mulheres quando existe apenas uma alternativa. A política da interrupção legal da gravidez é a única neste sentido. Uma alternativa seria as autoridades se preocuparem verdadeiramente com as mulheres para que seja possível ajudá-las com alternativas reais diante de uma gravidez não desejada", ressaltou.