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Dólar cai 17,7% ante o real em 2016, maior recuo em 7 anos; incertezas rondam 2017

29/12/2016 20h06

Por Claudia Violante

SÃO PAULO (Reuters) - O impeachment da presidente Dilma Rousseff, que gerou otimismo de mudança na política econômica, e a expectativa de que a democrata Hillary Clinton ganharia a presidência dos Estados Unidos sustentaram a trajetória de queda do dólar ante o real ao longo de 2016, e levaram a moeda norte-americana a registrar a maior recuo anual ante o real em sete anos.

Mas a cena política brasileira ainda conturbada, com importantes figuras do governo --inclusive o presidente Michel Temer-- citadas em delações premiadas da operação Lava Jato, e a surpreendente vitória de Donald Trump na corrida presidencial norte-americana acenderam o sinal de alerta nos mercados para 2017, com expectativa de turbulências à frente.

O dólar fechou o último pregão do ano em queda de 0,94 por cento, a 3,2497 reais na venda, acumulando no ano desvalorização de 17,69 por cento, na primeira queda anual desde 2010 (-4,4 por cento) e a maior desde 2009 (-25,3 por cento). Entre 2011 e 2015, durante o governo da ex-presidente Dilma, a moeda norte-americana saltou 137 por cento ante o real.

Só em dezembro, a moeda norte-americana perdeu 4,06 por cento ante o real, a maior queda desde o recuo de 11,05 por cento de junho.

"É difícil saber o que vai predominar. Há vários elementos que podem fugir das expectativas", resumiu o economista-sênior do Banco Haitong, Flávio Serrano.

Recente pesquisa da Reuters já havia tomado esse pulso, ao mostrar estimativas para o dólar em 2017 com grande intervalo, de 2,98 a 3,88 reais.

O futuro governo Trump é um fator de pressão de alta para o dólar ao redor do globo, inclusive no Brasil, devido a promessas de maiores gastos e redução de impostos que podem obrigar o Federal Reserve, o banco central norte-americano, a elevar mais do que o esperado os juros nos Estados Unidos.

O Fed subiu recentemente os juros, como amplamente esperado diante da recuperação da maior economia do mundo, e previu que em 2017 deverão ocorrer outras três altas. Juros maiores nos EUA têm potencial para atrair recursos aplicados em outros mercados, como o brasileiro.

E com o Banco Central brasileiro em processo de redução dos juros básicos, hoje a 13,75 por cento, o mercado de câmbio no país pode sofrer com a saída de investidores.

"Pelo livro texto, menos juros significa dólar mais alto. Mas o efeito não está claro", afirmou o economista da consultoria Tendências Silvio Campos Neto. "Assim, o mais condizente seria um dólar mais apreciado do que está, fechando 2017 em 3,60 reais", concluiu. 

Mas há quem acredite em um cenário mais suave. "Trump não deve colocar em prática tudo o que prometeu na campanha, o que deve ser benéfico para o Brasil", comentou o sócio-gestor da Gestora GGR Investimentos, Telêmaco Genovesi Jr, para quem o dólar deve rondar o atual patamar ou mesmo recuar ante o real em 2017.

Ele referia-se às promessas radicais do republicano, como revisão de acordos comerciais e protecionismo. Sem tirá-las no papel, o atual status comercial de países como o Brasil seria mantido pelos Estados Unidos.

E, mesmo com as projeções de que a Selic no Brasil caia a cerca de 10 por cento em 2017, a taxa continuará sendo uma das mais altas do mundo, com potencial para atrair investidores. Ainda mais se a economia mostrar recuperação no próximo ano.

"Os preços dos ativos estão depreciados e, com a melhora do país, em meio ao ajuste (fiscal), deve haver maior procura por parte dos investidores estrangeiros", comentou o estrategista-chefe do BNP Paribas para Câmbio e Renda Fixa na América Latina, Gabriel Gersztein. "O dólar, se o cenário favorável se confirmar, pode cair até os 3 reais", avaliou.

TURBULÊNCIAS AQUI

Se no exterior o governo Trump é a principal questão para o comportamento do dólar, internamente o andamento da economia doméstica é um outro fator que terá ascendência sobre a moeda norte-americana, da mesma forma que o cenário político.

O ano de 2016 pode ser considerado um dos mais turbulentos na cena política e econômica nos últimos anos, com o país passando por um impeachment, forte recessão e sérias denúncias de corrupção --sobretudo no âmbito da operação Lava Jato-- envolvendo importantes figuras políticas.

Com a economia sem dar sinais consistentes de recuperação em breve, os agentes econômicos se voltam agora para as reformas prometidas pelo governo de Michel Temer, sobretudo a da Previdência, e que dependem do Congresso Nacional.

"No fundo, a preocupação do mercado é com o andamento das reformas. Se elas forem aprovadas, não importa quem esteja lá (no governo)", afirmou o economista-chefe da corretora Infinity Asset, Jason Vieira.

Neste ano, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro deverá recuar cerca de 3,5 por cento, segundo a pesquisa Focus do BC, realizada semanalmente com uma centena de economistas. E a expectativa para 2017 é de elevação de apenas 0,50 por cento.

INTERVENÇÃO

Em meio ao cenário bastante conturbado, o Banco Central atuou pesadamente no mercado de câmbio ao longo de 2016, sobretudo por meio dos leilões de swaps. Com a virada do ano e as incertezas que ainda rondam, a expectativa é de que o BC não deixe a cena, mesmo que seja para rolar os swaps tradicionais --equivalentes à venda futura de dólares.

"Acho provável uma rolagem (de swaps), pelo menos parcialmente. Não é do interesse do BC que esse vencimento morra para não gerar pressão de alta (do dólar) diante do que vem pela frente em 2017", comentou o operador da corretora H.Commcor, Cleber Alessie Machado.

A última intervenção da autoridade foi em 13 de dezembro, por meio de leilão de linha --venda de dólares com compromisso de recompra. O estoque total de swaps está o equivalente a 26,6 bilhões de dólares, segundo dados do BC.