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Condenação de Lula dá apenas pontapé inicial em saga sobre candidatura

24/01/2018 20h42

Por Eduardo Simões

SÃO PAULO (Reuters) - A condenação unânime do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pela 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) deu apenas a largada ao que deve ser uma saga envolvendo a possibilidade do ex-presidente ser candidato ao Palácio do Planalto nas eleições de outubro.

A situação pode também suscitar debates sobre a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa, sancionada pelo próprio Lula em 2010 e que agora pode impedi-lo de buscar um terceiro mandato à frente da Presidência da República.

"A situação começou a ficar definida, mas ela não está nem perto da definição", disse Daniel Falcão, professor de Direito Eleitoral da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) que lembra, no entanto, que o petista tem uma série de recursos à disposição para tentar ser candidato.

Diante da decisão unânime da 8ª Turma, a defesa de Lula poderá entrar com embargos de declaração junto ao próprio colegiado que negou seu recurso contra a condenação imposta pelo juiz Sérgio Moro. Esse mecanismo, no entanto, serve apenas para esclarecer pontos da sentença, não para reverter a condenação.

"Para ele conseguir ser candidato, ele vai precisar pedir para o STJ (Superior Tribunal de Justiça) ou para o STF (Supremo Tribunal Federal) suspender os efeitos da decisão do TRF-4 para ele poder registrar a candidatura sub judice", disse.

Falcão afirma que a legislação dá prioridade ao julgamento dos prováveis recursos e pedidos de efeito suspensivo dos advogados de Lula em tribunais superiores. Ao mesmo tempo, ele avalia que é "plausível" que as análises dos recursos sejam feitas antes de 15 de agosto, prazo final para pedido de registro de candidaturas, mas alerta que "não é provável".

"Se ele não conseguir o efeito suspensivo, ele vai registrar a candidatura e 99 por cento de chance de o TSE rejeitar a candidatura dele", acrescentou.

Nesse caso, o ex-presidente poderá recorrer ao Supremo questionando, inclusive, a constitucionalidade da Lei da Ficha Limpa.

"Certamente esse assunto vai dar origem a um debate nos tribunais. Porque, embora o TSE já tenha se manifestado sobre o tema, eu pessoalmente tenho a crença que a constitucionalidade desse dispositivo legal (Lei da Ficha Limpa) é duvidosa", disse o advogado especialista em Direito Eleitoral Ulisses César Martins de Sousa.

"Caso o Lula, ainda que condenado, postule o registro da candidatura perante a Justiça Eleitoral, os tribunais --e aí por tribunais vamos entender Tribunal Superior Eleitoral e posteriormente, em sede de recurso, o Supremo Tribunal Federal-- certamente vão ter que se debruçar sobre essa questão e decidir em concreto, ou seja, analisando o caso do Lula, se ele pode ou não ser candidato. Esse debate não termina hoje, ele só começa."

Lula, que já anunciou a intenção de ser novamente candidato à Presidência neste ano, lidera as pesquisas de intenção de voto para a corrida ao Palácio do Planalto.

Em nota divulgada após a decisão da 8ª Turma do TRF-4, o PT anunciou que irá pedir o registro da candidatura de Lula à Presidência.

POSSIBILIDADE DE PRISÃO

Além da questão eleitoral, Lula também terá um outro problema pela frente, isso porque na sessão que julgou seu recurso nesta quarta, os desembargadores da 8ª Turma do TRF-4 afirmaram que a pena de 12 anos e 1 mês imposta ao ex-presidente começará a ser cumprida assim que forem esgotados os recursos à corte, ou seja, os embargos de declaração.

"Eu acho que demora ainda uns dois ou três meses para julgar esses embargos de declaração. Ainda tem que publicar o acórdão, tem alguma burocracia", disse o criminalista Daniel Bialski, que avalia que Lula poderá ser preso dentro deste prazo.

Assim como seus colegas especialistas em Direito Eleitoral, Bialski lembra que Lula pode recorrer ao STJ e STF.

"A regra é que ele fique preso enquanto recorre, mas ele pode pedir aos tribunais superiores que ele possa aguardar em liberdade", disse.

Para Ulisses Sousa, a possibilidade de um candidato à Presidência preso é algo "surreal" e "inédito".

"Isso é uma situação inédita em se tratando de presidente da República", disse, acrescentando, entretanto, que há casos envolvendo cargos menos importantes, como prefeito, em que candidatos foram eleitos enquanto estavam presos.

"Um candidato a presidente da República postulando a candidatura de dentro da prisão é algo de que eu não tenho notícia."